Icterícia neonatal acomete 60% dos bebês

A alteração causada pelo aumento da bilirrubina no sangue provoca um tom amarelado na pele e nos olhos dos recém-nascidos, mas tem tratamento

Icterícia - Divulgação

Presente em cerca de 60% dos bebês que nascem no tempo certo e em 80% dos prematuros, a icterícia neonatal é uma alteração causada pelo aumento de bilirrubina no sangue, um pigmento amarelo fabricado naturalmente pelo organismo. Quando as células vermelhas se rompem, em um processo fisiológico, ocorre a liberação dessa substância, que vai direto para o fígado do bebê. Em seguida, ela é metabolizada e descartada por meio da urina e fezes.

Como as funções hepáticas da criança ainda não estão maduras, pode haver uma deficiência nesse mecanismo - a bilirrubina fica concentrada na corrente sanguínea e o tom amarelo toma conta da pele e dos olhos. Mãe de primeira viagem, a administradora Nathália Ribeiro, 34 anos, ficou assustada quando o filho Bernardo começou a ficar com a pele amarelada. Os sintomas nele começaram a parecer no segundo dia de vida. 
"Ele teve devido a diferença sanguínea entre nós dois e depois ele desenvolveu novamente devido à amamentação. Nunca tinha visto ou ouvido falar sobre a doença. Fiquei desesperada achando que ele desenvolveria algo mais grave. Foram seis dias de tratamento depois do nascimento. Ele ficou sendo acompanhado durante quatro a cinco meses, mas no fim acabou tudo bem", comenta.

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Atualmente, com um ano e oito meses, Bernardo é uma criança saudável e não apresentou sequelas. De acordo com a médica Danielle Brandão, é essencial que a icterícia seja diagnosticada o quanto antes, pois se for detectada e controlada rapidamente não apresentam riscos. "Os casos de icterícia devem ser acompanhados de perto, para detectar os riscos de bilirrubina muito elevada. Quando aparece antes das 24 horas de vida ela é patológica. Após esse período, ela deve ser acompanhada porque o pico é até o quinto dia de vida. Deve-se fazer o diagnóstico diferenciado porque a causas mais comuns são a incompatibilidade sanguínea e a dificuldade do aleitamento materno com perda de peso na primeira semana de vida", disse.

Se for observada antes disso, deve levantar suspeita para outras doenças mais sérias no fígado. "Nos bebês que ainda estão internados o pediatra consegue detectar bem o problema. Começam a ficar amarelinhos na cabeça, depois no tronco até atingir palma da mão e planta do pé. A grande preocupação é que se esse nível chegar no limite máximo a criança pode perder a audição, ficar com sequelas neurológicas ou morrer. A maioria dos recém-nascidos não desenvolve nada grave, mas cerca de 8% tem risco de desenvolver coisas graves no cérebro. Então, é importante acompanhar, pois mesmo tendo alta sem nenhum sintoma não se sabe o que pode acontecer até o quinto dia de vida, quando há o pico da icterícia", diz Danielle, que é professora assistente do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

A médica explica que a icterícia pode acometer as crianças quando houver incompatibilidade sanguínea entre mãe e filho. Por conta dessa diferença, o organismo tende a acelerar a destruição dos glóbulos vermelhos. Em alguns casos, o problema requer tratamentos específicos. Outro gatilho possível é a dificuldade de amamentação. O leite materno tem substâncias que favorecem o processamento da bilirrubina. Sendo assim, quando o bebê não mama bem, pode ficar com excesso do pigmento. Prematuros tardios (que nasceram com 34 a 37 semanas de gestação) são os principais afetados, justamente por não terem uma capacidade de sucção bem desenvolvida.

Normalmente, a disfunção é superada assim que a ingestão de leite materno aumenta. A quantidade de pigmento considerada inofensiva varia de uma criança para outra. Para calcular, os médicos levam em consideração a idade gestacional e o peso do bebê. Para detectar a icterícia, o exame mais comum é o físico: o médico pressiona o dedo na testa da criança e, depois de removê-lo, nota se a pele ficou branca ou amarela.

É importante fazer uma coleta sanguínea para medir, com precisão, os níveis de bilirrubina no sangue. Assim, o pediatra consegue dar início ao tratamento para conter o avanço da doença. Outro teste é feito com o bilirrubinômetro cutâneo. O equipamento permite a leitura de bilirrubina sem precisar dispor de uma amostra sanguínea. Contudo, a técnica não é tão precisa quanto a primeira.

Pediatras recomendam banho de luz
A médica Danielle Brandão, que atende na Policlínica e Maternidade Professor Arnaldo Marques, no Ibura, Zona Sul do Recife, conta que se a icterícia não regredir espontaneamente, a fototerapia é o tratamento mais indicado. Popularmente conhecida como banho de luz, a técnica expõe a criança à luminosidade emitida por lâmpadas específicas, que atinge diretamente a estrutura do pigmento, para eliminá-lo.

O tempo de aplicação da fototerapia e a intensidade são avaliadas caso a caso. Em média, os recém-nascidos acima de 35 semanas sem doença hemolítica fazem o tratamento em torno de 24 a 36 horas. Em situações mais extremas, quando a fototerapia não dá conta, pode ser feita a exsanguíneo transfusão (EST). "O banho de sol que se dá de 8h não adianta é um mito. Teria que ser o sol de meio-dia para baixar a taxa, mas não recomendável devido os raios infravermelhos", explica a médica. Existem fatores de risco que ajudam a identificar se a criança pode desenvolver a icterícia.

"Entre eles, o tipo sanguíneo da mãe. Também tem exames que detectam se há alguma alteração. Se a mãe tiver filho prévio que já teve esse problema a chance do próximo filho também desenvolver é mais alta", exemplifica Danielle, acrescentando que a única forma de prevenir a icterícia é o aleitamento materno bem sucedido, que deve ser estimulado desde a sala de parto. Para capacitar profissionais da saúde quanto à conduta assistencial ao recém-nascido, a médica Danielle Brandão realiza o Curso de Manejo de Icterícia Neonatal (Icneo).

"Trata-se de um curso teórico-prático onde revisamos a investigação, segmento e tratamento da hiperbilirrubinemia indireta neonatal", explica. Além da discussão de casos clínicos, há um momento dedicado a práticas com equipamentos de fototerapia, radiômetros e manequins. A capacitação, feita em parceria com a Sociedade de Pediatria de Pernambuco (Sopepe), foi realizada anteontem no Hospital da Mulher do Recife, na Zona Oeste. Além desta unidade, a rede municipal é composta pelas maternidades Barros Lima, em Casa Amarela, Arnaldo Marques, no Ibura, e Bandeira Filho, em Afogados.