Adolescentes criam bioplástico da casca de manga

Estudantes de 15 e 16 anos de uma escola estadual de Camaragibe desenvolveram o produto e já estão recebendo propostas de compra da ideia

Luana Pereira, Laura Araújo, Luciano Carlos e Lídia de Souza trabalham no projeto do bioplástico há três anos - Julya Caminha/ Folha de Pernambuco

Quando a barreira do Bairro dos Estados, no Centro de Camaragibe, deslizou em junho deste ano, Laura Araujo, Lídia Souza e Luana Pereira, de 16 anos, e Luciano Carlos, 15, estavam na Escola Estadual Ministro Jarbas Passarinho, localizada a um quilômetro do local da tragédia, que vitimou sete pessoas. Alunos do segundo ano da instituição, há três anos eles trabalham na criação de um plástico biodegradável para ser utilizado também na impermeabilização das áreas de risco. O principal insumo utilizado no desenvolvimento é a casca da manga, fruta que é colhida em Pernambuco entre os meses de setembro e dezembro.

“A ideia é substituir o plástico sintético por um produto que traga benefícios para a comunidade e para o meio ambiente. Com o uso do bioplástico, pretendemos produzir uma tela impermeável, resistente, que impeça esses deslizamentos”, destaca a estudante Luana Pereira. De acordo com os jovens criadores, com apenas 100 g do rejeito da fruta é possível produzir até um metro quadrado do bioplástico ao custo médio de R$ 12. Na receita, são utilizados outros produtos da cozinha de casa, como o óleo, a gordura, além de químicos, corantes e aditivos para dar maior durabilidade ao produto. Há ainda um “elemento x”, que eles não divulgam até firmar a patente da criação.

O protótipo foi apresentado, em março deste ano, na Feira Brasileira de Engenharia e Ciências (Febrace), realizado pela Universidade de São Paulo (USP). Lá, eles receberam a oferta de um empresário indiano para vender a ideia e a proposta de apresentar o trabalho na Tunísia, no continente africano. “Estamos estudando a melhor forma de proteger a autoria da criação. Como o trabalho foi apresentado em diversos lugares, não há como alguém roubar, mas precisamos patentear. O viés sempre foi o social, de criar um produto que seja aplicado para a sociedade, mas a ideia é dos alunos e a decisão do que fazer também é deles”, conta a professora-orientadora do projeto, Alessandra Martins.

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Segundo Ricardo Neves, professor do Núcleo de Biologia da UFPE e co-orientador do projeto, a produção de bioplástico é extremamente viável, embora exija um investimento maior para refinar o material e aprimorar sua qualidade. “Existem empresas que desenvolvem o processo tecnológico e que entendem que o bioplástico não surge apenas para tirar o sintético do mercado, mas, sim, para apresentar uma alternativa. Ao ser inserido no mercado, esse produto pode ajudar o meio ambiente, já que ele é mais fácil de ser absorvido por ser composto de matéria-prima natural ”, explica Neves.

De acordo com estudo recente do World Wide Fund for Nature (WWF), mais de 104 milhões de toneladas de plástico poluirão nossos ecossistemas até 2030, se nenhuma mudança acontecer na nossa relação com o material. “O lixo que produzimos precisa ser degradável para que o planeta tenha um bom funcionamento. A durabilidade do plástico é tão grande e não estamos preocupados com o fato de que não há como se desfazer dele”, refletiu a estudante de Química da UFRPE, Rhayssa Farias, 20, que contribuiu com o estudo de materiais acessíveis e de baixo custo para aperfeiçoar o bioplástico de casca de manga em pequena escala.

Biodegradável
Dos três anos dedicados à consolidação da ideia, um deles foi aplicado inteiramente à pesquisa do que havia sido desenvolvido até então. Os primeiros registros de produções com bioplástico datam dos anos 1990, conta o professor Ricardo Neves. No Brasil, o registro é de 1995. Existem produtos desenvolvidos com batata, milho e óleos como o de rícino, extraído das sementes da mamona. Um dos fatores determinantes para o sucesso do produto com casca de manga é uma fibra presente no tecido da fruta. Testes químicos e biológicos foram realizados no produto, que aguarda investimento para a produção em maior escala e ser testado pelo Inmetro.

A expectativa do grupo é de que o produto esteja disponível para o uso antes do próximo período de chuvas. Se utilizado como alternativa para conter as barreiras, os desenvolvedores apostam que haverá ainda benefícios para o solo. “Com a degradação do material, fungos serão gerados que irão nutrir o solo, tornando-o mais forte”, aponta a estudante Laura Araújo. O bioplástico de casca de manga está sendo apresentado nesta sexta-feira (13) na Exposição de Tecnologia e Ciência em Camaragibe (Expotec), realizada no Shopping Camará, na Vila da Fábrica, em Camaragibe. Ao todo, 98 stands exibem projetos de ciências, tecnologia e linguagem.

O evento será encerrado no sábado (14), com a premiação das quatro melhores iniciativas de cada categoria, que terão a oportunidade de apresentar os projetos em outras feiras do País.