Vinho do Porto: tradição a cada gole
O Dia Internacional do Vinho do Porto, em 10 de setembro, celebra a bebida que é símbolo da vitivinicultura portuguesa. Saiba o porquê ele expressa tamanha personalidade em adegas de todo o mundo
Você pode até se confundir no estilo de um vinho e outro, mas não terá o mesmo dilema ao se deparar com a versão fortificada, feita com uvas da região do Douro, ao Norte de Portugal. O vinho do Porto é desses produtos fora da curva, que há séculos preserva características muito singulares a uma bebida apreciada nos quatro cantos do mundo. Não à toa, em 10 de setembro, quando o calendário aponta uma data só sua, aumenta o motivo para separar aquela taça de menor tamanho.
A origem da comemoração tem um porquê à altura. Exatamente nessa data, em 1756, foi criada a Região Demarcada do Douro, por meio da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, instituída pelo então Marquês de Pombal. O chamado “Porto Wine Day” é o momento em que produtores e comerciantes celebram os mais de 250 anos de demarcação da terra que então é berço da produção. Por isso, este é um produto que logo conquistou o selo de Denominação de Origem (D.O.). Ou seja, vinho do Porto só no Porto.
Mas até chegar nessa demarcação, com processos de produção devidamente controlados, a origem da bebida ainda é confusa nos livros de história. A teoria mais popular entre os pesquisadores é que, no século 17, comerciantes ingleses tiveram acesso a um tipo de vinho oferecido a eles numa cidade ao leste do Porto. Gostaram tanto que levaram diversos barris para a Inglaterra atentos à comercialização. E foi nessa etapa de transporte que se acredita ter acontecido o acréscimo de uma aguardente vínica para ajudar na conservação do líquido, além de, claro, aumentar o poder alcoólico do produto final.
Porto branco ou tradicional tem apreciadores no mundo inteiro - Crédito: Ed Machado/Folha de Pernambuco
Fortificado e licoroso
A receita que preza pela fermentação incompleta resulta em duas características muito próprias. “Fortificado porque recebe uma dose de aguardente vínica extra e licorosa porque tem açúcar residual presente”, adianta o sommelier Helton Silva. A partir dessa estrutura básica, quatro versões são produzidas nas vinícolas lusitanas, sendo elas ruby, tawny, branco e rosé. Tirando os dois últimos, que integram o consumo recente, os demais são tidos como os mais clássicos do mercado.
“O ruby busca traduzir jovialidade, sendo vivo e parecido ao vinho tinto de mesa normal. Tem nota de frutas vermelhas e, às vezes, o seu álcool desprende um pouco mais na boca. Com esse tipo, temos uma crescente: o básico, o reserva, o vintage e o chamado Late Botted Vintage (LBV). Já a versão tawny materializa o porquê de o vinho do Porto ser um dos mais caros no comércio. “Para fazer um desse, com idade entre 10, 20, 30 e 40 anos, o produtor precisa mantê-lo na adega da vinícola. Sendo assim, todo ano, o produtor tira apenas um terço desse vinho e mantém o restante para fazer uma mescla de idades”, aponta Helton, ao falar do encarecimento nesse tipo de processo.
Além disso, a legislação brasileira diz que vinhos com até 14,5% de álcool são considerados tranquilos de mesa. Acima disso, o imposto é maior. Para ter uma ideia, a bebida típica do Porto pode chegar ao teor alcoólico de 21%. Segundo dados do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP), órgão certificador, ano passado o ranking de maior comercialização foi liderado pela França, enquanto o Brasil ocupou a 12ª posição mundial. No Recife, a sommelière e gerente Regional da Zahil Importadora, Rafaella Barros, diz que esse tipo de venda representa hoje menos de 3% do faturamento.
Outro desafio é o brasileiro ainda cometer alguns deslizes na hora de consumir. O primeiro deles, ainda de acordo com a sommelière, é não fazer a harmonização correta. “Não temos o hábito de acompanhar essa pedida com sobremesas e muito menos de consumi-la sozinha ou com outro tipo de comida. No entanto, fica maravilhosa com queijos curados e salgados, fazendo uma espécie de contraste de sabor”, orienta. Quando o assunto é temperatura, nada de servir gelado. A dica de Helton Silva é preservar em 12°C e deixar chegar na temperatura em taça.
Longe da mesmice
Embora o alto teor alcoólico desperte o paladar de um público mais velho, as versões apresentadas na coquetelaria sugerem o frescor que o apreciador jovem procura. Não à toa, o Porto Tonic tem sido um dos drinques mais democráticos na Europa ao substituir gin pelo vinho licoroso. “Ele é um coringa nas mãos de um bartender. Além disso, já estamos acostumados ao vermute, que também é uma bebida fortificada e cheia de regrinhas, presente no dry Martini”, comenta o mixologista João Morandi.
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Para ele, que acompanha a movimentação desse mercado há quase dez anos, o consumo tende a aumentar por aqui por conta do fluxo cada vez maior entre Recife e Lisboa. “Ele é o que chamamos na coquetelaria de highball, com a função de abrir sabor, assim como acontece com a Coca Cola ou mesmo a tônica”, afirma Morandi. Razão para ele sugerir produções bem-sucedidas, servidas com gelo, que suavizam o dulçor da bebida, a exemplo da releitura de um negroni e de um ponche batizado de Porto Spritz.
Receita
Porto Spritz
(Pelo mixoloxista João Morandi)
100ml de Porto branco
200ml de espumante dry
15ml de Aperol
15ml de licor de pêssego
Fatias de laranja
Fatias de kiwi
Morangos
1 ramo de alecrim
Bastante gelo
Preparo
Numa jarra média, misture delicadamente todos os ingredientes e sirva gelado
Na adega
Rótulo: Porto Messias Ruby
Características: jovem e aromático, com notas de frutas vermelhas
Venda: @portoaporto
Valor médio: R$ 69,90 a R$ 79
Rótulo: Porto Messias Tawny
Características: tem maior acidez e corpo presente
Venda: @emporiotiadulce
Valor médio: R$ 84,90
Rótulo: Porto Sandeman Tawny
Características: envelhecido em barrica, tem perfume de frutas secas
Venda: @zahilvinhos
Valor médio: R$ 150
Sabia que:
A forma correta de servir vinho do Porto é no cálice ou na taça pequena de vinho branco. Jamais na taça de licor. Esse detalhe é tão importante que o Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP) contratou o arquiteto português Álvaro Siza Vieira para criar um copo específico em 2002.