Bretas cita suspeita de 'ilícitos em seguidos cargos' para justificar prisão de secretário de Doria
A suposta reincidência foi ressaltada pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro
Preso na manhã desta quinta-feira (6), o secretário dos Transportes Metropolitanos de São Paulo, Alexandre Baldy (PP), é investigado por supostamente ter recebido vantagens indevidas ao longo de todos os cargos públicos que ocupou de 2014 a 2018.
A suposta reincidência foi ressaltada pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, no despacho que ordenou a prisão de Baldy e de outros cinco investigados.
"Parece mesmo que o investigado Alexandre Baldy adotou a prática habitual de cometimento de vários ilícitos penais ao longo dos seguidos cargos públicos que ocupou", escreveu o magistrado.
Os supostos atos ilícitos de Baldy investigados pelo Ministério Público Federal, no entanto, não são relacionados à gestão João Doria (PSDB) em São Paulo.
Secretário de Indústria e Comércio de Goiás de 2011 a 2013, Baldy foi eleito deputado federal em 2014 e se tornou ministro das Cidades do ex-presidente Michel Temer (MDB) ao final de 2017.
Baldy e os demais alvos são investigados sob suspeita de corrupção, peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Alem das prisões e buscas, Bretas determinou o bloqueio de bens em valores que ultrapassam R$ 12 milhões.
A Operação Dardanários, deflagrada nesta quinta, é um desdobramento de investigações da Lava Jato no Rio que apuraram desvios na área da saúde, especialmente a Operação SOS.
Deflagrada há dois anos, a SOS mirou fraudes em contratações na Secretaria de Saúde do Rio envolvendo a organização social Pró-Saúde, que administrava alguns hospitais do estado. Segundo as investigações, esses contratos permitiram o desvio de pelo menos R$ 74 milhões dos cofres públicos.
Agora, a partir da colaboração premiada de ex-diretores da Pró-Saúde, os investigadores afirmam que Baldy recebeu vantagens indevidas da OS e de outra empresa vinculada aos antigos gestores.
Em troca, de acordo com o MPF, o secretário atuou para garantir o firmamento de novas contratações com órgãos públicos, em outros estados.
No despacho que ordena as prisões, Bretas cita entendimento do MPF de que os recursos utilizados pela Pró-Saúde para o pagamento de vantagens indevidas tiveram como origem os valores desviados por meio dos contratos com a Saúde do Rio.
A Procuradoria afirma que Ricardo Brasil e Manoel Brasil, ex-gestores da Pró-Saúde, geraram um "caixa 2" para pagamentos de valores não contabilizados a partir do superfaturamento de contratos, alimentado em grande parte pelos repasses feitos pelo estado do Rio.
As medidas cautelares contra Baldy foram requeridas ao STF (Supremo Tribunal Federal), já que à época ele ainda ocupava o cargo de ministro. Com a saída do ministério ao fim de 2018 e a perda do foro, os autos foram encaminhados por conexão à 7ª Vara Federal Criminal do Rio.
Bretas narra na ordem de prisão três principais situações em que o secretário teria cometido atos ilícitos em troca de vantagens indevidas, de acordo com a Procuradoria.
Antes das eleições de 2014, segundo as investigações, Baldy atuou para facilitar pagamentos atrasados do hospital Hurso (Hospital de Urgencia da Regiao Sudoeste), em Goiás, à Pró-Saúde, que administrava a unidade.
Como contrapartida, de acordo com o Ministério Público Federal, ele recebeu R$ 500 mil em espécie para sua campanha eleitoral, fora da contabilidade oficial.
O MPF chegou a esta conclusão a partir das colaborações de Ricardo Brasil e Manoel Brasil e de dados obtidos em conversas telefônicas.
O segundo fato citado pelo Ministério Público Federal diz respeito a um contrato firmado pela Juceg (Junta Comercial do Estado de Goiás), sob a presidência de Rafael Lousa, aliado político de Baldy.
