Canal do Fragoso, em Olinda, transborda e causa inundações em casas e ruas
Equipamento está em obras desde 2013 e, após atrasos constantes, teve prazo de entrega esticado para 2022
"Choro dia e noite em período de chuva". O desabafo é da dona de casa Maria Francisca Coelho, 47 anos, moradora da Avenida Coronel Frederico Lundgren, em Rio Doce, Olinda. Após uma madrugada conturbada, ontem pela manhã ela observava de uma ponte a sua casa tomada pela água, sem saber quando poderá voltar para o lar. Apesar de ter conseguido pendurar alguns objetos, não deu para salvar móveis como geladeira e cama. Maria Francisca é apenas uma das milhares de pessoas de bairros como Jardim Fragoso, Jardim Atlântico e Fragoso, que enfrentam o medo das inundações. Um dos motivos é o transbordamento em diversos trechos do Canal do Fragoso, em obra desde 2013 e longe de ser concluído.
As intervenções de alargamento do equipamento fazem parte do pacote de obras Via Metropolitana Norte, estava previsto para ser entregue em 2016. Contudo, após constantes atrasos, o prazo de conclusão foi esticado para 2022, quase uma década depois do seu início. Quando anunciada, a obra foi prometida como solução para transformar a mobilidade em Olinda com direito a criação de vias para carro, sendo uma apenas para circulação de ônibus, e ciclovia. No entanto, o que se vê hoje são moradores convivendo com cheias e perdendo bens materiais. Há quem diga, inclusive, que o aumento e intensidade dos alagamentos estão relacionados com a obra inacabada.
O comerciante José Pedro de Oliveira, 66, mais conhecido como Zito, há cerca de 20 anos tem uma barraca onde vende alguns alimentos na Rua Fernando César de Andrade, em Jardim Atlântico. Ele conta que já perdeu várias mercadorias nas enchentes. "Sempre foi assim. Todo inverno é a mesma coisa. Como as obras do Canal do Fragoso não terminam nunca parece que as coisas só pioram", lamenta. Na mesma via, a aposentada Eurides Rocha, 75, conta que o edifício onde mora já foi invadido diversas vezes pela água que transborda do canal. "Já pensei em sair daqui, mas fica até difícil vender ou alugar um imóvel nessa região", comenta.
Em nota, a Prefeitura de Olinda afirmou que as obras são de responsabilidade do Governo do Estado, através da Companhia Estadual de Habitação (Cehab). Ainda de acordo com o órgão, nos últimos meses vem sendo executado, dentro da Operação Inverno 2020, um trabalho conjunto de limpeza, dragagem, corte de vegetação, supressão de áreas de risco, entre outras ações, sempre voltadas a sanar pontos de alagamento, com o propósito de minimizar os transtornos e garantir a integridade da população. Nas últimas 24 horas, foi registrada em Olinda uma média de 105 mm de chuva. O levantamento acumulado, entre os dias 1 e 12 deste mês, assinala 70 mm.
A Cehab informa que o trecho finalizado da obra foi entregue a Prefeitura de Olinda. Além disso, a Companhia Estadual de Habitação e Obras destaca que em muitos trechos concluídos é observado que o canal não transborda e as ruas laterais ficam com água retida. A companhia informa que cabe ao município a manutenção do Canal do Fragoso e seus afluentes, assim como a drenagem das ruas no entorno.
Desde 2016, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) vem acompanhando a obra do Canal do Fragoso por meio de uma Auditoria Especial, sob a relatoria da conselheira Teresa Duere. O órgão já encontrou até falhas na execução, no projeto e no planejamento da obra, além da falta de uma adequada comunicação e interação entre os órgãos públicos envolvidos, como a prefeitura de Olinda, a Compesa e a Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH). Ao longo dos últimos quatro anos o TCE fez vários alertas à Companhia Pernambucana de Habitação e Obras (Cehab) para o perigo de novas inundações e para a necessidade de promover ações de limpeza e desobstrução do canal, diminuindo os problemas causados pelas chuvas.
Transtornos estes que a aposentada Dolores Santos de Paula, 75, conhece bem. A reportagem encontrou ela sentada na calçada da casa onde mora, com seus dois cachorros, esperando a água que inundou o imóvel baixar. "Desde às 3h da madrugada estou acordada. Precisei chamar meu filho para me ajudar a pendurar algumas coisas", disse, acrescentando que já perdeu cama, televisão, sofá, entre outros objetos em enchentes de outros anos. Certos de que outros dias chuvosos virão, os moradores de Olinda seguem na esperança de ter um inverno tranquilo, sem o risco iminente de ver a água invadindo seus lares. Entramos em contato com a Prefeitura de Olinda e Cehab, mas até agora não recebemos resposta.
