Mulheres negras do rap apontam falta de valorização, investimento e preconceito
Enquanto as afro-americanas estão ocupando, aos poucos, os espaços de poder no gênero, as rappers brasileiras ainda enfrentam desafios maiores na indústria
Beyoncé, Nicki Minaj, Doja Cat e Megan The Stallion fizeram história no rap feminino nas últimas semanas. Os remixes das músicas “Say So” e “Savage” as colocaram no topo da Billboard HOT 100, principal parada musical dos Estados Unidos, sendo as primeiras quatro mulheres negras a ocupar, simultaneamente, as duas primeiras colocações, e a única colaboração feminina de rap a conquistar tal feito em quase 50 anos de cultura hip hop. O fato interrompe uma série de barreiras da indústria musical americana que, nos últimos anos, vem boicotando negros em premiações e desprivilegiando o trabalho feminino na música.
Enquanto as afro-americanas estão ocupando, aos poucos, os espaços de poder no gênero, as rappers brasileiras ainda enfrentam desafios maiores na indústria. Machismo do público e da produção, falta de investimentos do setor e descredibilização do trabalho de mulheres são alguns dos percalços encontrados por elas. “A forma como se consome música lá é diferente (EUA), a forma como o entretenimento é valorizado é uma outra coisa. E mulheres pretas incríveis, que eu admiro muito o trabalho, chegar ao topo das paradas em 2020 e ainda ser uma surpresa, quando deveriam ter conquistado há mais tempo”, questiona a rapper paulista Drik Barbosa.
Ororo acredita que o crescimento das rappers negras no mercado de fora pode ajudar nas artistas locais. “Eu me inspiro muito no trabalho delas. Doja é uma das minhas referências, inclusive, e acredito que o crescimento dessas mulheres pode ajudar a gente aqui, já que há uma influência grande até na música local, como o brega”, explica a artista, que vai lançar a música “Toque do Celular” no próximo dia 13 de junho.
Pernambuco
Outro desafio é a xenofobia, como traz a pernambucana, de Triunfo (Sertão do Estado), Jéssica Caitano. “Nós aqui do Estado, além de todas as invisibilidades que sofremos, ainda somos nordestinas, né? Carregamos aí a xenofobia além das demais mazelas; existe um espaço e uma atenção que é negada para nós mulheres, e isso é historicamente e cultural. Sabemos que há em todos os espaços, e no rap é só mais um”, conta a rapper, e também integrante do projeto Radiola Serra Alta, que conquistou o público pernambucano em festivais, como o Rec Beat.
Apesar das dificuldades, Jéssica conta que o Radiola vinha de uma rotina de shows no período que antecedeu a pandemia. “A relação com o público é linda, a galera que já cata o som e o corre cola mesmo. Canta junto, tem uma interação, galera do Nordeste que mora em outros estados pelo Brasil chega também. Há vários tipos de público no rap, assim como tem vários tipos de público em todos os outros estilos e segmentos musicais”, diz a artista, que mistura coco, embolada e eletrônico.