Coronavírus

Covid-19 é mais letal em bairros pobres do Recife

Dados do boletim da Secretaria de Saúde da capital pernambucana indicam panorama da doença, que mata menos nos bairros mais ricos

Movimentação no bairro de Afogados, no Recife - Arthur de Souza / Folha de Pernambuco

Os cinco bairros do Recife com a maior taxa de letalidade absoluta por Covid-19 têm rendimento mensal por domicílio de até R$ 1,3 mil e estão entre os mais pobres da Cidade. Em primeiro lugar, está o Totó, na Zona Oeste da capital pernambucana, onde 15 pessoas de um total de 28 com a doença perderam a vida, o que resulta em uma letalidade de 53,6%, segundo os dados mais recentes do boletim epidemiológico da Secretaria de Saúde (Sesau), divulgados nessa quarta-feira (8). No bairro, a renda mensal é de R$ 1.296,05.

Seguem nas posições seguintes do ranking, Brejo de Beberibe, com 46,7% de letalidade e renda mensal de R$ 1.058,37; Mustardinha (42,9% e R$ 1.251,81); Beberibe (42,5% e R$ 1.038); e Coqueiral (38,3% e R$ 1.039,79). Os dados de rendimento são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e compilados pela Prefeitura do Recife.

Nos bairros com a taxa de letalidade mais baixa, o cenário econômico é o oposto. Com apenas 2,8% de letalidade (36 casos e 1 morte), a menor do Recife entre os bairros com mortes confirmadas, Apipucos tem uma renda média mensal de R$ 2.162,82. Parnamirim, com 5,8% de letalidade, apresenta rendimentos de R$ 10.712,06. Já o bairro das Graças tem 7,3% de letalidade e renda de R$ 9.484,01. Os três são os com menos taxa de letalidade entre os bairros.

Esse panorama indica que a taxa de letalidade é maior em bairro mais pobres da Cidade e, consequentemente, menor nas regiões mais ricas. Em números absolutos da Covid-19, o bairro de Boa Viagem lidera o total de mortes, com 123 registros. A letalidade é de 18,0% e a renda média, de R$ 7.108,00. 

Em segundo no número de total de óbitos, o bairro da Cohab tem 30,9% de letalidade, com rendimento mensal de R$ 1.182,43. A maior taxa de letalidade entre os 10 bairros com maior total de mortes é do bairro de Nova Descoberta, com 36,6%. A renda mensal é de R$ 898,39.

O secretário municipal de Saúde do Recife, Jailson Correia, argumenta que, apesar dos riscos biológicos naturais da Covid-19, o peso dos determinantes sociais é importante tanto no adoecer quanto no morrer. "A chance de adoecer é mais ou menos uma chance democrática, mas a de morrer, embora posso acontecer com qualquer pessoa, é ainda mais dura nas pessoas mais vulneráveis", diz o gestor.

Segundo Jailson, a prefeitura vem acompanhando desde o início da pandemia, as variações na doença na Cidade, como por faixas etárias, comorbidades e a distribuição nos bairros, assim como a condição de vida em cada região. "As ações da prefeitura visam chegar mais junto da população mais vulnerável. Temos, por exemplo, a distribuição de porta em porta de máscaras, kits de higiente e orientações, além da identificação de pessoas sintomáticas, começando pelas áreas mais vulneráveis da Cidade", complementa. 

Outro fator relevante nesse cenário é o do isolamento social em bairros mais pobres, onde a distribuição de moradores por cômodo é maior. "É muito mais dificíl permancer em uma casa de um cômodo do que em um apartamento de classe média", pontua Jailson Correia. "Mesmo com todas essas dificuldades e sendo uma cidade de alta densidade e muita pobreza, o Recife liderou entre as capitais brasileiras o índice de isolamento social como um todo", conclui. 

Para o infectologista Demócrito Miranda Filho, esse panorama é um reflexo da desigualdade social do Brasil. “Essas pessoas [em vulnerabilidade econômica] têm mais dificuldade de acesso ao sistema de saúde, à informação, chegam muito mais tarde aos hospitais e pagam o preço dessa desigualdade”, defende. 

“É muito mais uma questão social, de acesso e disponibilidade dos meios de tratamentos adequados do que um comportamento próprio da doença”, conclui Demócrito, ao citar as questões da Covid-19 relacionadas à expansão da doença nos bairros mais pobres.

Medidas da prefeitura em bairros pobres
Desde a última segunda-feira (6), 200 mil máscaras artesanais são distribuídas pelas Estações Itinerantes de Orientações sobre a Covid-19, em comunidades carentes do Recife. O trabalho é feito de porta a porta por agentes de saúde da prefeitura. 

Além das máscaras, os moradores recebem um kit de limpeza composto por água sanitária, sabão em barra e hipoclorito em gotas, voltado para a higienização de alimentos e um kit de higiene bucal. Em áreas de palafitas, os agentes também esclarecem como se portar diante do "novo normal" imposto pela pandemia. 

Covid-19 no Recife
Os dados do boletim indicam que o Recife confirmou, nessa quarta-feira, 253 novos casos de Covid-19, sendo 225 casos leves e 28 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (Srag), além de 10 novas mortes - sendo cinco mulheres e cinco homens.

A Cidade totaliza, desde o início da pandemia, um total de 22.092 casos confirmados - 14.106 leves e 7.986 de Srag - e 1.927 mortes. 18.430 pacientes já estão recuperados clinicamente da doença.