Taxa de cura da Covid volta a crescer nos hospitais do Brasil, mas ainda é baixa
Em maio, mês mais crítico, esse índice chegou a 53%, o ponto mais baixo
Mais alta nos primeiros dias da pandemia, a taxa de sobrevivência de pacientes internados com Covid-19 voltou a crescer no Brasil. Levantamento feito pela reportagem com base em dados do Sistema de Vigilância Epidemiológica do Ministério da Saúde mostra que 60% das pessoas hospitalizadas na semana do dia 13 de junho tiveram alta. Em maio, mês mais crítico, esse índice chegou a 53%, o ponto mais baixo.
Os números se referem apenas a pacientes que ficaram internados –ou seja, os casos graves de Covid-19– e não incluem, portanto, o total de pessoas que receberam o diagnóstico de infecção pelo novo coronavírus. Foram considerados dados até o último dia 13 de junho, e os percentuais são uma média móvel dos últimos 7 dias.
A melhora no quadro, segundo especialistas consultados pela reportagem, pode decorrer da combinação de hospitais menos cheios com maior experiência dos médicos e demais profissionais de saúde, que foram aprendendo sobre a melhor forma de lidar com a doença ao longo da pandemia.
No fim de março, quando os casos confirmados ainda não chegavam aos milhares, ficou em quase 70% a proporção de doentes internados que conseguiam se curar. À medida que o vírus foi se espalhando e o número de pacientes cresceu, aumentou também a proporção de mortes.
A situação foi mais grave no Norte e Nordeste, com redes de saúde menos robustas que as dos estados mais ao sul.
O Amazonas, primeiro a ter o sistema de saúde em colapso, viu a taxa de mortalidade nos hospitais crescer rapidamente já no início de abril. Em meados daquele mês, imagens de corpos ao lado de pacientes começaram a circular nas redes sociais.
A ocupação de leitos de UTI, necessários para dar o devido atendimento aos casos mais graves, chegou ao limite. Ambulâncias rodavam por horas nas ruas de Manaus à espera de uma vaga para os doentes.
Durante mais de um mês, os hospitais registraram mais mortos que curados. No período mais crítico, a cada 5 pacientes internados, 3 morriam.
Para dar conta do volume de óbitos, a prefeitura da capital amazonense contratou containers frigoríficos para armazenar corpos e mandou abrir valas comuns em cemitérios.
Em 17 de abril, outros três estados tinham mais de 90% de ocupação dos leitos públicos de UTI reservados para pacientes com coronavírus: Ceará, Pará e Pernambuco, todos eles com mais mortos que curados e com a proporção de óbitos em expansão.
"O nosso sistema de saúde não suporta o que o do Sudeste suporta. São Paulo nunca chegou a esse grau [de ocupação]. A gente colapsou muito cedo. Com um volume de atendimentos tão grande, é impossível garantir qualidade de assistência padrão", diz Bruno Ishigami, infectologista do hospital Oswaldo Cruz e do hospital de campanha do Recife. "Minha impressão é que os pacientes demoravam muito nas emergências para chegar na UTI. Quando chegavam, não tinha muito mais o que se pudesse fazer", completa.
De abril a maio, a situação de caos nas redes hospitalares se repetiu em mais estados, como Maranhão, Amapá, Rio Grande do Norte e Rio de Janeiro. Naqueles dois meses, o número de mortos pelo coronavírus chegou a 30 mil em todo o país.
Com a ampliação emergencial de leitos e com um maior controle da epidemia em alguns estados, a situação deu sinais de melhora. Desde meados de maio, a proporção de pacientes curados vem crescendo no país, especialmente no Amazonas e no Nordeste.
Ainda assim, estados como Rio Grande do Sul e Goiás, que nesse período tiveram crescimento dos casos e de ocupação de leitos, registraram aumento da taxa de mortalidade nos hospitais.
"Se há três pacientes disputando vaga de UTI, vai o mais grave. Já se temos mais leitos disponíveis para internação cai o tempo de espera em pronto-socorro. Com enfermarias mais vazias, com certeza melhora a assistência", afirma a infectologista Gladys Prado, do hospital Sirio-Libanês, em São Paulo.
Outro ponto citado por especialistas é o aprendizado adquirido pelos profissionais de saúde ao longo da pandemia. A doença é nova, e muitas equipes foram formadas às pressas para lidar com a crescente demanda.
Em alguns casos, para atender ao grande volume de pacientes, hospitais e secretarias de Saúde precisaram recrutar profissionais recém-formados ou sem grande experiência prática em UTIs e enfermarias.
"Entrava muita gente sem experiência com paciente grave porque no contexto de pandemia era o que dava. Como temos dois, três meses, a equipe inteira já passa a entender mais o que precisa ser feito. Eu sinto que a gente melhorou muito a qualidade da assistência", diz Ishigami, do Recife.
Com o tempo também são feitas novas descobertas científicas sobre o vírus e protocolos são atualizados. Mesmo para os médicos mais experientes, os primeiros meses foram desafiadores.
"Muito se tem aprendido agora, durante a pandemia, com a prática", diz Leonardo Weissman, infectologista do hospital Emilio Ribas, em São Paulo, e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia. "É um vírus novo, que está escrevendo a história dele agora."