Apresentado na Seleção, Diniz prega ética e nega conflito de interesses por permanecer no Fluminense
Treinador evitou falar sobre Carlo Ancelotti, cotado para assumir o posto a partir de julho de 2024, e frisou que não foi cogitada a opção de largar o Tricolor e ficar fixo no Brasil
“Futebol para mim é a vida em movimento”. Essa foi uma das frases utilizadas pelo técnico do Fluminense, Fernando Diniz, ao ser apresentado nesta quarta (5), na sede da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), como novo treinador interino do Brasil. O “movimento” em questão para o profissional será conciliar as funções no clube e na Seleção. Cenário que fez questão de rechaçar qualquer risco de conflito de interesses.
“Vou procurar aquilo que é melhor para a CBF e olhar o cenário do futebol brasileiro como um todo, tomando a melhor decisão possível. Mesmo os treinadores que não ocuparam (dois cargos ao mesmo tempo) sempre tiveram alguém questionando. Mas isso não pode ser baseado na falta de ética”, apontou.
Diniz, como esperado, foi perguntado diversas vezes sobre Carlo Ancelotti, comandante do Real Madrid que é cotado para assumir a Seleção a partir de julho de 2024. “Não o conheço. Uma condição clara para realizar meu trabalho é ter autonomia e liberdade total para o que preciso fazer no campo e uma delas é a convocação. Não terá interferência alguma, o presidente da CBF (Ednaldo Rodrigues) deixou claro. Teremos o grupo de staff daqui e mais algumas pessoas que vou trazer comigo. Não sou pessoa de fazer muita projeção para o futuro. Quero cumprir o prazo de 12 meses, olhando um dia de cada vez. Vou procurar reproduzir na Seleção o que me trouxe até aqui. Terei uma fartura de jogadores renomados, com a melhor matéria-prima do mundo, executando da melhor maneira as ideias que tenho”, afirmou.
Exclusividade não foi citada
O treinador deixou claro que a ideia inicial sempre foi a de conciliar os trabalhos, sem qualquer risco de deixar o Fluminense. “A questão de ser exclusivo não foi mencionada. Para falar a verdade, neste momento que estou com o clube, eu jamais sairia para abraçar somente a CBF. Embora seja um sonho, eu teria que adiar”, declarou. “Vou me dedicar 100% onde estiver. Quando estiver no Fluminense, é dedicação total. Quando sair daqui, vou para casa estudar o Internacional. Quando estiver na Seleção, vou me dedicar à ela”, completou.
Neymar e Ganso?
Prestes a treinar Neymar e com a experiência de comandar Ganso no Fluminense, o treinador respondeu se o Brasil poderia futuramente ter a dupla, que fez história no Santos, vestindo a amarelinha.
“É precoce. Se eles estiverem entre os melhores, serão convocados. Nada é impossível. A palavra que vem à mente quando penso em Neymar é quase uma ‘aberração’. É um super talento, que demora para nascer outro. O Brasil tem a sorte de aparecer jogadores assim de tempos em tempos. Temos de procurar aproveitar ao máximo. É um fora de série em todos os sentidos”, disse.
“Minha ideia é convocar os melhores jogadores para ganhar o próximo jogo. Obviamente que você pode, nesse processo, convocar atletas para preparar e sentir o ambiente da Seleção. Temos um leque de opções. Vira e mexe surgem novos nomes e saberemos escolher para os determinados momentos, como as eliminatórias e datas Fifa. Algumas figuras continuarão aparecendo, mas ficaremos sempre abertos para fazer a melhor convocação possível”, frisou.
