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Futebol

Direitos de TV da Copa explodiram com mercado, audiência e corrupção

FifaFifa - Foto: AFP

As negociações dos direitos de transmissão da Copa do Mundo de 1970 chegaram a um impasse a poucos meses do início da competição, realizada no México. A organização do torneio pedia cerca de US$ 1 milhão para as emissoras brasileiras interessadas, mas elas queriam pagar US$ 500 mil. Após uma longa tratativa, Globo, Tupi, Bandeirantes e Record se juntaram e dividiram os US$ 715 mil acertados. Atualizados para os valores atuais, a exibição custou US$ 4,7 milhões (o equivalente a R$ 25,7 milhões).

Cinquenta anos depois, o Grupo Globo trava uma disputa judicial com a Fifa para reavaliar o contrato que lhe deu exclusividade nas Copas de 2018 (Rússia) e 2022 (que será realizada no Qatar), entre outros eventos organizados pela entidade máxima do futebol, como a Copa feminina, Mundiais de clubes e das categorias de base. O grupo entrou na Justiça para rever o pagamento da parcela deste ano, de US$ 90 milhões (R$ 491,6 milhões). No total do acordo, que compreende o período de 2015 a 2022, são US$ 600 milhões, ou US$ 684 milhões corrigidos (R$ 3,7 bilhões).

A emissora defende que a pandemia da Covid-19 comprometeu suas receitas e pede uma renegociação, até o momento rejeitada pela Fifa. Por meio de nota, a entidade que organiza o Mundial afirma não considerar apropriado comentar os procedimentos legais e que sempre teve diálogo construtivo com a empresa brasileira. "A Fifa espera que os compromissos firmados pela Globo sejam respeitados e está confiante de que uma solução será encontrada", declarou.

O grupo de mídia conseguiu na semana passada uma liminar na 6ª Vara Empresarial da Justiça do Rio de Janeiro para não pagar de forma imediata a parcela de 2020. Se não houver entendimento, o caso deverá ser julgado na Justiça da Suíça.
A reportagem apurou que a Fifa não trabalha com a possibilidade de a Globo abrir mão da Copa de 2022 e acredita que as partes chegarão a um acordo. Imbróglios fizeram parte historicamente das negociações, mas hoje os valores praticados nesse mercado são muito maiores, acompanhando o gigantismo que os eventos adquiriram e também os escândalos de corrupção que os cercaram e cercam.

No Mundial de 1970, Globo, Tupi, Bandeirantes e Record tinham direito a apenas um canal de áudio, e os narradores se revezavam nas transmissões dos jogos da seleção brasileira. Em 2018, a Globo levou à Rússia uma equipe de 197 profissionais. A Copa do Mundo é o torneio esportivo mais visto do planeta. A estimativa da Fifa é que 3,5 bilhões de pessoas assistiram à sua última edição.

Em outubro de 2017, a oito meses do início da competição, a Globo já havia negociado suas seis cotas de patrocínio para o torneio apenas em TV aberta. Embolsou R$ 1,08 bilhão. Os valores dos contratos de transmissão da Copa do Mundo explodiram assim que terminou o torneio na França, em 1998. O acordo para exibir aquela competição custou US$ 15 milhões (em valores atuais), divididos por cinco canais brasileiros (US$ 3 milhões para cada um deles, ou R$ 16,4 milhões).

Meses depois, a Globo acertou a exclusividade para mostrar os Mundiais de 2002 e 2006 por US$ 319 milhões (corrigidos). Pela cotação atual, o equivalente a R$ 1,74 bilhão. O crescimento é reflexo de vários fatores. Há 50 anos, no primeiro Mundial com transmissão para o Brasil, era a nação organizadora da competição, no caso o México, que vendia os direitos que hoje representam uma das maiores fontes de riqueza da Fifa.

De 1974 a 1998, as emissoras brasileiras precisaram negociar com a OTI (Organização das Televisões Iberoamericanas), uma entidade sem fins lucrativos que tinha contrato com a Fifa e fazia a revenda aos países de língua latina. Quando o acordo expirou, a Fifa repassou para a empresa ISL os direitos de TV e de merchandising dos torneios de 2002 e 2006 por cerca de US$ 2 bilhões (US$ 3,15 bilhões em valores atuais ou R$ 17,2 bilhões).

Parceira da Fifa desde 1975, a ISL (que teve como um dos fundadores o alemão Horst Dassler, dono da Adidas) faliu em 2001. A organização que comanda o futebol se viu obrigada por contrato a pagar cerca de US$ 1,85 bilhão (R$ 10,1 bi) para credores da empresa ligados à Copa do Mundo. Uma investigação nas suas contas descobriu que propinas foram pagas a oficiais da Fifa para assegurar contratos de transmissão dos Mundiais. Acordo de TV referentes a torneios de futebol tornaram-se parte central do Fifagate, escândalo que estourou em 2015 e levou à cadeia ou baniu do esporte 21 dirigentes ou executivos de emissoras.

No Brasil, foram presos o ex-presidente da CBF José Maria Marin e os empresários José Margulies e J.Hawilla. Ricardo Teixeira e Marco Polo del Nero, também ex-mandatários da confederação, foram alvos de ordem de captura internacional e não deixaram o Brasil desde então. A Globo foi citada 14 vezes na delação do argentino Alejandro Buzarco à Justiça americana. Ele disse que a emissora brasileira pagou US$ 15 milhões (R$ 82 milhões) em propinas para assegurar a compra dos direitos de transmissão das Copas de 2026 e 2030, que ainda não foram negociados de maneira formal pela Fifa.

A delação aconteceu em 2017. Em nota à época, a Globo afirmou que "não pratica nem tolera qualquer pagamento de propina" e que em suas investigações internas apurou que jamais foram feitos pagamentos fora dos contratos. A Globo transmitiu sozinha a Copa de 2002 nas TVs aberta e fechada, nesta por meio do SporTV. Não foi a primeira exclusividade da emissora. Em 1982, havia acontecido o mesmo, mas por outros motivos. A OTI determinara que apenas os canais que exibissem a Olimpíada de Moscou, em 1980, poderiam mostrar o Mundial da Espanha. A Globo aceitou, mas suas concorrentes, não.

Nos Mundiais de 2006 e 2018 isso voltou a acontecer, porém apenas em TV aberta. As denúncias de corrupção em contratos não foram interrompidas. Em abril deste ano, dois executivos da 21st Century Fox foram indiciados por suspeita de pagamento de subornos a dirigentes da Fifa para fechar acordos de transmissão para os Estados Unidos referentes aos torneios de 2018 e 2022.

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