Anúncios de falsos produtos anticoronavírus se espalham e viram caso de polícia

Propagandas enganosas de produtos que supostamente protegem contra o novo coronavírus covid-19 têm circulado nas redes sociais e preocupado entidades médicas

Coronavírus - MLADEN ANTONOV / AFP

Propagandas enganosas de produtos que supostamente protegem contra o novo coronavírus covid-19, como multivitamínicos orais e injetáveis, azul de metileno e ozonioterapia, têm circulado nas redes sociais e preocupado entidades médicas. Uma delas virou até caso de polícia.

Na quinta passada (5), a dona de uma farmácia na região metropolitana de Curitiba (PR) foi autuada por policiais civis sob suspeita de promover a venda de polivitamínicos sob a promessa de prevenir contra o coronavírus.

No anúncio, a caixa com 90 cápsulas do suplemento era oferecida numa promoção, de R$ 90 por R$ 79,99. O estabelecimento dizia que o produto era um tratamento completo, de três meses, contra o coronavírus.

Em grupos de WhatsApp também circula um vídeo de um suposto médico recomendando "imunomodulação com altas doses injetáveis de vitaminas D e C e aminoácidos" como forma de proteção. "É só você ligar aqui na clínica e agendar o seu imunoshot", diz ele.

Na mensagem, o homem afirma que a SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia) preconiza o reforço de imunidade como a única estratégia preventiva à infecção de coronavírus.

A entidade divulgou nota de repúdio negando a recomendação. No comunicado, a SBI também diz que não há evidência científica de que o tal "imunoshot" previna contra a infecção.

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"Ainda não temos nenhum tratamento ou vacina que comprovadamente previna contra o coronavírus. Estão aproveitando dessa situação, da boa-fé das pessoas, para lucrarem em cima", diz o infectologista Leonardo Weissmann, consultor da SBI.
Segundo ele, a sociedade também recebeu diversos questionamentos sobre a eficácia da ozonioterapia contra o coronavírus, após publicação de propaganda por uma clínica de estética. De novo, não há nenhuma evidência sobre a eficácia e segurança do tratamento para prevenir a infecção.

Para o infectologista Esper Kallás, professor da USP, o mais grave é que muito desse charlatanismo tem sido praticado por médicos, o que, para os desavisados, pode parecer mais crível do que as outras fake news sobre coronavírus que circulam nas redes sociais.

"É gente que tem CRM [registro no conselho médico]. O paciente chega no consultório, vê diplomas pendurados na parede da sala de espera e cai no canto da sereia. Não tem como discernir que está sendo enganado."

Segundo ele, as pessoas precisam desconfiar sempre dessas recomendações médicas sedutoras, que prometem coisas sem embasamento científico.
"Geralmente o cara vai ganhar uma grana com o procedimento que, invariavelmente, não é encontrado nas farmácias ou em hospitais. Só tem no consultório dele."

Para Kallás, essas situações precisam ser denunciadas aos conselhos de medicina para que sejam tomadas as providências cabíveis. Nesta semana, circulou um outro vídeo com um médico dizendo que a injeção de azul de metileno, uma solução antisséptica, poderia ajudar na prevenção do vírus.

"É um absurdo. Nada é isento de risco. Na hora que você injeta ou engole alguma coisa, sempre vai ter um risco associado", diz ele. Essas enganações se juntam a outras ainda mais bizarras que circulam nas redes sociais do mundo todo.
Até o uso de urina de vaca e de cocaína já foi sugerido como prevenção ao coronavírus. O assunto foi um dos temas de reunião da OMS (Organização Mundial da Saúde) em Genebra, que terminou na última quarta (12).

Por meio da sua conta no Twitter, a OMS tem feito vários desmentidos de tratamentos milagrosos, muitos alegando terem aval da organização e dos ministérios nacionais de saúde. Entre eles estão recomendações para o consumo de alho, óleo de gergelim e vitamina C.

Nas últimas três semanas, uma aliança que reúne mais de 90 verificadores de fatos de 39 países sob a coordenação da International Fact-Checking Network, publicou mais de 400 verificações, a maioria sobre maneiras falsas de prevenir e/ou curar o coronavírus.

Em 28 de janeiro, por exemplo, o PolitiFact publicou um alerta de que água sanitária não cura o coronavírus e que pode provocar efeitos colaterais graves, como vômitos, diarreia e desidratação grave. Catorze dias depois, a loucura ainda corria solta nas redes sociais nos Estados Unidos, inclusive no YouTube, propagada por influenciadores.

A vitamina C tampouco é capaz de impedir a infecção pelo novo coronavírus. Em 25 de janeiro, o BoomLive, um dos verificadores de fatos na Índia, alertou que essa informação falsa estava sendo compartilhada no Facebook. Quatro dias depois, a mesma mentira chegou ao Brasil, tornou-se popular em grupos de WhatsApp e foi desmentida pelo Aos Fatos.

Na Itália e em Taiwan, notícias sobre produtos com "enzimas naturais" para lavar as mãos viralizaram, mesmo sem evidências científicas de que eles sirvam para proteger contra o vírus.

Na lista de verificações de fatos, há ainda fake news sobre cura, como as que dizem que o Quênia e a Romênia já desenvolveram vacinas.

Há alguns grupos internacionais iniciando os preparativos para os testes clínicos de substâncias candidatas a vacina e de medicamentos para alívio dos sintomas causados pela infecção, mas não existe nenhum produto já pronto ou aprovado por órgãos reguladores.