Após se desligar da Pró-Saúde, Ricardo Brasil se vinculou à empresa Vertude. De acordo com os investigadores, Baldy tentou facilitar a contratação da Vertude pela Juceg em troca de vantagens indevidas.
A empresa ganhou o pregão eletrônico e firmou contrato com a Juceg no valor de R$ 4,2 milhões. No email de Rafael Lousa, os investigadores encontraram mensagens encaminhadas por funcionários da Vertude com informações técnicas e proposta comercial antes do início da licitação.
Por último, a investigação também indica que Baldy atuou a favor da contratação irregular da Vertude junto à Funasa (Fundação Nacional da Saúde).
O MPF afirma que o primo de Baldy, Rodrigo Dias, então presidente da Funasa, sugeriu que a fundação contratasse a Vertude, o que não foi efetivado por discordância da Procuradoria do órgão.
Como saída, ficou decidido que a Vertude seria subcontratada pela Fiocruz, vinculada a Funasa. Segundo as investigações, o acerto foi intermediado por Guilherme Franco Netto, funcionário da Fiocruz.
Os procuradores afirmam que, apesar do direcionamento favorável à empresa, o certame teve disputa acirrada e a proposta inicial de R$ 4,5 milhões, apresentada pela Vertude, foi reduzida para R$ 2,78 milhões.
Poucos meses após a realização do pregão, no entanto, foi celebrado aditivo contratual de R$ 1,7 milhão, o que atingiu o valor inicialmente estipulado pelos investigados.
Em troca da efetivação do contrato, o Ministério Público afirma que Baldy recebeu R$ 900 mil em espécie, e Dias, R$ 250 mil.
"Cabe ainda destacar que, diante de todo o arcabouço acostado, muito provavelmente o aditivo de mais de 50% no valor do contrato original não era necessário para a realização da atividade pactuada com Vertude, tendo o grupo criminoso empreendido esforços para, em tese, desviar valores da Fundação que maneja pesquisas técnicas extremamente sensíveis e de suma importância para a saúde pública", escreveu Bretas.
No despacho, o juiz ainda ressalta que relatórios do Coaf (órgão federal) revelam indícios de que Baldy lavou o dinheiro obtido de forma ilícita por meio da mulher e do sogro. Segundo os relatórios, esses familiares movimentaram altas quantias em dinheiro, de 2012 a 2017, sem motivação aparente.
Bretas também cita inconsistências nas contas de Baldy, como a compra em espécie de moeda estrangeira no valor de R$ 1,2 milhão, em julho e outubro de 2017. Em 2015, ele e sua mulher, Luana, compraram uma aeronave "por meio de operações suspeitas de empréstimo", escreve o juiz.
Ainda de acordo com o despacho de Bretas, Baldy comprou um imóvel em Brasília no valor de R$ 7,6 milhões, cuja integralidade do pagamento não consta em sua declaração de Imposto de Renda. À Justiça Eleitoral, Baldy declarou bens e valores de cerca de R$ 4 milhões.
O Ministério Público Federal pediu a prisão preventiva de Baldy, mas Bretas autorizou somente a prisão temporária, que tem prazo de cinco dias, porque os fatos narrados pela investigação não são atuais.
"A última notícia de possível cobrança de Baldy aos colaboradores ocorreu em novembro de 2018. Desse modo, apesar de fortemente delineado o cometimento dos delitos, não restou, por ora, consubstanciado o perigo iminente à ordem pública e à instrução criminal, mormente, pela ausência de contemporaneidade", escreveu.
Na casa que Baldy mantém em Brasília os agentes federais apreenderam R$ 90 mil, guaradados em dois cofres. Em outra residência do secretário, em Goiânia, a PF achou mais R$ 110 mil.
Em nota, a defesa do secretário afirma que Baldy não participou de atos ilícitos, que a prisão foi desnecessária e que tomará providências para a sua revogação.
"Foi desnecessário e exagerado determinar uma prisão por fatos de 2013, ocorridos em Goiás, dos quais Alexandre não participou. Alexandre sempre esteve à disposição para esclarecer qualquer questão, jamais havendo sido questionado ou interrogado, com todos os seus bens declarados."