Jogo Online 'Habbo Hotel' vive novo boom de popularidade durante a pandemia

A facilidade de acesso, um visual icônico e seu apelo nostálgico fazem dele a escolha perfeita para os jovens em quarentena

Jogo 'Habbo Hotel' - Reprodução/Divulgação

Com as medidas de isolamento social para prevenção do novo coronavírus e as transformações decorrentes em nosso estilo de vida, uma série de ferramentas tecnológicas ganharam proeminência: aplicativos de videoconferência, plataformas de ensino à distância e um jogo clássico de décadas passadas, o "Habbo Hotel".

Em um momento que seus análogos da vida real estão fechados ou sendo adaptados para receber pacientes, o "Habbo Hotel", híbrido de MMO (jogo multiplayer online em massa) com sala de bate-papo vive um novo boom de popularidade. A facilidade de acesso, um visual icônico e seu apelo nostálgico -o jogo completa 20 anos em 2020- fazem dele a escolha perfeita para os jovens que seguem as medidas de isolamento social defendidas pela OMS contra a Covid-19 e ficam em casa.

Segundo a empresa responsável pelo jogo, Sulake, houve um aumento global de 213% no número de usuários diários entre o final de fevereiro e o de março. O tempo total gasto no jogo mais que dobrou no mesmo período, subindo 134%.
"É bom ver tantas pessoas se conectando e socializando enquanto ainda seguem as regras dos governos. Há evidência que sugere que as pessoas estão usando o Habbo para manter atividades reais enquanto seguem recomendações de distanciamento social", diz a empresa.

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Em meio aos efeitos pixelados de chamas, nuvens e auréolas, o look dos personagens do jogo também foi alterado pela crise. Como nas ruas das grandes cidades globais, as máscaras cirúrgicas se tornaram "item obrigatório" e são vistas aos montes. A diferença é que aqui elas são distribuídas gratuitamente a qualquer jogador, fugindo da escassez observada no mundo real.

"O assunto nos quartos e corredores do 'Hotel'é sempre o mesmo: coronavírus", diz Cadisentro, um dos jogadores escolhidos para ocupar o posto de embaixador da comunidade.

Para ele, o aumento de usuários é perceptível, tanto nas redes sociais quanto no jogo. "Basta dar uma andada pelos espaços públicos do 'Habbo' para ver que os números de jogadores por quartos sempre estão a 50, dependendo da hora lotando a capacidade máxima de usuários por quarto. Quartos comuns de usuários também estão sempre lotados."

Tanto Cadisentro quanto a Sulake reforçaram que o jogo está se movendo para reforçar ações de prevenção: recompensas especiais para quem continua em casa logando diariamente no jogo, competições globais de criações de quartos e eventos comunitários. No Brasil, um desses encontros contou com a presença de uma médica, que respondia às perguntas da comunidade sobre a doença.

O chat pixelado em tempos de pandemia Acessar o Habbo na quarentena é um retrato das coisas que o mundo perdeu em poucas semanas. Os aviões ainda voam, as praias estão cheias e até o congresso nacional manteve suas atividades presenciais, com personagens de ternos divididos em bancadas enquanto organizam votações, em um estranho exemplo das possibilidades de roleplay do jogo.

Os hospitais também são um dos espaços mais frequentados pelos jogadores. No "Habbo", é comum os jogadores trabalharem em empregos virtuais em troca da moeda do jogo. Nesses trabalhos, existem hierarquias, regras, funções e turnos, como na vida real. Assim, uma equipe grandiosa se dedica a atender avatares de máscara se queixando de tosse, com as vantagens que o número de pacientes nunca passa de 75 e, principalmente, que aqui ninguém morre.

O embaixador define o que atrai os jogadores nesse momento difícil: "O 'Habbo' nessa época de coronavírus e isolamento serve como passatempo para pessoas que querem jogar algo legal, conversar e conhecer novas pessoas. O jogo possui infinitas possibilidades para fazer qualquer coisa".

E essa jogatina coordenada pode ajudar na sobrevivência da quarentena, período de impacto no estado psicológico e emocional de todos? Para a psicóloga Marilene Kehdi, sim. Assim como manter uma rotina organizada, cozinhar ou meditar, os games, como o "Habbo", também "ajudam a enfrentar o confinamento necessário".

"Os jogos online dão uma sensação de proximidade, mantém as pessoas envolvidas e perto umas das outras mesmo que distantes fisicamente, e isso desperta boas emoções", diz a profissional. Mas faz uma ressalva. "É preciso ter controle sobre o tempo que se joga".

'A quarentena me fez voltar' Em um momento em que reunir os amigos em casa ou sair para uma festa é impensável, o jogo assumiu essa função social, com seus chats coloridos, romances instantâneos e bobba bobbas. Entre os horários observados, de longe o mais agitado é no fim de semana a noite, onde todas as salas estão cheias de avatares flertando. Na semana passada a Folha mostrou como festas universitárias tradicionais estavam sendo transferidas para dentro do jogo, mas não são só elas.

A estudante de moda Letícia Kling diz que jogava o jogo quando era mais nova -"entrava algumas vezes com uns 13 anos", conta- mas foi justamente a quarentena que a fez voltar para o jogo, com a intenção de frequentar as festas no espaço. "Um amigo fez aniversário esses dias e como não dá para sair de casa, a festa foi no Habbo. Fizeram uma playlist pra ouvirem enquanto a gente tava lá."

Além de aniversários, Letícia menciona as festas eletrônicas da vida real temporariamente transferidas para dentro do jogo. "Vi as pessoas montarem no Habbo a estrutura de baladas e se reunirem lá, mandando convites para quem geralmente frequenta na vida real."

Um exemplo dessa mudança é Eric Alves, o produtor de música eletrônica vó1d. Impossibilitado de tocar em espaços físicos, ele organizou uma apresentação dentro do jogo, munido de ferramentas tradicionais dos gamers, como o Discord e a Twitch.

A ideia surgiu de uma conversa com sua amiga Giovanna, a Suzy Salaminho, performer em festas paulistanas, em que ela propôs uma apresentação feita no jogo. Os dois jogavam Habbo juntos, então tinham experiência na criação de quartos e eventos. Eric também já tinha participado de um evento semelhante em outro clássico dos games da primeira década do milênio: o Second Life.

O evento reuniu 74 pessoas em um quarto do jogo, e o produtor conta que a sensação foi bem semelhante à tocar na vida real. "Por mais que aquilo fosse um ambiente virtual, tinham pessoas reais ali. Enquanto eu tocava as músicas eu via a reação das pessoas", diz vó1d. "Quando a livestream na Twitch travava era a mesma sensação de parar o som em meio a um evento de grande proporções, imagine 74 pessoas digitando sem parar coisas do tipo 'cortou minha vibe', 'vou sair dessa festa' e 'volta com o som logo dj'."

O experimento deu tão certo que para essa semana o DJ organiza um evento ainda maior dentro do "Habbo", chamado Digital Bunker, com a participação de uma série de nomes relevantes da cena experimental do Soundcloud, inclusive internacionais.

Eric vai ainda além e já vislumbra oportunidades futuras: "Novas tendências podem surgir nesse momento difícil, quem sabe não desenvolvam um jogo específico para fazer esse tipo de festa online? Já pensou se os óculos de realidade virtual já fossem algo normal? Eu imagino as pessoas dançando, todos em suas casas, porém conectados a um mundo virtual".

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