Homenagem

Elzinha, estrela do futebol feminino nos anos 80, é gari no Rio e faz homenagem a jogadoras da Copa

Elzinha Nogueira jogou no Maracanã lotado, fez carreira no Bangu e hoje, aos 63 anos, varre ruas no Rio: 'Durmo cedo, acordo às 4h30 e vou trabalhar feliz'

Elzinha fez história no início do futebol feminino no Brasil Elzinha fez história no início do futebol feminino no Brasil  - Foto: Arquivo Pessoal e Thayná Rodrigues

Elza Nogueira, a Elzinha, gargalha de alegria e brinca, na expectativa de ver o Brasil estrear na Copa do Mundo da Austrália, na próxima segunda-feira (24). 

— Meu patrão Eduardo Paes que me perdoe, mas segunda-feira eu só varro a rua até 7h30 (risos). Às 7h40, vou dar uma olhada nas meninas da seleção. Vai ser 5 a 1 contra o Panamá.

Ex-jogadora e tricampeã pelo Bangu da Taça São Paulo (disputada por diversos times femininos brasileiros), a aposentada era a Marta carioca. Para O GLOBO, ela posou na pintura da grafiteira Andressa Gandra em Oswaldo Cruz, homenagem à seleção feminina na Copa. E é nas ruas, há 25 anos, que Elza mostra outra de suas qualidades: a de funcionária exemplar da Comlurb.

— Sou aposentada, mas continuo trabalhando, em Campo Grande! Gosto de varrer, conversar com as pessoas... Acordo às 4h30 da manhã e vivo a vida com alegria — diz, aos 63 anos, a moradora de Vila Kennedy, na Zona Oeste do Rio.

A simpatia aliada ao talento fora da curva para os gramados fizeram a carioca de 1,50m deslanchar no esporte. Em 1983, época em que jogou pelo Bangu um amistoso contra o Cruzeiro com o Maracanã lotado, o futebol feminino tinha seis dias de regularizado.

— Realizei o maior sonho da minha vida — diz, mostrando fotos do evento memorável num dia em que os jogadores de Flamengo e Corinthians disputariam uma partida valendo pontos.

Por quase 40 anos, entre 1941 e 1979, a modalidade esportiva era proibida para mulheres devido a um decreto-lei assinado pelo então presidente Getúlio Vargas.

Craque no afeto

Elzinha é casada há quase 30 anos com Mary Clares Fernandes, com quem tem três filhas e sete netos. Gustavo, de 18 anos, é da terceira geração e diz:

— Ela é muito família e conserva uma alegria. Quando passou a matéria mostrando o campeonato no "Fantástico", domingo, todo mundo foi assistir, chorou...

Com a idade atual do neto, saiu de casa, foi morar sozinha em busca de liberdade e nunca deixou de ter o carinho da família nem de fazer acontecer, apesar das adversidades do início:

— Eu comecei a jogar com 9 anos, com os moleques da rua, na Vila Kennedy. "Vamos jogar uma pelada? Vambora!" A gente capinava os matos e fazia campo. Fui ficando adolescente e comecei a ir jogar amadores em Barra do Piraí (no sul do estado), depois em Padre Miguel... Na época, treinávamos com os garotos e jogava contra os times femininos.

Na maioridade, a atleta viajou à Europa emprestada pelo Bangu ao time Radar, de Copacabana, na Zona Sul do Rio. Em seguida, continuou a carreira no clube suburbano, comandado por Castor de Andrade. Antes da profissionalização, era de praxe não ser remunerada em outras equipes.

— Eles faziam uns almoços para a gente. Íamos porque gostávamos muito de jogar e de participar das comemorações — explica, lembrando que a mãe se tornou pensionista após ficar viúva, bem jovem. — Ouvi do Eurico Lira, presidente do Radar, que a gente precisava estudar e ter um trabalho para se manter. Porque não sabíamos o que ia acontecer com o futebol feminino. Então, fui atrás e consegui me formar no Ensino Médio.

Na fase áurea, a equipe feminina do clube de Castor foi campeã de três Taças São Paulo.

— Cheguei a ser chamada para o Atlético Mineiro com a Rose (colega de Bangu). Era um time bom, mas não me adaptei. Voltei logo para o Rio, para o Radar, que me pagava direitinho. Mas com um tempo, os campeonatos foram diminuindo. Aí parei de com o futebol, fui trabalhar numa ótica e depois na Comlurb, onde estou até hoje — lembra.

Os vídeos da época saudosa foram ao ar no “Fantástico”, da TV Globo, no último domingo. E, tal qual acontecia com a torcida quando a atleta de 1,50m era a fera dos gramados, a vizinhança foi ao delírio:

— Começaram me parar na rua, pedir foto, falar que me viram na televisão... O pessoal do Instagram — orgulha-se.

Atualmente, a média de salário de uma jogadora de clube que disputa a primeira divisão do futebol brasileiro é de R$ 2,5 mil, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, da Secretaria da Previdência e Trabalho do Ministério da Economia. Com benefícios, alguém que trabalha como gari comum da Comlurb no Rio ganha um salário base de R$ 1,530 mais insalubridade de R$ 595. Nos tempos idos, Elzinha ganhou experiência como atleta em times da Zona Oeste do Rio sem receber salário.

— Hoje em dia, a realidade está mudando. As jogadoras têm mais visibilidade, existe um mercado. Eu continuo na torcida pelas mulheres do Brasil! E pelo meu Botafogo! Fico nervosa assistindo às partidas (risos)!

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