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Tênis

Bia Haddad volta ao top 100 do tênis mais 'verdadeira' e consciente

A campanha em Indian Wells faz com que ela saltasse 19 posições, da 115ª para a 96ª

Bia Haddad, tenista brasileiraBia Haddad, tenista brasileira - Foto: Adrian Dennis/AFP

A tenista brasileira Bia Haddad Maia comemorou de forma contida o triunfo sobre a tcheca Karolina Pliskova, número 3 do mundo, na terceira rodada do torneio WTA 1.000 de Indian Wells, na última segunda-feira (11).

A vitória mais expressiva da carreira de Bia (por 6/3 e 7/5), que ela define como um dos momentos mais especiais da vida, também foi tratada com sobriedade nas suas declarações. A paulista apontou que as duas estiveram abaixo do seu melhor nível num dia de muito vento, em que ter se mantido mentalmente na partida fez a diferença a seu favor.

Na terça (12), ela voltou à quadra contra a estoniana Anett Kontaveit (20ª do ranking) e foi dominada no jogo pelas oitavas de final (6/0 e 6/2). Sem tirar o mérito da inspirada adversária, declarou estar insatisfeita consigo mesma por ter entrado passivamente na partida.

Bia Haddad, 25, voltou aos grandes torneios após mais de dois anos e também estará novamente no top 100 do ranking mundial a partir de segunda-feira (18). A campanha em Indian Wells faz com que ela saltasse 19 posições, da 115ª para a 96ª.

Os resultados e os pés no chão ao analisá-los refletem um processo de reconstrução da carreira da tenista, que em 2017 e 2018 chegou a ocupar a 58ª colocação. "Um dos pontos muito importantes para mim é saber me expor e falar a verdade. O que eu sinto, meus medos, o que aconteceu de fato no jogo, não tirando o mérito [da adversária]. Quando você é sincera com você e fala a verdade, não se coloca nem acima nem abaixo do que está acontecendo. Cada vez mais venho trabalhando para ser verdadeira e passar a realidade para as pessoas", ela afirma à Folha de S.Paulo.

Nessa busca de se expor com menos receios, Bia tem como grande incentivador o técnico Rafael Paciaroni, com quem ela começou a trabalhar neste ano. "Essa é uma das coisas que ele mais conversou comigo. Venho de um país onde as pessoas esperam que você seja um craque: um Guga, um Ayrton Senna, um Medina, pessoas fora da curva. Muitos atletas têm sucesso e não são considerados pessoas de sucesso. É muito difícil ser brasileira", reflete.

"O tênis é um esporte muito difícil, muito mental, solitário. Tem muita coisa que envolve o jogo, não só o jogo, e ser brasileiro tem uma pressão a mais, muita gente palpitando na sua vida", completa.

Em julho de 2019, a tenista foi suspensa por doping. A pena acabou fixada em 10 meses, após a defesa ter conseguido provar que as substâncias anabólicas encontradas no exame entraram em seu organismo por meio de suplementos alimentares contaminados.

A atleta estaria liberada para jogar em maio de 2020, mas o circuito só foi retomado em agosto do ano passado, por causa da pandemia. Devido aos pontos perdidos nesse período, ela retomou a carreira a partir da 1.342ª posição, disputando uma série de torneios pequenos pelo mundo.

Bia iniciou 2021 como número 359 e esperava entrar no grupo das 200 melhores até dezembro, mas já superou essa meta. Ela disputou os qualificatórios de Wimbledon e do US Open -não conseguiu avançar para a chave principal- e em Indian Wells entrou de última hora, graças a uma desistência.

Uma sorte que a brasileira se mostrou preparada para aproveitar depois de um longo período de escalada do ranking. "Eu sempre me senti muito preparada e confiante quando voltei, mas meu tênis não estava em alto nível. Ganhei muitos jogos competindo. Pelo histórico que tive, às vezes as meninas tinham chances, mas duvidavam e cometiam alguns erros, até mentais", afirma.

Bia, que também encarou as suas dificuldades, agora valoriza a chance de jogar novamente contra as melhores. "Foram muitas pedras no caminho: momentos difíceis, lesões, frustrações, aprendi muito. São esses momentos que me fazem ver um jogo de tênis de uma forma não tão grande, me fazem colocar o pé no chão e falar 'cara, já pensei por tanta coisa difícil, já fiquei longe do que eu mais amava, não vai ser agora, num momento tão gostoso, de entrar na quadra contra a número 3 do mundo, que isso vai ser difícil para mim", diz.

Antes do duelo contra Pliskova, Bia foi orientada pelo técnico a olhar apenas para si e fazer exatamente aquilo que já trabalha nos treinos, não buscar uma bola mais forte ou um estilo de jogo diferente. "Se eu colocasse na minha cabeça que estava entrando em Masters 1.000, com oportunidade de jogar sem pressão, um jogo que eu sabia que ia ser televisionado para o Brasil, numa quadra grande, com torcida, número 3 do mundo, eu não ia jogar. Não tem como. Tinha que canalizar minha mente no meu jogo", explica a estratégia.

Olhar para si e tentar permanecer no presente são desafios que a tenista, declaradamente ansiosa, persegue com afinco. Medita todo dia ao acordar, trabalha com a psicóloga esportiva Carla Di Pierro e procura se afastar das redes sociais nos momentos mais importantes, como nesta semana.

Ela afirma nem ter dado bola, por exemplo, para a enxurrada de críticas que o canal ESPN recebeu ao cortar na TV fechada o fim de seu jogo contra Pliskova e transmiti-lo apenas no serviço pago de streaming Star+.

Apesar de muitos espectadores terem perdido os momentos decisivos do confronto, a vitória pôde ser comemorada como mais um grande momento do tênis feminino brasileiro em 2021. O ano teve ainda a inédita medalha olímpica conquistada por Luisa Stefani e Laura Pigossi em Tóquio, além de boas campanhas de Luisa, atualmente em recuperação de cirurgia, no circuito mundial de duplas.

"Como não temos tantas referências por perto, quando elas fazem o que fizeram [no Japão] mostram que a gente pode estar lá. E quando eu tenho uma semana dessas mostra para elas também. Uma puxa a outra, e resultados assim só fazem a gente ficar mais forte, mais unidas. É muito legal ver a mulher ocupando o espaço dela num mundo que a gente sabe que ainda sofre muito com o machismo", afirma.

Bia jogará mais quatro torneios até o fim do ano. Com boas chances de entrar diretamente na chave principal do Australian Open, no início de 2022, ela quer aproveitar o fim de temporada para trabalhar principalmente sua agressividade, o jogo de rede e ampliar as variações.

A partida contra Kontaveit já virou objeto de estudo para corrigir falhas, mas a avaliação geral é otimista. "Hoje me sinto mais preparada, tenho um físico muito melhor, me sinto mais viva e consciente na quadra. A questão é de tempo. Não sei quando, mas tenho certeza que vou passar o ranking de 2017."

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