Adolescente fotografado em 'mar de óleo' no Cabo pretendia ajudar a mãe

Imagem de Everton Miguel, de 13 anos, com sacos de petróleo na praia de Itapuama, teve repercussão internacional. A mãe, Ivaneide Maria, advertiu o filho para "não se melar".

Jornal Guardian, da Inglaterra, destaca foto de Léo Malafaia, da Folha de Pernambuco - Reprodução/Guardian

Decidido a ajudar a mãe, dona de um bar na orla de Itapuama, no Cabo de Santo Agostinho, Everton Miguel dos Anjos, de 13 anos, ouviu dela a advertência para tomar cuidado com as placas de petróleo cru que invadiram a praia na última segunda-feira. No fim do dia, levou uma bronca. “Ela brigou comigo porque não era para me melar, mas eu fui mesmo assim”, conta.

Apesar disso, o adolescente fotografado em meio à confusão na limpeza das Pedras do Xaréu não sentiu até agora nenhum sintoma de intoxicação. “Ele respirou muito [o cheiro do óleo], mas, graças a Deus, não aconteceu nada com ele”, observa a mãe, Ivaneide Maria de Oliveira, 36.

Capturada pelo fotógrafo da Folha de Pernambuco, Léo Malafaia, a imagem, que mostra o menino vestido com plástico de lixo retirando do mar sacos com petróleo, teve repercussão internacional, sendo publicada em periódicos como The New York Times (EUA) e Clarín (Argentina), além da agência de notícias francesa France-Press (AFP) e do inglês The Gardian, que destacou a foto entre as melhores da última quarta-feira. Depois que a imagem foi captada, Everton subiu nas pedras e pegou óleo de cozinha para tirar o excesso de petróleo que grudara nos braços e nos pés descalços. “Tinha nada para fazer”, disse na hora.

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Enquanto o filho se misturava aos voluntários nas Pedras do Xaréu, Ivaneide ficou com o marido em outra área, mais perto da base de apoio do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência). “Naquele dia, a gente foi para abrir a barraca porque era feriadão do Dia do Comerciário. Quando a gente chegou lá, estava aquela correria. Eu fiquei perto do Samu, separando o óleo do sargaço e ele foi lá para baixo”, relata a comerciante, que há dois anos mantém o bar Dois Irmãos 2, em alusão ao estabelecimento da mãe dela, o Dois Irmãos 1.

Criança tenta se livrar do óleo preso ao corpo após ajudar na limpeza na praia de Itapuama, Cabo de Santo Agostinho, Região Metropolitana do Recife - Crédito: Leo Malafaia/Folha de Pernambuco

Ao descer, incomodado com a areia no corpo, Everton tirou a camisa e a amarrou na cintura. “A bióloga que estava lá falou que precisava vestir alguma coisa e peguei o saco no carro da prefeitura [para me cobrir]”, diz ele, sem saber dizer o nome da profissional que o orientou. O adolescente, que estava com o irmão, Emerson, de 18 anos, e alguns primos, também recebeu luvas e botas, que não deram conta da quantidade de óleo. “A luva é curta. Começou a entrar petróleo na bota, aí ele resolveu ficar livre, sem nada”, diz Ivaneide. A família, que chegou às 6h, só saiu da praia por volta das 20h.

Aluno do 7º ano do Ensino Fundamental de uma escola pública, Everton mora com a mãe, o padrasto, dois dos quatro irmãos, a cunhada e o sobrinho de dois anos no Alto dos Índios, no bairro de Ponte dos Carvalhos, no Cabo de Santo Agostinho. Em frente à casa, localizada num plano entre dois morros a cerca de dez quilômetros do bar que sustenta a família, o esgoto da vizinhança escoa em uma canaleta construída por um pedreiro que Ivaneide contratou. O único acesso à moradia se dá por uma escadaria de pedra que, muitas vezes, é remendada pelos próprios moradores.

Diante de uma realidade como essa, manchas de petróleo nas pernas não parecem tão graves para um adolescente no meio de um desastre humano e ambiental. “Ele quis me ajudar. Achei tão engraçado quando eu disse: ‘Não se mela tanto não’, aí ele: ‘Mãe, a gente depende disso aqui. A senhora não trabalha aqui?’”, conta Ivaneide, orgulhosa.