Atletas da seleção de vôlei deixam de ser obrigados a usar tênis de patrocinador
Obrigatoriedade de vestir o material da Asics causou discórdia e insegurança entre os jogadores
A menos de dois meses dos Jogos de Tóquio, a Confederação Brasileira de Voleibol (CBV) teve que rever o seu compromisso com a fornecedora de material esportivo, a Asics, para evitar a escalada de uma crise com os atletas das seleções feminina e masculina.
A entidade obrigou o uso do material da Asics, conforme ofício (número 008/2021), enviado em 19 de maio pelo departamento jurídico da CBV. Além do documento, a coordenadora Julia Silva enviou um email aos jogadores, na véspera de o Brasil estrear na Liga das Nações, ameaçando cortar 50% de "toda e qualquer remuneração" daqueles que não usassem o "tênis da patrocinadora" durante os jogos e treinos. A reportagem recebeu uma cópia da mensagem, enviada a 40 destinatários.
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A pressão pegou muito mal entre os atletas. Houve quem procurasse a opinião de advogados, que consideraram que a obrigatoriedade não era uma exigência legal. Confrontada, a CBV realizou uma reunião com a empresa de produtos esportivos para resolver a questão e, nesta quarta-feira (26), liberou o uso de tênis de outras marcas.
"Em novo alinhamento entre a CBV e a Asics , fica acordado que cada atleta terá direito de escolha para selecionar seu calçado em momentos de treino e competição, desde que comprovado vínculo contratual com outra marca esportiva", disse a direção da confederação, em nota.
Mesmo após o ofício assinado pelo departamento jurídico, com o possível corte de remuneração, o time masculino fez três amistosos contra a Venezuela em que havia variedade de marcas de tênis. Na terça (25), o time feminino estreou na Liga das Nações, na Itália, e venceu o Canadá por 3 sets a 1. Algumas atletas utilizaram um esparadrapo por cima do logotipo das marcas dos tênis, situação que voltou a se repetir na partida desta quarta (vitória sobre a República Dominicana).
A obrigatoriedade de vestir o material da Asics causou discórdia e insegurança entre os jogadores, principalmente para os que já possuem compromisso com outras marcas. Bruninho, por exemplo, é patrocinado pela Olympikus, assim como Gabi possui vínculo com a Nike.
Na última Olimpíada, a CBV pagou aos atletas do vôlei de quadra R$ 3,1 milhões em premiações pelo desempenho no Rio de Janeiro. Nos Jogos de 2016, o time masculino conquistou medalha de ouro ao derrotar a Itália na decisão. As mulheres caíram nas quartas de final diante da China. Naquela temporada, a entidade desembolsou mais R$ 2 milhões, pela Liga Mundial, e R$ 1,4 milhões pelo Grand Prix.
Na temporada de 2019, antes de a pandemia de Covid-19 afetar o calendário, a CBV pagou R$ 3,7 milhões pelo desempenho na Liga das Nações.
Antes da mudança de postura da CBV em relação ao uso dos tênis da Asics, um acordo verbal fora feito com os atletas, que estariam dispensados da obrigatoriedade caso apresentassem um laudo médico informando que a mudança se tratava de uma questão de saúde. O que gerou mais reações negativas.
Em nota publicada nesta terça, a entidade afirmou que os atletas agora estão dispensados de mostrarem qualquer documento. Consultada pela reportagem, a patrocinadora afirma que "CBV e Asics estão alinhadas no entendimento e respeito de que cada atleta tenha a sua liberdade de escolha para selecionar o calçado que melhor se aplica ao seu estilo de jogo".
O acordo entre CBV e empresa começou em janeiro de 2017, rompendo uma parceria de quase 20 anos entre a confederação e a marca Olympikus. Esta última foi fornecedora de material esportivo nos Jogos de Sidney-2000, Atenas-2004, Pequim-2008 e Rio-2016.
Em seu balanço contábil, a CBV descreve que, pelo acordo firmado com a Asics do Brasil Comércio de Artigos Esportivos, recebe material esportivo de alto padrão destinado à utilização obrigatória em jogos, treinamentos, desfiles, viagens, dentre outros eventos pelas Seleções Brasileiras de Voleibol de Quadra, infantojuvenil, juvenil e adulta, masculina e feminina e, equipes de Vôlei de Praia, indicadas pela CBV para representar o Brasil em qualquer competição, desde que seja permitido pela entidade organizadora do torneio.
O contrato é válido para o ciclo olímpico atual, que seria encerrado em 2020. Com adiamento dos Jogos de Tóquio por causa da crise do coronavírus, foi prorrogado por mais 12 meses, até o dia 31 de dezembro deste ano.
Não é a primeira vez que há um conflito que envolva marcas esportivas meses antes de uma Olimpíada. Em 2000, Gustavo Kuerten ameaçou não ir aos Jogos de Sydney se tivesse de usar a camisa da Olympikus, então patrocinadora do COB (Comitê Olímpico do Brasil). O tenista tinha acordo com a Diadora. A solução para o caso foi ele atuar com um uniforme sem menção a qualquer patrocinador.