Manipulação de jogos: vazamentos de apostas irritaram quadrilha nas conversas
Diálogos entre apostadores mostram preocupação com possível diminuição de ganhos no compartilhamento de informações
“Parceiro meu acabou de me mandar aqui”, escreveu um dos integrantes da quadrilha acusada de manipular resultados do futebol brasileiro para seus comparsas em 16 de outubro do ano passado.
Pouco antes, o homem, identificado somente como “João Vitor P.” no grupo de WhatsApp, havia enviado uma imagem com um print de tela de um site de apostas, com uma combinação inusitada de palpites, em que vários jogadores deveriam receber cartões amarelos na rodada seguinte do Campeonato Brasileiro.
A aposta era exatamente a mesma que o grupo estava armando e havia sido previamente combinada com os atletas. “Tem alguém vazando a parada”, concluiu Bruno Lopez, preso sob a acusação de ser chefe do grupo.
As conversas obtidas pelo Ministério Público de Goiás (MPGO) revelam que a quadrilha convivia com vazamentos das combinações de apostas fraudulentas, o que irritava seus integrantes e gerava episódios de “caça às bruxas” dentro do bando. As principais suspeitas do grupo recaíam, com frequência, sobre os próprios atletas que haviam concordado em participar do esquema e em empresários que atuavam como intermediadores das apostas. Para os investigadores, os vazamentos indicam que outras quadrilhas operavam simultaneamente o esquema de manipulação de resultados.
“Eu vou atrás de quem tá soltando”, prosseguiu João Vitor, que ainda não teve sua identidade completa desvendada pelo MPGO. “Já tem que chamar na ideia e pedir pra ele falar quem vazou”, disse outro homem, também não identificado. Quanto mais pessoas fazem a mesma aposta, menos dinheiro ela gera; daí o descontentamento da quadrilha.
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Após conversar com o contato para quem a aposta foi vazada, João Vitor voltou a escrever no grupo: “Vocês conhecem o Romário, ex-jogador do Palmeiras? O mlk disse que ele tá vendendo pros cara uns nome de jogadores”. Ele se referia a Romário Hugo dos Santos, o Romarinho, um dos presos na Operação Penalidade Máxima, acusado de intermediar as apostas com jogadores para a quadrilha.
“Romarinho é conhecido aqui em São Paulo, viado. Mas o que não dá pra entender, veinho, é como que ele tá vendendo jogadores, sendo que o jogadores era nosso, tendeu? Tem que chamar o Romário e trocar umas ideia ma disse outro comparsa”. Romarinho foi o responsável, por exemplo, por cooptar o zagueiro Eduardo Bauermann para o esquema.
Um dia antes, o grupo de apostadores já havia suspeitado que o jogador Richard, ex-Ceará e hoje no Cruzeiro, estava vazando as combinações para outras pessoas. “Esse Richard aí é um sem vergonha. Não sei se é ele, se é empresário, quem que vocês tá entrando em contato com ele aí. É um pilantra, um safado, um semvergonha mano, porque já bateu nos cara aqui”, disse, num áudio um homem identificado como Guilherme Alpino. “Às vezes não é nem o jogador, é o empresário que sai vendendo o cara para uma pá de gente”, ponderou outro membro do grupo de financiadores das apostas.
Richard chegou, inclusive, a ser questionado pelos integrantes da quadrilha, mas negou ter vazado a combinação. “Durante a semana veio uns três nego (sic) querendo fechar algo comigo e não fecho com ninguém a não ser você. Sou papo reto, bagulho não é brincadeira. Mas se o man (sic) aí não quiser mais é isso mesmo”, escreveu o jogador. A mensagem foi compartilhada no grupo.
Num terceiro diálogo travado no grupo, Bruno Lopez compartilha uma postagem feita no Twitter, denunciando a “entrada grande de dinheiro em cartões pra Vitor Mendes e Paulo Miranda, ambos do Juventude, contra o Fortaleza”. As conversas do grupo indicam que os atletas, de fato, haviam sido cooptados pelo grupo. “Mano, devem ter colocado info na rua mesmo”, lamentou um dos integrantes da quadrilha. “Sim, vacilões”, concordou Bruno Lopez.