Gasolina adulterada importada pela Petrobras leva à suspensão de voos da aviação executiva
As vendas do produto foram interrompidas pela Petrobras no sábado (11), depois de alertas feitos por pilotos e proprietários de aviões
Problemas de qualidade em combustível de aviação importado pela Petrobras já provocam desabastecimento em ao menos 19 aeroportos brasileiros, limitando a operação de pequenas aeronaves por todo o país. As vendas do produto foram interrompidas pela Petrobras no sábado (11), depois de alertas feitos por pilotos e proprietários de aviões.
Eles identificaram corrosão e derretimento de peças do sistema de combustível dos aviões, levando a Aopa (Associação dos Pilotos e Proprietários de Aeronaves) a emitir no sábado recomendação para suspender as operações de aviões e helicópteros de pequeno porte.
O problema não afeta a aviação comercial, já que os aviões movidos a turbinas utilizam outro combustível, o querosene de aviação. Mas cria dificuldades para aviação executiva, pulverização de defensivos agrícolas e empresas que fazem aviação médica.
Até o momento, não há relatos de acidentes causados pelos problemas na gasolina, mas especialistas no setor suspeitam que o problema possa estar por trás da queda de uma pequena aeronave perto do campo de Marte, em São Paulo, na última quarta (8), deixando uma vítima fatal.
Em nota, a Petrobras informou que interrompeu preventivamente as vendas de um lote de gasolina de aviação importada depois que testes realizados em seu centro de pesquisas identificaram a presença de componentes químicos diferentes dos verificados em lotes anteriores.
"A Petrobras estuda a hipótese da variação da composição química ter impactado os materiais de vedação e revestimento de tanques de combustíveis de aeronaves de pequeno porte", escreveu a empresa, defendendo, porém, que o produto atende às especificações da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis).
Os alertas de pilotos começaram em junho, em redes sociais e grupos de Whatsapp que reúnem colegas de profissão. Em vídeos, mostravam peças danificadas e acúmulos de sujeira em partes do sistema de combustível das aeronaves. Na quarta, a Aopa emitiu uma primeira nota sobre o tema, recomendando maior rigor nas inspeções.
A entidade solicitou à Petrobras, via Lei de Acesso à Informação, detalhes sobre o lote que apresentou problemas, como a origem, como foi feito o transporte e para quem foi vendido no Brasil. Pediu ainda os resultados dos laudos de conformidade do combustível.
O piloto e advogado especialista em direito aeronáutico Rodrigo Duarte diz que a legislação determina que amostras de combustível seja analisadas em todas as instalações pelas quais o produto passa. "São muitos testes e nenhum desses testes apontou a presença do contaminante", diz ele.
O Brasil não produz gasolina de aviação desde 2018, quando a única unidade de refino que fazia o produto, localizada em Cubatão (SP), entrou em obras. Assim, todo o fornecimento é importado e, portanto, passa por navios, terminais de importação, tanques e caminhões até chegar ao consumidor final.
A ANP e a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) criaram um grupo de trabalho para investigar o problema. No texto, a Anac recomenda que proprietários que tenham verificado histórico ou evidências de contaminação "busquem imediatamente uma oficina de manutenção aeronáutica credenciada".
Até esta segunda (13), a agência que regula o setor aéreo diz ter recebido 67 relatos de problemas relacionados à contaminação do combustível. "Todo esse trabalho de mapeamento dos riscos para a aviação geral vem sendo feito em estreita parceria com a Aopa e com outros grupos do setor".
Como os relatos vêm de todo o Brasil, o setor suspeita que a contaminação tenha ocorrido antes da entrega do produto às distribuidoras pela Petrobras. Nesta segunda, BR Distribuidora, Raízen e Air BP anunciaram a suspensão das vendas dos volumes que mantém em seus tanques pelo país.
O Comaer emitiu 19 boletins nesta segunda sobre falta do produto em aeroportos brasileiros, mas o setor diz que o número de afetados é maior. Empresas de aviação agrícola dizem que o efeito da crise é amenizado pelo fato de que o país está em entressafra, com a maior parte das aeronaves em solo.
Procurado pela Folha, o Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) disse que as investigações sobre a queda da aeronave em São Paulo na semana passada ainda estão em curso.