Em julgamento sobre inquérito das fake news, Moraes diz que ameaça ao Supremo é 'bandidagem'
O inquérito apura a disseminação de notícias falsas e ameaças a integrantes do STF
O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), afirmou nesta quarta-feira (17) que os ataques contra a corte não são liberdade de expressão, mas sim "bandidagem".
Ao proferir seu voto em julgamento que decidirá sobre a continuação do inquérito das fake news, relatado por ele, Moraes acompanhou parcialmente o voto do relator, ministro Edson Fachin, pelo prosseguimento do caso.
O inquérito apura a disseminação de notícias falsas e ameaças a integrantes do STF. "Coagir, ameaçar e atentar contra o Supremo Tribunal Federal é atentar contra a Constituição Federal, é atentar contra a democracia, é atentar contra o estado democrático de direito", disse Moraes, segundo ministro a votar na ação, cujo julgamento foi retomado na manhã desta quarta.
O ministro disse que há uma confusão do que são críticas à atuação dos magistrados com o que são ameaças. Ele chegou a ler exemplos do que foi dirigido aos integrantes da corte, dizendo que há incitação de estupro e violência sexual contra familiares dos ministros.
"'Que estuprem e matem as filhas dos ordinários ministros do STF'", leu o ministro, em referência a uma das ameaças endereçadas a integrantes do Tribunal. "Em nenhum lugar do mundo isso é liberdade de expressão. Isso é bandidagem, criminalidade", afirmou, acrescentando que isso foi publicado por uma advogada do Rio Grande do Sul.
Tanto ele quanto o ministro Luís Roberto Barroso, segundo a votar nesta quarta, disseram que não há como se ter um Judiciário forte e independente sem que seus integrantes tenham liberdade para julgar os casos, afirmando que as ameaças interferem nisso. "Liberdade de expressão não é liberdade de destruição da democracia", disse Moraes.
Ao defender que o inquérito das fake news tenha continuidade, ele disse que o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, editou a portaria que deu levou à abertura do inquérito "para garantir a liberdade de expressão, para garantir a independência do Poder Judiciário".
Com a retomada do julgamento, já são três votos pelo prosseguimento do inquérito. Há, contudo, uma pequena divergência nos votos dos três magistrados.
Na semana passada, o relator fez uma interpretação específica em seu voto. Fachin propôs que o objeto do inquérito seja limitado a ações que ofereçam "risco efetivo" à independência do Poder Judiciário. Como exemplo de atos desta natureza, citou ameaças a ministros e a incitação ao fechamento do Supremo.
Fachin é o relator da ação que questiona a legalidade do ato do presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, de abrir a investigação de ofício, ou seja, sem provocação da PGR (Procuradoria-Geral da República). Também é contestada a indicação do ministro Alexandre de Moraes como relator sem realização de sorteio entre todos os ministros, como ocorre geralmente.
Fachin defendeu a exclusão de "matérias jornalísticas" das investigações. Foi neste inquérito, por exemplo, que Moraes mandou tirar do ar uma reportagem da revista Crusoé que envolvia Toffoli. Também foi neste inquérito que Moraes determinou operação policial, em 27 de maio, contra deputados, empresários e blogueiros bolsonaristas.
Fachin também sustentou que as apurações não podem se voltar contra manifestações pessoais que não integrem um sistema de financiamento e divulgação em massa de fake news.
O relator admitiu que o assunto é controverso, mas salientou que o regimento interno do STF, que tem força de lei, permite a apuração de supostos crimes contra a corte quando há omissão da PGR ou da Polícia Federal.
Pontos controversos sobre o inquérito
Ato de ofício
Toffoli abriu o inquérito sem provocação de outro órgão, o que é incomum. Segundo o STF, porém, há um precedente: uma investigação aberta pela Segunda Turma da corte para apurar o uso de algemas na transferência do ex-governador do RJ Sérgio Cabral.
Competência
A investigação foi instaurada pelo próprio STF, quando, segundo críticos, deveria ter sido encaminhada para o Ministério Público. O argumento é que o órgão que julga não pode ser o mesmo que investiga.
Relatoria
Toffoli designou Alexandre de Moraes para presidir o inquérito, sem fazer sorteio ou ouvir os colegas em plenário. Assim, Moraes é quem determina as diligências investigativas.
Foro
O que determina o foro perante o STF é quem cometeu o delito, e não quem foi a vítima. Para críticos, a investigação não deve correr no Supremo se não tiver como alvo pessoas com foro especial.
Regimento
Toffoli usou o artigo 43 do regimento do STF como base. O artigo diz que, "ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do tribunal, o presidente instaurará inquérito". Críticos dizem que os ataques pela internet não ocorrem na sede do Supremo, mas Toffoli deu a interpretação de que os ministros representam o próprio tribunal.
Liberdade de expressão
Moraes pediu o bloqueio de redes sociais de sete pessoas consideradas "suspeitas de atacar o STF". A decisão foi criticada por ferir o direito à liberdade de expressão. O mesmo pode ser dito sobre a censura, depois derrubada, aos sites da revista Crusoé e O Antagonista.