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'Relatório existe, mas não dossiê', diz ministro sobre monitoramento de antifascistas

A reunião, de mais de quatro horas, foi fechada e restrita apenas aos integrantes da comissão

André Mendonça - José Cruz/Agência Brasil

O ministro da Justiça, André Mendonça, admitiu aos parlamentares que integram a comissão Mista de Controle de Atividades de Inteligência que existe um relatório produzido pelo governo sobre a atuação de 579 professores e policiais identificados como antifascistas.

"O relatório existe. O que não existe é um dossiê. Dossiê é uma expressão inadequada para a atividade de inteligência. Dossiê é algo feito às escuras para fins indevidos, que não estão no sistema. Que não está relatado oficialmente. Dossiê não é algo que você distribui", disse o ministro durante reunião da comissão realizada nesta sexta-feira (7).

A reunião, de mais de quatro horas, foi fechada e restrita apenas aos integrantes da comissão. Segundo eles, o ministro afirmou que recebeu o relatório a partir do dia 9 de junho, após ação apresentada pelo partido Rede Sustentabilidade com base em uma reportagem do UOL, que aponta a produção do material.

 

O ministro ressaltou que, se o documento fosse algo ilegal, não teria os registros e protocolos feitos no sistema do ministério e nem distribuição às forças de segurança locais.

"Se houvesse qualquer tentativa de levantar dados para fins ilícitos ou indevidos não fazia uma divulgação dessa manta", afirmou o ministro aos congressistas.

"O relatório está registrado, tem número e está dentro do sistema", completou.

A reunião virtual foi limitada aos integrantes da comissão, que é composta por seis senadores e seis deputados federais. A pedido do próprio ministro, a reunião foi sigilosa. Segundo outro participante, Mendonça contradisse esclarecimentos que ele próprio havia encaminhado ao STF (Supremo Tribunal Federal).

Na última quinta-feira, o Ministério da Justiça afirmou ao STF que não produz "dossiê" contra opositores e que nunca monitorou adversários com "viés investigativo, punitivo ou persecutório penal".

Em resposta à corte, o ministro disse que não nega a existência deste tipo de levantamento, mas afirma que a pasta atua conforme a lei que disciplina a atividade de inteligência do governo federal. A ministra do STF cobrou explicações, mas não exigiu o envio do suposto relatório.

A notícia sobre o documento causou incômodo no STF e na cúpula do Congresso. Após ser pressionado, André Mendonça reagiu e, na segunda-feira (3), anunciou uma sindicância interna para apurar o caso, além de, como revelou o Painel, ter demitido Gilson Mendes, que seria o responsável por reunir os dados dos servidores.

O ministério diz ainda que os relatórios de inteligência são "dotados de sigilo, com acesso restrito" e que "não são passíveis de consubstanciar ou embasar investigações criminais".

Também afirma que o levantamento de sigilo de um relatório de inteligência poderia afetar até a imagem do Brasil perante o mundo.

Segundo a reportagem do UOL, o ministério produziu um relatório com nomes e, em alguns casos, fotografias e endereços de redes sociais das pessoas monitoradas.

Investida das atribuições de serviço de inteligência por um decreto de Jair Bolsonaro, o de nº 9.662 de 1º de janeiro de 2019, a Seopi não submete todos os seus relatórios a um acompanhamento judicial.

Conforme o jornal Folha de S.Paulo mostrou, a atuação da Seopi para monitoramento político de adversários e críticos do governo de Jair Bolsonaro foge de suas atribuições, mas não é completamente atípica na pasta.

Reservadamente, ex-integrantes do Ministério da Justiça dizem que a pasta já acompanhou grupos políticos ou organizações sociais durante eventos como Jornada Mundial da Juventude (2013), Copa do Mundo (2014) e Jogos Olímpicos do Rio (2016).

De acordo com um ex-ministro da Justiça, os monitoramentos de redes sociais se intensificaram após os atos contra o aumento das passagens de transporte em 2013 e foram feitos sistematicamente nos grandes eventos nos anos seguintes.

Na época, foi criada uma estrutura provisória –aos moldes de uma sala de crise– para fazer as análises. O grupo era formado também por integrantes de outros órgãos como a Polícia Federal, Forças Armadas e representantes estaduais da área de segurança pública.

Esse mesmo ex-ministro diz que é necessário haver pelo menos dois tipos de situações para justificar a elaboração de documentos de análises de grupos sociais.