Câmara aprova Lei do Mandante com trecho favorável à Globo
Projeto foi aprovado por 432 votos a 17 e agora segue para avaliação do Senado
A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (14), por 432 votos a 17, o projeto de lei que altera a chamada "Lei do Mandante". Agora, a discussão vai para o Senado Federal, onde o texto ainda pode ser alterado.
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Caso avance e seja sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o projeto vai alterar a Lei Pelé, que determina que uma emissora de televisão ou rádio, para transmitir um jogo de futebol, precisa ter contrato vigente com as duas equipes envolvidas na partida.
O novo texto diz que "pertence à entidade de prática desportiva de futebol mandante o direito sobre o espetáculo desportivo". Ou seja, a emissora que tiver contrato com o time da casa poderá transmitir o jogo, independentemente do acordo que o visitante tenha.
O projeto marca mais um capítulo da briga entre o governo federal e a Rede Globo. Seu avanço é um triunfo do primeiro e dos clubes, que defendem a mudança na lei. No entanto, uma emenda acrescida ao texto diminui o impacto imediato para a emissora.
A disputa mobilizou todos os clubes das Séries A e B e o governo federal, que é autor do projeto.
"Os clubes foram os protagonistas e conseguiram mobilizar boa parte do Parlamento e o Poder Executivo. Eu deposito nessa articulação 100% da motivação e da urgência para o andamento da proposta", afirmou o deputado Felipe Carreras (PSB-PE), presidente da Comissão de Esporte da Câmara.
As agremiações reivindicam mais liberdade para negociar os contratos de televisão. O novo texto também permite que o próprio clube transmita a sua partida.
O principal foco do debate é se a nova lei, caso aprovada, valeria ou não para os contratos que estão em vigor.
Na TV fechada, 13 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro têm contrato com a Rede Globo para a exibição de partidas no SporTV: América-MG, Atlético-MG, Atlético-GO, Red Bull Bragantino, Chapecoense, Corinthians, Cuiabá, Flamengo, Fluminense, Grêmio, Internacional, São Paulo e Sport. Os acordos valem até 2024.
Os outros sete possuem vínculo com a Turner, que transmite os jogos no canal TNT: Athletico, Bahia, Ceará, Fortaleza, Juventude, Palmeiras e Santos.
Na atual legislação, a Turner poderia transmitir apenas as partidas em que detivesse os direitos de ambas as equipes, um total de 42. No novo formato (se mantida essa divisão), a empresa ampliará sua gama para 133 jogos.
O maior prejuízo para a Globo seria perder a exclusividade das transmissões de clubes como Flamengo, Corinthians e São Paulo.
Hoje, a empresa tem acordo com todos as agremiações para a TV aberta -para o pay-per-view, apenas o Athletico não assinou com a Globo. Ou seja, aqueles jogos que têm dois contratos e que, portanto, não podem ser exibidos na TV fechada (Flamengo contra Palmeiras, por exemplo), só podem ser vistos na Globo ou no Premiere -o que impulsiona as assinaturas do serviço pay-per-view.
A emissora carioca entende que, mesmo que aprovada, a legislação não pode afetar os contratos atuais, que valem até 2024. E é nesse ponto que a batalha dos direitos pode se prolongar, mesmo que o projeto passe pelo Senado e receba a chancela de Bolsonaro.
Os clubes, por exemplo, podem entrar na Justiça para garantir que a lei se sobreponha aos contratos vigentes, enquanto a Globo, por outro lado, pode optar pelo mesmo caminho para garantir que os acordos sejam respeitados.
Por isso, o deputado Arthur Lira (Progressistas-AL) segurou a votação do projeto, mesmo após aprovada sua urgência, para que fosse criado um consenso. Foi acrescido ao texto um trecho que explicitamente garante que a nova lei não afetará os contratos em vigor.
"Deixei claro também que os times que não têm contratos fechados com qualquer empresa, em alguma plataforma, terão o direito de usar a Lei do Mandante assim que a lei for sancionada. Por exemplo, a Ponte Preta, se subir à série A, não terá contrato com ninguém. Nesse momento, teria a possibilidade de usar a Lei do Mandante para negociar um novo acordo", explicou o relator do projeto, o deputado Julio Cesar (Republicanos-DF).
Em teoria, a nova lei também dá liberdade para o Athletico continuar transmitindo suas partidas po streaming e outras formas de pay-per-view, já que ele é o único sem acordo com a Globo nessa plataforma.
Entusiasta da lei, o deputado Luiz Lima (PSL-RJ) entende que os contratos em vigor devem ser respeitados, e que o Poder Judiciário não pode interferir naquilo que decidir o Legislativo.
"Existem buracos nas transmissões, principalmente na negociação com plataformas da internet, e também com TVs locais. A lei ajudaria clubes pequenos a negociar seus jogos regionalmente, de forma mais eficaz, e o produto futebol pode valer mais, sem sair mais caro, mas por ter mais maneiras de transmissão", afirmou Lima.
"A solução para os clubes do Brasil é a negociação coletiva. Pode ser através da Liga, de uma assembleia dos clubes, aos clubes cabe resolver. Mas a negociação tem que ser coletiva para que isso não faça a espanholização do futebol brasileiro, com dois clubes fortes e os demais fracos", contra-argumentou o deputado Renildo Calheiros (PC do B-PE).
Segundo ele, o risco é que a nova legislação faça com que cada clube negocie individualmente com as emissoras o seu direito. Defende ainda que uma negociação em bloco aumenta o poder de barganha e, consequentemente, o valor total dos contratos.
Inimigo declarado da Rede Globo, o presidente Bolsonaro é um entusiasta do projeto. Antes, o governo federal já havia tentado alterar a lei por meio de uma Medida Provisória. A iniciativa, no entanto, ficou marcada pela participação do Flamengo e acabou naufragando.
Para o projeto de lei, clubes das três principais divisões do país se uniram na articulação política, tanto no Congresso Federal quanto em reuniões com Bolsonaro.
Com ajuda do deputado Arthur Lira, presidente da Câmara e aliado do governo, a proposta ganhou caráter de urgência e, finalmente, avançou.
A participação do governo federal é vista por muitos como motivada pela briga entre Bolsonaro e a Globo, e por isso também é criticada.
"Depois desse capítulo, acho que o presidente tem que parar e deixar o Parlamento, por meio do debate democrático e ouvindo os atores, legislar. Fazer um diálogo mais justo e equilibrado. Primeiro ele mandou uma Medida Provisória, depois o projeto com urgência, então ficar mandando projeto o tempo todo e ficar pressionando talvez não seja saudável para debates que precisam ser mais desenvolvidos", afirmou Felipe Carreras.
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