Arvo surfa em brasilidade pura

Restaurante, no Torreão, reforça o nicho de gastronomia descomplicada na Zona Norte

Croquetas de cupim em porção para compartilhar - Ed Machado

Os últimos quatro anos têm sido uma verdadeira prova de fogo para o mercado de restauração. Manter as portas abertas foi, e ainda está sendo, um desafio que não passa no buraco da agulha: é um arroxo atrás do outro.

Correndo em paralelo à crise econômica que arrebata o País inteiro, uma fórmula nova de se fazer restaurante vem ganhando força, principalmente na região da Zona Norte do Recife. E tem dado certo.

Com gastronomias fincadas no repertório de ingredientes brasileiros, alguns restaurantes de maior sucesso atualmente têm em comum outros pontos: serviço descomplicado, ocupam casas antigas fora dos circuitos tradicionais e, acima de tudo, cobram preços medianos para o que entregam - comida com assinatura de chef.

É nessa onda que surfa o estreante Arvo, inaugurado há apenas um mês, dos sócios Eduardo Freyre e Pedro Godoy, no bairro do Torreão, já com fila na porta nos fins de semana, com muito recifense ávido por novidade.

O casarão é hiperbólico no tamanho - o terreno é imenso, com jardim amplo e um salão preenchidos para acomodar 110 pessoas, sob pés de sapoti, de fruta pão e de canela, que sombreiam o espaço. Uma horta lateral fornece à cozinha as ervas que finalizam os pratos de Pedro, 28, o chef à frente do cardápio cheio de brasilidades e apuro técnico aplicado no preparo de ingredientes comuns em nosso dia a dia pernambucano.

Super enxuto, o menu de Godoy prioriza insumos regionais, de fácil acesso, em alta de safra. “Isso dá flexibilidade para mudanças. Alguns ingredientes serão trocados, de acordo com as estações e suas disponibilidades. É o caso da moqueca que leva maracujá”, explica o autor da carta. Falando sobre a moqueca de camarão e peixe, uma das opções para compartilhar, além da inclusão da fruta, não leva óleo de dendê e o pescado é frito antes de mergulhar na receita caudalosa. Custa R$ 85.

Há outros itens, entretanto, que nasceram com cara de campeões de venda - e não sofrerão mudanças. É o caso do pernil de carneiro, que leva 36 horas de preparo, divididas entre 24 horas descansando numa marinada de alho e semente de cominho para, então, ser assado lentamente em temperatura baixa (94ºC) por mais 12 horas, conservando umidade e preservando as notas dos condimentos.

Salivou? Eu te entendo. Não seria diferente, ainda mais sendo escoltado por maionese de batata-doce e arroz de cebola frita (R$ 78) para dois. A receita é uma das mais pedidas e nem tão cedo será retocada.

O tempo, aliás, é o ingrediente chave para os preparos do Arvo serem bem-sucedidos - e mais um argumento para o minitamanho do menu. “Para trabalhar bem cada prato leva tempo e dedicação”, confirma Pedro. Ele mesmo cita outro prato principal que despende parcimônia com o processo, o peixe ao molho de coentro.

A receita é caudalosa, vem embebida num molho velouté (caldo claro de base francesa) preparado com cabeça de peixe, coentro e leite de coco extraído no próprio restaurante. Sai a R$ 40 e R$ 77, para uma pessoa e duas, respectivamente.

O abre-alas perfeito de um almoço no Arvo (com previsão para funcionar à noite) são as croquetas de cupim desfiado, cuja fritura não deixa resíduo nas mãos, e presenteia o paladar com recheio quase cremoso. Delicioso. A R$ 22 a porção. O caldinho de couve-flor, outro ingrediente pouco explorado em restaurantes, mas presente em algumas criações de Pedro, é sugestão para vegetarianos ou para quem preferir começar mais leve a refeição (R$ 10).

O trio joelho de porco, cupim braseado e arrumadinho de charque integram o time da comida de ‘sustança’ que pernambucano não vive sem. A agulhinha empanada e frita está no meu top 3.

Os peixinhos são servidos sem espinhas e envoltos com farinha de tapioca de Belém (aquelas bolinhas brancas), fritos a 170ºC, são acompanhados por chips de banana da terra e um aïoli aromático. Custa R$ 26 e pede um drinque para abrir caminhos, como se diz.

Outro ponto alto do restaurante estreante é a coquetelaria, que já nasceu no menu fixo com assinatura de um profissional que surgiu no universo do café, Dilton Sales. São 11 coquetéis autorais e eu arriscaria indicar o tacagin, servido em cabaça de tacacá, preparado com gin, xarope de tamarindo, água tônica, folha e pau de canela (R$ 22).

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O CHEF

Pedro Godoy ingressou no ramo ainda aos 17 anos, quando entrou no curso do Senac Pernambuco, e de lá para cá, não parou mais. Aqui, estagiou em casas como Beijupirá, Oficina do Sabor, Tapa de Cuadril e Thaal Cuisine (extinto), mas nos últimos anos morava na Austrália, onde afinou seu arsenal de técnicas. “Nosso terroir é bom, tentei não usar coisas de fora, mas trazer técnica para executar com nossos ingredientes”, concluiu.

SERVIÇO
Arvo Restaurante
Endereço: rua Djalma Farias, 170, Torreão
Funcionamento: das 11h45 às 15h
Informações pelo Instagram: @arvorestaurante