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Confira outros trechos da entrevista
Convite
Mistura de alegria e honra estar aqui, ser convocado para essa missão de treinar a Seleção. Um sonho que se realiza. Pretendo dedicar minha vida a isso. Meu contrato é de um ano. Procurarei fazer o melhor possível. Não decidimos se engloba a Copa América. Quanto ao Carlo Ancelotti, eu sei do planejamento da CBF e não estou aqui o que vai acontecer depois de mim. Meu compromisso é preparar bem os jogadores, tendo um bom rendimento nos jogos que teremos pela frente
Acordo com o Fluminense
Foram dias de alegria e ansiedade. O presidente procurou Mário (Bittencourt, presidente do Fluminense). Um gesto bastante respeitoso ao Fluminense. Depois Mário me procurou e falou desse desejo da CBF de me ter como técnico. Fiquei honrado de poder ser escolhido. Precisava conversar com ele (Ednaldo) pessoalmente para me apresentar e mostrar quem eu sou para saber se eu era de fato o nome que ele gostaria que comandasse a Seleção Brasileira. Se não há esse casamento, essa química, não funciona. Já tinha uma imagem do presidente pelas entrevistas e sempre me pareceu uma pessoa honesta e ética, procurando fazer o melhor para o futebol. Ao conhecê-lo, esse sentimento se confirmou e acredito que da parte dele também, com as coisas avançando rapidamente
Aproximação com os jogadores
Existe uma distorção sobre o meu trabalho. Quando cheguei ao Fluminense, tivemos um início positivo, com o time sem tomar gols. Prezo muito pelas relações. A primeira coisa que procuro fazer é me aproximar dos jogadores. O que faço no futebol é proporcionar as melhores condições para os jogadores colocarem o potencial para fora. Espero que os jogadores entendam as ideias básicas do meu jogo, criando conexões para que as coisas possam fluir. Conforme o tempo vá passando, as questões táticas vão tendo certa rotina de ensino e aprendizagem, em um curso natural. Concordo que é diferente a dinâmica em relação ao clube, mas acredito que teremos uma conexão rápida para apresentar bons resultados
Ética de trabalho
Ética tem a ver com as pessoas que tomam as decisões. Se as pessoas presumem que haverá conflito de interesse, tomando algum partido, estão me julgando como se eu não tivesse ética. Se eu tivesse muita conexão com o que pensam de mim, eu não faria quase nada do que faço no futebol. Minha carreira é mais recheada de críticas do que de elogios por conta da minha maneira de ver o futebol e enxergar o mundo. Construí minha carreira como treinador baseada naquilo que fiz como jogador. Uma das coisas que mais me atordoou foi a distorção clara da falta de ética no mundo do futebol. As pessoas confundiam quem jogava bem com serem também boas pessoas. Isso não correspondia aos fatos. Muita gente trabalhadora era julgada por uma bola que entrava ou não entrava, por uma jogada que dava ou não certo. A ética me fez suportar o sofrimento enquanto eu jogava, tendo desejo de me tornar o treinador que me tornei. Futebol não está acima da ética, da vida. É um espaço de convivência onde podemos colocar as coisas boas e a ética é uma delas. Serei a mesma pessoa. O que penso é na complexidade das convocações e de tomar as decisões. A ética pautará as decisões e as pessoas vão pautar a depender do juízo de cada um. Nesse ponto, a CBF apontou na pessoa certa.
Tempo de trabalho
“Interfere ter menos tempo, mas as coisas básicas podem ser passadas com pouco tempo, difundindo a ideia aos poucos. O jogo terá fluência conforme vamos nos encontrando. Não vamos fazer mudanças táticas extremamente radicais com um ou dois dias de treino, mas alguma coisa conseguimos melhorar. Meu trabalho não se resume ao olhar mais comum da saída jogando com goleiro ou do toque de bola. Futebol é mais do que isso. Vou partir do pressuposto que vou aproveitar o tempo que tiver para os jogadores, aos poucos, amadurecerem as ideias táticas.
Processo e resultados
“Uma das coisas que a gente tem que discutir no Brasil é essa coisa que a gente tem em relação ao resultado. A gente determina o valor do time, de pessoas, por uma bola que entra, uma bola que não entra. A gente foi eliminado pela Croácia sendo muito superior à Croácia. A gente perdeu nos pênaltis e acha que foi tudo ruim. No processo, a vida é muito mais que isso. Não significa que não tenha apreço pela vitória. Pelo contrário. Quem trabalha acreditando no processo, acredita que não está tudo ruim quando um goleiro falha, quando uma bola não entra. As coisas são muito além disso.É um desejo muito infantilizado de achar herói e vilão o tempo todo”