Postos de gasolina vão questionar escalada de preço do biodiesel no Cade

O cenário gerou um embate público em que produtores de biodiesel acusam o setor de combustíveis de propagar análises equivocadas

Posto de combustível - Marcello Casal Jr/Agência Brasil

A escalada do preço do biodiesel nos últimos meses começa a gerar questionamentos sobre o modelo de leilões promovidos pela ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) e será levada ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) pelos postos de gasolina, que reclamam de concentração do mercado e pedem abertura das importações.

O cenário gerou um embate público em que produtores de biodiesel acusam o setor de combustíveis de propagar análises equivocadas e prestar desserviços ao consumidor, enquanto postos e distribuidoras relatam dificuldades de conseguir o produto.

O biodiesel representa 12% do diesel vendido pelos postos. As compras do produto são feitas por meio de leilões realizados pela ANP a cada dois meses, modelo que foi implantado há 15 anos para garantir previsibilidade ao mercado e fomentar investimentos na produção de biocombustíveis.

O último leilão de biodiesel promovido pela agência teve preço médio de R$ 3,80 por litro, um recorde histórico e o equivalente ao dobro do preço cobrado pela Petrobras pelo diesel de petróleo em suas refinarias. O valor é 63% superior ao verificado há um ano.

Foi um leilão extraordinário, com pouco volume vendido, mas o movimento de alta é constante nos leilões anteriores. No penúltimo, o produto foi vendido a R$ 3,53, alta de 51% com relação ao verificado em junho de 2019.

Para empresários do setor de combustíveis o modelo de leilões já não garante os melhores preços ao consumidor. "Está na hora de liberar, de cada um negociar com seus fornecedores", diz o presidente da Fecombustíveis (Federação do Comércio Varejista de Combustíveis e Lubrificantes), Paulo Miranda.

Ele questiona a proibição de importações do produto, alegando que a produção brasileira é concentrada nas mãos de um grupo com forte poder de pressão. "São trinta e poucos produtores, que se fortaleceram com o lobby do agronegócio", afirma.

Miranda diz que o biodiesel pode ser encontrado no mercado internacional 30% mais barato do que no Brasil e que na semana que vem levará ao Cade uma denúncia de concentração de mercado no setor. Segundo a ANP, 33 produtores realizaram entregas de biodiesel a distribuidoras de combustíveis em 2020. Quase metade das vendas foi feita por oito deles.

Em geral, os produtores de biodiesel são grandes empresas do agronegócio, que têm a soja e outros grãos como principal produto entre os produtores, estão empresas como Bunge, a chinesa Cofco e a JBS, por exemplo. Parte deles usa gordura animal como matéria-prima.

Na semana passada, distribuidoras e postos começaram a reclamar de escassez do produto, principalmente na região Sudeste, mais distante da produção. Com dificuldade de encontrar o biocombustível para misturar no diesel, as distribuidoras passaram a racionar a entrega deste último aos postos.

Segundo a Fecombustíveis, em média, os pedidos vêm sendo entregues com um volume 20% menor do que o solicitado. Na semana passada, a ANP chegou a reduzir temporariamente o percentual obrigatório para 10%, em uma tentativa de evitar falta de óleo diesel nos postos.

Diante das queixas, o MME (Ministério de Minas e Energia) divulgou nesta sexta (26) comunicado em que diz que está monitorando o mercado e tomando medidas para resolver problema, entre elas o leilão desta semana.

O texto diz que "a pandemia de Covid-19 impôs uma série de grandes desafios ao abastecimento de combustíveis". "MME e ANP têm acompanhado a grade de carregamento de biodiesel no produtor para avaliar eventual dificuldade logística e fiscalização dos agentes regulados."

Os produtores e biodiesel rechaçam as acusações do setor de combustível e dizem que os leilões são públicos e transparente, "um ambiente de alta competitividade que permite estabilidade nos preços por 60 dias". "Não há concentração de mercado, muito menos um monopólio", afirma a Aprobio (Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil), em nota.

Eles acusam distribuidoras e postos de "propagar uma análise equivocada sobre a formação de preços do diesel e a capacidade de entrega da cadeia". "Com isso, prestam desserviços aos seus consumidores e à sociedade", dizem.

Quando os preços começaram a subir em 2019, os produtores disseram que o movimento acompanhava a alta da cotação do óleo de soja. Agora, jogam na recuperação das cotações do petróleo a responsabilidade pela alta recente do preço do diesel mas bombas. Em nota, disseram ainda que "não é possível dizer que há escalada" e que o biodiesel estaria ajudando a segurar os preços.

A Aprobio defendeu ainda que a falta de produtos é responsabilidade de distribuidoras que deixaram de coletar suas cargas. Em nota, a ANP afirmou que "não existe escassez de biodiesel" e que não tem conhecimento de falta de diesel em postos. A agência disse ainda que o modelo de leilões está sendo discutido no âmbito do programa Abastece Brasil, iniciativa do governo federal para desenvolver o setor "com foco na promoção da livre concorrência".