Inclusão

Promovendo cidadania e inclusão, karatê prestigia jovens com deficiência no Parque Santos Dumont

Aulas acontecem nas terças, quintas e sábados, no período da tarde

Turma de karatê comandada pelo sensei Manoel Laurentino, no dojô do Parque Esportivo Santos Dumont, em Boa Viagem Turma de karatê comandada pelo sensei Manoel Laurentino, no dojô do Parque Esportivo Santos Dumont, em Boa Viagem  - Foto: Ricardo Fernandes/Folha de Pernambuco

As práticas esportivas podem criar ambientes de cooperação e igualdade. Ainda mais, podem ser um importante aliado para melhorar a autoestima, a qualidade de vida das pessoas e desenvolver habilidades importantes, como o trabalho em equipe, a disciplina e o respeito. Sob esses pilares, o sensei Manoel Laurentino integra pessoas com e sem deficiência no dojô de karatê do Parque Esportivo Santos Dumont, em Boa Viagem, na zona sul do Recife, sem promover distinção entre os participantes, e respeitando cada individualidade.  

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2019, o Brasil contava àquela altura com pelo menos 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência. Incluídos na sociedade, a Constituição Federal Brasileira prevê a obrigatoriedade do poder público em promover e assegurar o acesso às atividades paradesportivas. Incluir ações como essas oferecem alternativas de inclusão social e funcional das pessoas com deficiência. 

Às terças, quintas e sábados, o sensei Manoel reúne dez PCDs, cada um com sua especificidade, junto com outros alunos sem deficiência. Para o mestre em karatê, a concepção de que as pessoas com deficiências não têm capacidade de dividir espaço com as outras vem caindo por terra. 

“Há 20 anos atrás, havia preconceito de que essas pessoas não eram capazes de praticar esportes em meio às pessoas sem deficiência. Então o Santos Dumont abriu as portas para que os PCDs pudessem treinar e competir todos juntos, todo mundo no mesmo esporte, com as mesmas correções, movimentações, todos juntos”, disse Manoel que está há 25 anos com o projeto no Santos Dumont. 

Sobre o processo de ensino do karatê, o sensei reforça que não há distinção entre aquilo que é ensinado para os alunos com ou sem deficiência. “Eu não posso diferenciar a aprendizagem, as técnicas, movimentações, correções e penalizações”, disse. 

Manoel também citou a dificuldade e o aprendizado que tem ao lidar com pessoas de diferentes necessidades, não só dentro do tatame. “É uma guerra, que a cada dia venho aprendendo com eles mesmo. Por exemplo, temos cadeirante, temos Down, temos autistas, então possuímos diversas modalidades de PCDs, e a gente inclui todos”, contou. 

Esporte, fator de interatividade e disciplina

Para além dos benefícios físicos, as atividades esportivas exercem papel mental e comportamental importante. As mães dos alunos que possuem algum dos transtornos mentais conseguem enxergar algum tipo de melhoria nos filhos após a entrada nas aulas de karatê. Joyce Melo, mãe de João, destacou as contribuições para o filho - que tem autismo nível II e hiperatividade - ao longo dos últimos anos. 

“O esporte vem influenciando muito na vida dele, principalmente na parte comportamental, porque ele se tornou uma pessoa mais centrada, passou a ter a aceitação do ‘não’, passou a ter interação com outras crianças, coisa que não fazia. Ele não tinha uma rodinha de amigos, sempre foi muito só”, disse. 

O desenvolvimento de amizades é algo que Maria das Neves, mãe de Miguel, que também tem autismo nível II, celebra. “Ele vivia em um ‘casulo’, e quando começou a praticar karatê, percebi mais segurança, mais interações de amizade, que ele não conseguia se comunicar”, contou. 

Muito ligado às artes marciais orientais, os valores de disciplina e concentração são fatores importantes para esses alunos. Simone Oliveira, mãe de Lucas, que tem Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), hiperatividade e Transtorno Opositivo Desafiador (TOD), relatou que o filho vem apresentando melhoras na escola e nas terapias, e revela se surpreender com o desenvolvimento dele.

“Ele está bastante concentrado, o problema de Lucas é que ele é muito hiperativo e foi a psicopedagoga que indicou ele para cá. E é um esporte - karatê - que ele controla a agressividade, o TOD tem um pouco disso, então tem melhorado bastante ele, aqui eles são disciplinados”.

 

Superação das barreiras físicas  

O karatê desenvolvido pelo sensei Laurentino é do estilo shotokan, reconhecido pela movimentação de pernas e controle de distância. Mesmo com essas características, Daniel Alex, que tem atrofia muscular nas pernas, não se limita nos treinos, apesar de reconhecer precisar fazer um esforço físico maior do que a maioria. 

“É difícil. Além dos movimentos técnicos que eu tenho que executar, preciso pensar também nos movimentos da cadeira. No meu caso, eu tenho que fazer o movimento e manusear a cadeira em seguida. Diferente de quem não tem deficiência, que pode fazer os dois simultaneamente. É como se precisasse fazer dois movimentos, enquanto outros conseguem fazer em apenas um”, explicou. 

Para Kauã Pinheiro, de 11 anos, a prática esportiva surgiu a partir de uma indicação médica. “Ele tem uma deficiência motora congênita, por causa de Mielomeningocele, que é uma má formação na coluna”, começou Alessandra, mãe de Kauã. 

“Para as pessoas com deficiência, o esporte é muito mais que a questão da saúde, é a integração, a questão do sono, da questão da reabilitação motora. Os profissionais que o acompanham estão percebendo que ele está melhorando no desenvolvimento global em função das atividades esportivas”, complementou. 

Apoio que gera excelência esportiva 

As escolas modernas de karatê contam com três didáticas de ensino das técnicas, formado por kihon, kata e kumite. O esporte se divide da seguinte maneira: kata se assemelha a uma luta simulada; o kihon, são os fundamentos técnicos; e o kumite é a luta em si.

Entre os alunos com deficiência, o kumite não é possível de ser realizado, sendo o kata a única atividade competitiva disponível. Ainda assim, a disputa é acirrada entre eles, com diversas competições importantes ao longo do calendário. No Santos Dumont, um nome se destaca, o de José Valdir, mais conhecido como "Juninho do Karatê". Aos 28 anos, o jovem com síndrome de down coleciona várias conquistas, inclusive internacionais.

“Ele fazia natação, aí quando passou aqui no dojô ele pediu para treinar judô, mas era muito pequeno e saiu. Depois de um tempo, ele pediu para voltar a treinar e começou no karatê, onde permanece até hoje. Elá já foi tricampeão brasileiro, vice-sul-americano e tetracampeão pernambucano”, disse orgulhosa Maria Verônica, mãe do atleta. 

Para Vera, o desempenho positivo do filho nos torneios é fruto não só do empenho e talento dele, dando crédito às conquistas para patrocínio que Juninho possui, além do auxílio do programa Bolsa Atleta

“Há dois anos que Júnior tem o patrocínio da Faculdade de Medicina de Olinda e também trabalhamos no Instituto Maria - que faz parte do grupo. Podemos disputar todas as competições graças ao Bolsa Atleta, que tem nível internacional, tanto que ele acabou de disputar o Sul-Americano”.   

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