Política

Entenda a recente tensão entre o governo Bolsonaro e o Supremo Tribunal Federal

O ponto mais tenso ocorreu na sexta-feira (12)

Presidente da República, Jair Bolsonaro - Isac Nóbrega/PR

Após uma tentativa recente de aproximação, a relação entre o governo do presidente Jair Bolsonaro e o STF (Supremo Tribunal Federal) ganhou novos e tensos embates desde o final da semana passada.

O ponto mais tenso ocorreu na sexta-feira (12). Em decisão, o ministro Luiz Fux (STF) esclareceu que nenhuma interpretação da Constituição permite a intervenção das Forças Armadas sobre o Legislativo, o Judiciário ou o Executivo nem dá aos militares a atribuição de poder moderador.

Apoiadores extremistas de Bolsonaro e o próprio presidente citam o artigo 142 da Constituição como respaldo a uma eventual intervenção militar no país.

Ainda na sexta-feira, Bolsonaro respondeu ao Supremo. Em nota, afirmou que as Forças Armadas "não cumprem ordens absurdas" e não aceitam tentativas de tomada de poder. "Também não aceitam tentativas de tomada de poder por outro Poder da República, ao arrepio das leis, ou por conta de julgamentos políticos."

A reação do presidente foi criticada pelos ministros do Supremo, que viram em Bolsonaro uma preocupação com o julgamento da chapa presidencial no TSE. A corte eleitoral analisa processos que podem levar à cassação da chapa eleita em 2018.

Confira, a seguir, a sequência de embates que esquentou a crise entre Executivo e Judiciário.

SEM GOLPE

Sem golpe A partir da menção do presidente Jair Bolsonaro e de seus apoiadores de que o artigo 142 da Constituição daria respaldo a uma intervenção militar, o general Luiz Eduardo Ramos disse à revista Veja que a ideia de golpe não é ventilada entre os oficiais.

"Eles têm tropas nas mãos. Para eles, é ultrajante e ofensivo dizer que as Forças Armadas, em particular o Exército, vão dar o golpe, que as Forças Armadas vão quebrar o regime democrático", disse o ministro ministro chefe da Secretaria de Governo em entrevista publicada na sexta-feira.

Embora Bolsonaro tenha frequentado atos antidemocráticos, o general reforçou a ideia de que o presidente não fez campanha pelo golpe. "O próprio presidente nunca pregou o golpe. Agora, o outro lado tem de entender também o seguinte: não estica a corda", declarou.

RESPOSTA DO SUPREMO
Em resposta a uma ação apresentada pelo PDT contra "eventual intervenção militar", o ministro Luiz Fux, do STF, delimitou, em decisão judicial, a interpretação da Constituição e da lei que disciplina as Forças Armadas.
Ele esclareceu que elas não permitem a intervenção do Exército sobre o Legislativo, o Judiciário ou o Executivo nem dão aos militares a atribuição de poder moderador. O magistrado deu uma decisão liminar (provisória) para estabelecer que a prerrogativa do presidente da República de autorizar emprego das Forças Armadas não pode ser exercida contra os outros dois Poderes.

BOLSONARO REAGE
Após a decisão de Fux, Bolsonaro (sem partido) afirmou, em nota, que as Forças Armadas "não cumprem ordens absurdas" e não aceitam tentativas de tomada de poder. "Também não aceitam tentativas de tomada de poder por outro Poder da República, ao arrepio das leis, ou por conta de julgamentos políticos."

Ao citar "julgamentos políticos", Bolsonaro faz referência velada a processos em análise no Supremo Tribunal Federal e no TSE (Tribunal Superior Eleitoral). O ministro Og Fernandes, do TSE, havia pedido para o ministro Alexandre de Moraes informar se as provas colhidas no inquérito das fake news, que corre no STF, têm relação com as ações que pedem a cassação da chapa de Bolsonaro e Mourão por crimes eleitorais.

Coassinada pelo vice-presidente, Hamilton Mourão, e pelo ministro da Defesa, Fernando Azevedo, a nota de Bolsonaro afirma que as Forças Armadas "estão sob a autoridade suprema do presidente da República, de acordo com o artigo 142 da Constituição Federal".

"As mesmas destinam-se à defesa da pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem", acrescenta.

Questionado sobre o conteúdo da carta, Mourão disse ao jornal Folha de S.Paulo que as Forças Armadas "se mantêm firmemente disciplinadas" e que seu papel tem sido tratado de forma "preconceituosa" no noticiário.

"Não existem militares fardados dando declarações políticas e participando de manifestações, ou seja, as Forças Armadas se mantêm firmemente disciplinadas."

STF VOLTA A CRITICAR ATITUDE DO GOVERNO
Os ministros do Supremo Tribunal Federal criticaram a nota divulgada por Bolsonaro, Mourão e Azevedo que questionava a ação do ministro Luiz Fux, que concedeu uma decisão provisória delimitando a interpretação do artigo 142 da Constituição, que regula o emprego dos militares.

Integrantes do STF e do TSE viram no conteúdo da nota divulgada por Jair Bolsonaro preocupação do governo com julgamento da chapa presidencial na corte eleitoral. O TSE analisa um processo que pode levar à cassação da chapa eleita em 2018.

Magistrados afirmaram tratar-se de mais uma tentativa de intimidação contra o Judiciário. No entanto, não veem uma ameaça no documento, avalizado por militares e pelo vice-presidente Hamilton Mourão. Acreditam ser parte da retórica construída por Bolsonaro, mas que o governo segue cumprindo as decisões do Judiciário.

PROTESTO NO STF
Após o desmonte do acampamento do grupo "300 do Brasil", manifestantes bolsonaristas voltaram a atacar os ministros do STF na noite de sábado (13). Por volta das 21h30, o grupo lançou fogos de artifício contra o prédio do STF, simulando um bombardeio.

No vídeo, divulgado em redes sociais, um homem profere insultos e menciona alguns nomes de ministros: Cármen Lúcia, Rosa Weber, Dias Toffoli, Ricardo Lewandovsky e Gilmar Mendes.

O presidente do STF, Dias Toffoli, afirmou no dia seguinte que a corte "jamais" se sujeitará a nenhum tipo de ameaça "seja velada, indireta ou direta" e pediu à Procuradoria-Geral da República a instauração de uma investigação sobre o ato.
Nesta segunda-feira (15), a ativista do movimento 300 do Brasil Sara Winter foi presa em Brasília pela Polícia Federal. O mandado de prisão foi autorizado por Alexandre de Moraes.

A ativista é uma das investigadas no inquérito das fake news. A prisão, no entanto, saiu do inquérito que apura os atos antidemocráticos. Winter está entre os líderes do chamado movimento "Os 300 do Brasil", grupo armado de extrema direita formado por apoiadores de Bolsonaro que acampavam em Brasília.