Chefe da OMC, Roberto Azevêdo, deixará o cargo no final de agosto
O brasileiro alegou questões familiares
A renúncia do diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), o brasileiro Roberto Azevêdo, caiu como uma bomba nesta quinta-feira (14), em meio a uma pandemia de coronavírus que desencadeou uma crise global. Azevêdo anunciou que deixará suas funções em 30 de agosto, um ano antes de terminar seu segundo mandato, e garantiu que não tem aspirações políticas.
"É uma decisão pessoal, uma decisão familiar, e estou convencido de que essa decisão serve aos interesses desta organização da melhor maneira possível", afirmou ele em uma videoconferência com membros da OMC.
A partida prematura do brasileiro ocorre no pior momento da economia mundial desde a Grande Depressão, na década de 1930. O comércio internacional é seriamente afetado pela pandemia de coronavírus, que causou o colapso da produção e acabou confinando mais de dois terços da humanidade.
A OMC atravessa uma profunda crise há meses, desde que os Estados Unidos se opuseram em 11 de dezembro à renovação do órgão de apelação em disputas comerciais. Os países membros recorrem a um órgão de resolução de disputas quando têm um litígio comercial entre si. Os processos de resolução são muito longos, geralmente duram anos, e o órgão de apelação é o que geralmente acaba resolvendo.
A renúncia de Azevêdo "acontece em um momento ruim para a instituição", estimou Sébastien Jean, diretor do Centro de Estudos Prospectivos e Informações Internacionais.
"O sistema comercial está profundamente desestabilizado por tensões anteriores, em particular as duras críticas feitas pelo presidente dos Estados Unidos, as múltiplas violações de acordos, a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China e a paralisia do órgão de apelação. Sem esquecer as medidas adotadas em resposta à crise sanitária, em particular as diversas e variadas restrições às exportações", explicou à AFP.
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Um bom negociador
Diplomata de carreira, Roberto Azevêdo, que assumiu a liderança da OMC em 2013, sucedendo ao francês Pascal Lamy, iniciou seu segundo mandato de quatro anos em setembro de 2017 e terminaria em agosto de 2021. Antes de se tornar diretor-geral da OMC, era o representante permanente do Brasil nessa organização desde 2008, onde construiu uma reputação de bom negociador.
Lá, venceu importantes litígios para o Brasil, como o caso de subsídios ao algodão contra os Estados Unidos e o caso de subsídios à exportação de açúcar contra a União Europeia. Em sua primeira candidatura, ele enfatizou que sua eleição destravaria negociações comerciais que estavam paralisadas há anos.
Em 2014, após seis meses de bloqueio, os Estados-membros da OMC deram luz verde ao lançamento de um Acordo Alfandegário Histórico (TFA), destinado a impulsionar o comércio mundial, simplificando os procedimentos aduaneiros. Desde então, porém, os países têm lutado para concluir novos acordos e nem sequer chegaram a um para proibir os subsídios à pesca.
A conclusão de um acordo sobre essa questão fracassou na 11ª reunião ministerial da OMC, realizada em Buenos Aires, no final de 2017. A 12ª reunião ministerial, programada para os dias 8 e 11 de junho em Nur Sultan, Cazaquistão, e sobre a qual a OMC tinha grandes expectativas, teve que ser adiada indefinidamente devido à pandemia de COVID-19. Apesar de suas tentativas, Azevêdo também não conseguiu impedir as guerras comerciais desde a chegada de Donald Trump à Casa Branca.
Os Estados Unidos exortam a OMC a rever o estatuto da China, que, segundo Washington, abusa de seu status de país em desenvolvimento para obter vantagens econômicas. Resta saber quem poderá retomar a liderança da OMC. Em Genebra, os olhos estão voltados para a África, de acordo com várias fontes diplomáticas.
"Existe um consenso (...) de que a sucessão não deve ir para uma grande potência econômica e não pode ser chinesa ou americana", dada a guerra comercial entre as duas potências, declarou uma fonte diplomática à AFP.