Previsão
A Agência Pernambucana de Águas e Clima (Apac) emitiu ontem aviso meteorológico com possibilidades de chuvas de intensidade moderada a forte para as regiões da Zona da Mata Norte e Sul, Região Metropolitana do Recife e Agreste do Estado. A previsão era que a chuva desse uma trégua ontem, mas uma segunda banda de nebulosidade estava prevista para começar a causar precipitações moderadas a forte até hoje.
Respostas
De acordo com a Companhia Estadual de Habitação e Obras (Cehab), a primeira fase do Canal do Fragoso foi concluída. Foram revestidos 2,3 km de canal e construídas oito pontes. O trecho finalizado foi, então, entregue à Prefeitura de Olinda, que tem a responsabilidade da limpeza e manutenção do local.
Segue a nota na íntegra:
A Companhia Estadual de Habitação e Obras informa vem trabalhando na segunda fase da Via Metropolitana Norte que consiste na pavimentação de duas faixas de rolamento ao lado do canal do Fragoso, que vão da altura da Avenida Coronel João de Melo Morais a rua Bom Jardim, em Jardim Fragoso, Olinda. Também já está em andamento a terceira fase do projeto que consiste na construção de duas alças de acesso que vão da PE-15 até as vias laterais do canal do Fragoso. Técnico das Cehab estão realizando o levantamento dos imóveis a serem desapropriados. A previsão é que em setembro, após o período de chuvas, seja iniciada a construção das alças na PE-15.
Em março, a companhia concluiu a primeira fase do Canal do Fragoso, onde foram revestidos 2,3 km de canal e construídas oito pontes. Esse trecho finalizado foi entregue a prefeitura de Olinda que ficou responsável a partir de então pela limpeza e pela manutenção.
Para o mês de junho está prevista a licitação da quarta e última fase da Via Metropolitana Norte. Esse trecho prevê o revestimento do restante do canal do Fragoso com 2,1 km, que vai do Maxxi Atacado até a ponte do Janga. Também integra essa fase a pavimentação da rua Bom Jardim até a ponte do Janga, além da construção de uma comporta na foz do Rio Doce. A previsão é que em setembro sejam iniciadas as obras.
A Cehab destaca ainda que em muitos trechos onde o canal já foi concluído é observado que o canal não transborda e as ruas laterais ficam com água retida. A companhia informa que cabe ao município a manutenção do Canal do Fragoso e seus afluentes, assim como a drenagem das ruas no entorno.
Já a Prefeitura de Olinda informa que tem intensificado a limpeza no Canal do Fragoso, com ações diárias.
Segue a resposta na íntegra:
A Prefeitura de Olinda esclarece que as obras do Canal do Fragoso estão sendo executadas sob a responsabilidade do Governo do Estado, através da Companhia Estadual de Habitação (Cehab). Desta forma, cabe ao referido órgão quaisquer esclarecimentos sobre o cronograma das obras, investimentos e demais informações.
O trabalho de limpeza foi intensificado no Canal do Fragoso, nos últimos meses, passando a ser feito diariamente. A ação inclui a retirada da vegetação aquática (baronesas), medidas de limpeza, desassoreamento e desobstrução, contando com o uso de balsas e máquinas
A Prefeitura de Olinda vem executando, nos últimos meses, dentro da Operação Inverno 2020, um trabalho conjunto de limpeza, dragagem, corte de vegetação, supressão de áreas de risco, entre outras ações, sempre voltadas a sanar pontos de alagamento, com o propósito de minimizar os transtornos e garantir a integridade da população. Diversas equipes de profissionais, aliados ao trabalho de máquinas, como caçambas, retroescavadeiras e balsas, promovem a desobstrução dos principais cursos d'água que cortam a cidade, incluindo aqueles afluentes que deságuam no Fragoso.
Nas últimas 24 horas, foi registrada em Olinda uma média de 105 mm de chuva. O levantamento acumulado, entre os dias 1 e 12 deste mês, assinala 70 mm. Sendo assim, apenas nesta data, choveu mais do que todo este período, provocando os referidos pontos de alagamentos. Nestes locais, é realizado um trabalho com máquinas para a retirada da água acumulada, devolvendo a mobilidade e segurança para a população.