Fachin vota a favor do inquérito das fake news e fala em omissão da PGR e da PF para apurar ataques
O magistrado foi o único a votar nesta quarta. A análise do caso será retomada na próxima semana, a partir da sessão de 17 de junho
O ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), votou nesta quarta-feira (10) pelo prosseguimento do inquérito das fake news, que apura a disseminação de notícias falsas e ameaças a integrantes da corte.
O magistrado foi o único a votar nesta quarta. A análise do caso será retomada na próxima semana, a partir da sessão de 17 de junho.
Fachin propôs que o objeto do inquérito seja limitado a ações que ofereçam "risco efetivo" à independência do Poder Judiciário. Como exemplo de atos desta natureza, citou ameaças a ministros e a incitação ao fechamento do Supremo.
Sem mencionar o ministro da Educação, Abraham Weintraub, Fachin ressaltou que pedir a prisão de integrantes do STF também se enquadra nas hipóteses do inquérito.
O chefe da pasta da Educação do governo Jair Bolsonaro afirmou, em reunião ocorrida no dia 22 de abril, que, por ele, botaria "esses vagabundos todos na cadeia, começando pelo STF".
Fachin é o relator da ação que questiona a legalidade do ato do presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, de abrir a investigação de ofício, ou seja, sem provocação da PGR (Procuradoria-Geral da República).
Também é contestada a indicação do ministro Alexandre de Moraes como relator sem realização de sorteio entre todos os ministros, como ocorre geralmente.
Fachin defendeu a exclusão de "matérias jornalísticas" das investigações. Foi neste inquérito, por exemplo, que Moraes mandou tirar do ar uma reportagem da revista Crusoé que envolvia Toffoli.
Também foi neste inquérito que Moraes determinou operação policial, em 27 de maio, contra deputados, empresários e blogueiros bolsonaristas.
Fachin também sustentou que as apurações não podem se voltar contra manifestações pessoais que não integrem um sistema de financiamento e divulgação em massa de fake news.
O relator admitiu que o assunto é "controverso", mas salientou que o regimento interno do STF, que tem força de lei, permite a apuração de supostos crimes contra a corte quando há omissão da PGR ou da Polícia Federal.
Ao final do voto, Toffoli fez questão de elogiar o colega. "Vossa excelência nos brindou com um aprofundado voto, um dos mais brilhantes já proferidos nesta Suprema corte", disse. Moraes fez o mesmo e enalteceu a posição do relator da ação da Rede.
Fachin defendeu, ainda, que o Congresso e o Supremo têm o desafio de determinar os limites entre entre liberdade de expressão e notícias fraudulentas, as chamadas fake news.
Para ele, o exercício da liberdade de expressão deve obedecer três limites: proteção a direitos ou à reputação de terceiros; proteção da segurança nacional e da ordem pública; e proibição de propaganda a favor da guerra e de apologia ao ódio.
Além disso, Fachin deu a entender que a omissão da PGR e da Polícia Federal em investigar ataques à corte justificaram a abertura do inquérito.
"O artigo 43 do regimento interno é, sem dúvida alguma, regra excepcional, que confere ao Judiciário, diante da omissão dos órgãos de controle, função atípica na seara da investigação, de modo que a fim de preservar preceitos fundamentais", disse, antes de votar pelo prosseguimento do inquérito.
O ministro também fez um discurso enfático na defesa da democracia e contra os movimentos que pedem o fechamento do STF e do Congresso.
"Não há liberdade de expressão que ampare a defesa desses atos. Quem os pratica precisa saber que enfrentará a Justiça constitucional do seu país. Precisa saber que este Supremo não os tolerará, não há direito e não há princípios que possam ser invocados para que se autorize transigir com a prevalência dos direitos fundamentais", comentou.
Fachin observou que a Constituição dá ao STF a palavra final sobre a interpretação correta da Constituição, e não às Forças Armadas, como sustentaram alguns bolsonaristas após os movimentos contra o Supremo protagonizados por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro ganharem força.
"Não há no texto constitucional qualquer norma que autorize outro poder ou instituição a última palavra sobre e a Constituição Federal, que cabe ao Judiciário. A espada sem a justiça é o arbítrio", frisou.
Além do voto de Fachin, o procurador-geral da República, Augusto Aras, e o advogado-geral da União, José Levi, fizeram sustentações orais a favor do inquérito.
Aras ressaltou que as fake news são espalhadas por "todos os segmentos da comunicação moderna" e disse que não tem mais a mesma confiança nos jornais tradicionais.
"Reconhecemos todas as dificuldades, sabemos que este fenômeno maligno das fake news não se resume a blogueiros nas redes sociais, ele é estimulado por todos os segmentos da comunicação moderna sem teias, sem aquele respeito que a nossa geração –eu digo a minha geração– aprendeu a ler o jornal acreditando que aquilo era verdade", frisou.
Segundo Aras, hoje em dia é necessário "ter mais cuidado na leitura das notícias para fazermos um filtro para encontrar o mínimo de plausibilidade em relação a essa campanha de fake news, que não guarda limites de nenhuma natureza".
Aras defendeu a continuidade do inquérito, mas com novas balizas. Ele solicitou "constante participação da procuradoria". E pediu que, a partir de agora, passe a ter o poder de avalizar ou não medidas como buscas e apreensões e quebras de sigilos passem pelo crivo da procuradoria.
Aras também solicitou que a apuração tenha objeto delimitado com mais precisão.
Para o PGR, é necessário dar interpretação conforme à Constituição ao artigo 43 do regimento interno do STF, que foi usado por Toffoli para assinar a portaria que instaurou o inquérito.
O dispositivo prevê que, caso ocorra "infração à lei penal na sede ou dependência do tribunal", o presidente pode instaurar inquérito e designar um relator para o caso.
Aras afirmou que é necessário interpretar o artigo de acordo com a Constituição e, consequentemente, impor os parâmetros propostos, como participação da PGR e poder da procuradoria para avalizar medidas cautelares que exigem autorização judicial.
O procurador-geral também assegurou que tem atuado na defesa das instituições e citou como exemplo o pedido de abertura de inquérito apresentado em 20 de abril após manifestações em frente ao quartel general do Exército pedirem fechamento do Congresso e do STF.
Apesar de o presidente Jair Bolsonaro ter feito duras críticas ao inquérito após seus apoiadores serem alvo de operação policial, a Advocacia-Geral da União (AGU) defendeu a continuidade do inquérito e propôs balizas para ter continuidade.
O advogado-geral, José Levi, afirmou ser indevido criminalizar a liberdade de expressão ou a liberdade de imprensa, "inclusive e em especial na Internet".
Na dúvida entre a liberdade de expressão e uma possível fake news, disse, é necessário assegurar a liberdade de expressão.
Levi lembrou, ainda, que não há um tipo penal geral para fake news, mas, sim, os tradicionais crimes contra a honra.
Ele destacou que a Polícia Federal deve "exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária" e que nenhuma polícia estadual pode participar das investigações.