Conheça o Clube Laguna SAF, o primeiro time vegano do Brasil
No Dia Mundial do Veganismo, a Folha de Pernambuco conta a história de uma equipe do Nordeste que adotou o estilo de alimentação
Dos mais variados artigos escritos pelo sociólogo pernambucano Gilberto Freyre, um dos mais famosos é o “football mulato”, de 1938, quando analisou, durante a Copa do Mundo da França, a importância da miscigenação racial na Seleção, tanto no aspecto técnico como também cultural e social. Algo pouco discutido à época, mas que se tornou característica decisiva no sucesso do futebol brasileiro. Quase um século depois, as visões do escritor serviram de espelho para a criação de um clube no Nordeste. O Laguna SAF também quer quebrar preconceitos para construir valores - ainda que com uma temática diferente. A ideia é ser uma inspiração na luta socioambiental. A começar por uma alcunha: a de primeiro time vegano do Brasil.
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O veganismo, que tem o dia mundial comemorado nesta sexta (1º), é um estilo de vida que se opõe à utilização de produtos ou alimentos que sejam de origem animal. Filosofia seguida por Gustavo e Deia Nabinger, fundadores do clube, e apoiada também por Rafael Eschiavi, vegetariano e um dos sócios do Laguna.
Valores
"Eu queria um time que representasse a essência do futebol brasileiro. O nosso slogan é ‘alegria de jogar futebol’. Não podemos garantir que vamos ganhar sempre, mas queremos pensar em algo maior. Eu adoro os textos de Gilberto Freyre e inclusive penso em conseguir autorização para pegar frases dele e colocar nas nossas camisas. Entendo que o esporte tem um aspecto social importante. Um local em que você pode falar de temas como o da sustentabilidade. Foi pensando nisso que decidimos colocar um dos nossos lemas, o veganismo. Eu e Deia somos veganos. Rafael é vegetariano. Então percebemos que não fazia sentido fundar uma empresa que não tivesse nossos valores", afirmou Gustavo Nabinger, um dos três sócios-proprietários e CEO do Laguna.
Fundado em 2022, no município de Tibau do Sul, no Rio Grande do Norte, o Laguna SAF tem como objetivo evitar qualquer utilização de recursos de origem animal. O cardápio dos atletas, por exemplo, foi criado por chefs de cozinha vegana e nutricionistas, com suporte da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB).
Alimentação
"Temos um plano que informa o quanto de proteína, carboidrato e fibras são necessários para os atletas e, diante disso, montamos o cardápio. No começo, é comum eles se sentirem inseguros, mas nós temos uma abordagem informativa, explicando que as necessidades nutricionais serão atendidas. A dieta traz uma recuperação muscular mais rápida, é antiinflamatória e melhora a digestão. Nós também procuramos fazer receitas que eles conhecem, mas com a base vegetal, como almôndega, bolo, pães recheados, dentre outras”, apontou a coordenadora do departamento de gastronomia da Sociedade Vegetariana Brasileira e chef do clube, Mirna Ribeiro.
Não é somente na alimentação que o Laguna SAF busca lutar contra a exploração animal. “Nossos produtos de limpeza também são veganos. Nosso material esportivo também é mais sustentável, mesmo não sendo ainda 100%. Temos uniformes de passeio feitos de algodão orgânico. Lógico que há coisas que não podemos mudar, como a bola, por exemplo, que pode ter na cola um ingrediente de origem animal. Fazemos aquilo que está ao nosso alcance. Temos também parcerias com institutos e ONGS, ajudando a realizar mutirões de limpeza nas praias. Queremos quebrar preconceitos e, por meio do futebol, conscientizar a população local a respeito da sustentabilidade", frisou Gustavo.
Ex-jogador do Náutico, o volante Jean Mangabeira defendeu o Laguna há dois anos e destacou a experiência vegana que mudou sua visão sobre alimentação.
“Foi uma proposta estranha no início. Na hora que ele me falou que o clube era vegano, eu fiquei preocupado se isso ia aumentar a chance de ter lesão ou se eu não conseguiria ter a proteína necessária. Mas quando cheguei lá, eu vivi uma experiência maravilhosa. Descobri que é possível ser um atleta de alto nível com uma dieta sem produtos animais. Superou minhas expectativas. Antes eu comia muito filé, mas lá eu passei a comer berinjela empanada, que lembra muito o gosto do frango. Até churrasco vegano fizemos, com almôndega de soja, cogumelo e hambúrguer vegano. Tudo muito saboroso”, declarou o volante, que hoje atua no Tacuary, do Paraguai.
“Aprendi que a alimentação vegana contribui para o ganho de desempenho. Joguei 11 partidas em dois meses e não tive lesão. A recuperação nos treinos também era superior. Se só tivessem me falado desses benefícios, sem eu ter vivido, eu não acreditaria. Depois que saí de lá, eu fui introduzindo a dieta aos poucos em casa também, com a minha família. Não adotei 100% porque nos demais clubes é difícil ter essa alimentação, mas seria legal se eles tivessem duas, três vezes por semana esse tipo de dieta”, completou.
Ambição
O Laguna SAF disputa a segunda divisão do Campeonato Potiguar. Apenas o primeiro colocado do torneio sobe para a elite estadual. A ambição do clube, porém, está bem acima. “Nosso objetivo é chegar à Série A até 2032”, reforçou o CEO. Recentemente, a equipe fez a primeira grande venda da história, negociando o atacante Kaiky, de 18 anos, por R$ 2 milhões para o Botafogo. O elenco conta com um velho conhecido da torcida pernambucana, o atacante Bill, ex-Sport. Além disso, Gustavo Nabinger já trabalhou como treinador do Vitória/PE.
Primeiro clube vegano do Brasil, o Laguna também se inspirou no Forest Green Rovers, da Inglaterra, pioneiro no mundo em adotar a bandeira do veganismo. Além da alimentação sem utilização de produtos animais, a equipe tem uniformes feitos com resíduos de grãos de café, estádio alimentado por energia 100% renovável, com estações para recarregar baterias de carros elétricos, além de um gramado orgânico, sem uso de fertilizantes.