Economia

Pagamento instantâneo no formato do Pix existe em mais de 50 países

Cerca de 50 países têm ou planejam ter esse tipo de serviço, mas o número de adesões ainda não é preciso

Maquininhas de cartão - Divulgação

Às vésperas do lançamento, o Pix, sistema de pagamentos instantâneos do Banco Central, tem uma coleção de irmãos espalhados pelo mundo e que podem servir de exemplo de como vai funcionar essa nova tecnologia no Brasil.

Dois dos mais citados por especialistas estão na Índia e no Reino Unido -o primeiro pela capacidade de incluir uma enorme população sem conta em banco, o segundo por ser considerado um sucesso de adesão, com grande volume de transações.

Cerca de 50 países têm ou planejam ter esse tipo de serviço, mas o número de adesões ainda não é preciso. É difícil monitorar os lançamentos, que ocorrem rapidamente, e também determinar com exatidão o que efetivamente é um pagamento instantâneo, uma vez que ainda não há um padrão.

Recorrendo a uma definição técnica, um pagamento instantâneo é a transferência eletrônica de recursos financeiros entre duas contas e que não pode ser desfeita. A pessoa que enviou e a que recebeu são avisadas imediatamente, e o dinheiro tem que estar disponível para o recebedor em poucos segundos.

É isso o que norteia o levantamento da empresa.

Mas ele desconsidera outros atributos que são considerados pelo mercado como parte importante de um sistema de pagamentos instantâneos moderno: precisa estar disponível 24 horas por dia, sete dias por semana, todos os dias do ano, bem como ser aberto a todos que quiserem participar (além dos bancos).

Também é importante que não só a parte visível da operação financeira (o dinheiro sair de uma conta e cair em outra), mas a transferência efetiva entre instituições (chamada de compensação) deve ocorrer em poucos segundos.

Outro ponto considerado essencial é a identificação de usuários por dados simples, como telefone ou email, em vez de informar código do banco, agência, conta, CPF e nome completo.

Essas características estão abarcadas no Pix, que iniciará operações em 16 de novembro.

Para o lado do usuário, também existem diferenças significativas no novo modo de pagamento. Os sistemas mais simples permitem apenas transferências entre pessoas.

Depois disso, começa uma graduação: pessoas para empresas, empresas para pessoas, entre empresas, pessoas para governos (e vice-versa), empresas para governos (e vice-versa), pagamentos no varejo físico e online por QR-Code, caixas eletrônicos e até cobranças automáticas (a evolução do débito em conta).

No levantamento da FIS constava que o Brasil tem pagamento instantâneo desde 2002: o serviço citado era a transferência do tipo TED, que funciona apenas em dias úteis, em horário limitado, com tempo de transferência que supera os 15 minutos e sem a compensação imediata entre instituições financeiras. Em contratações isoladas, pode custar mais de R$ 20 por operação.

A Folha também atualizou os dados de países que em setembro do ano passado ainda estavam na fase de desenvolvimento, mas entraram em operação de lá para cá. A reportagem tentou também outros levantamentos, mas a verdade é que especialistas descobriram que era um acompanhamento muito difícil de se fazer e simplesmente abandonaram a ideia de um estudo global sistemático.

Foi o que disse Michael Knetsch, diretor de negócios e especialista em produtos na área de pagamentos do Deutsche Bank.

Ainda assim, o mapa existente permite vislumbrar a transformação pela qual passa o sistema financeiro.

Para além do imediatismo em si, a adoção de pagamento instantâneo ajuda a reduzir a circulação de dinheiro em espécie, formaliza a economia, eleva a bancarização, ajuda na fiscalização, reduz custos com taxas (como as de cartões) e ainda a demanda por crédito (e, portanto, o gasto com juros).

Isso explica por que bancos centrais e governos ao redor de todo o mundo estão entre os principais fomentadores dessa inovação.

"O que aconteceu nos últimos anos é que reguladores e governos tomando a dianteira", afirma Marcello Mussi, Marcello Mussi, sócio da Strategy&, braço de consultoria estratégica da PwC Brasil.

Ele calcula que cerca de 50 milhões de brasileiros não têm conta em banco ou podem ser considerados sub-bancarizados (com acesso precário a esses serviços).

Com a competição de outras instituições no mercado de pagamentos e a redução de custos, essas pessoas poderiam ser mais facilmente incluídas no sistema.

Um exemplo de catalisador da atuação do governo está nos Estados Unidos. Segundo o relatório, existe um pagamento instantâneo lá, chamado de RTP, desde 2017. E ele segue os princípios de transferência e compensação em tempo real, todos os dias. Mas o acesso à câmara de compensação (a central unificada para que as transações aconteçam) é fechado.

Durante a pandemia, o governo americano descobriu –assim como o brasileiro– que uma fatia da população era desbancarizada e precisou fazer pagamentos de auxílio emergencial por cheques enviados pelo correio.

O resultado foi uma sinalização do Fed (Federal Reserve, o banco central americano) de que ele poderia acelerar o processo de adoção do FedNow, previsto para 2023, o que seria efetivamente um irmão do Pix brasileiro.

Um dos pontos enfatizados pelo Banco Central do Brasil é a obrigatoriedade de participação de instituições financeiras grandes e a abertura para competição com outros tipos de instituições que fazem transações, como as contas digitais de grandes varejistas.

A expectativa é que isso minimize os efeitos de uma baixa adesão e dificuldade de alcance de potenciais usuários.

Oferecer o sistema como opção e não como obrigação faz com que exista baixa adesão em países como a Alemanha, onde o sistema financeiro (assim como nos Estados Unidos, guardadas as proporções dos países) é bastante pulverizado. De uma forma geral, na zona do euro a adesão é de 51% das instituições, segundo o relatório de 2019 da FIS.

Ainda assim, o Banco Central Europeu trabalha agora para fazer deslanchar o Tips, que permitiria pagamentos instantâneos entre todos os países do euro. Esse sistema também anda lentamente.

Por outro lado, a Índia é considerada um grande exemplo de sucesso. Lançou a primeira iniciativa enquadrada como pagamento instantâneo em 2011, mas atualizações colocam os serviços em um patamar mais próximo do que o BC brasileiro espera do Pix. Por lá, não é preciso conta alguma para receber o dinheiro. O número de telefone serve como identificação.

O lançamento do UPI (interface unificada de pagamentos) em 2016 padronizou QR-Codes de pagamentos e levou a essa solução instantânea de transferências e pagamentos em desenho no Brasil. Lá, as soluções são desenvolvidas por uma entidade criada pelo regulador com a associação de bancos, o equivalente da Febraban no Brasil.

Nem mesmo a discussão de custos está pacificada. Aqui no Brasil, transferências entre pessoas terão que ser de graça (lembra da TED a R$ 20 lá no começo da reportagem?), e o custo de R$ 0,10 por cada 10 transações recebidas deve reduzir tarifas cobradas em outras modalidades de pagamentos.

Mas isso só é possível quando há concorrência entre instituições –o que passa pela obrigatoriedade de adesão.

Por aqui, obrigados que são a aderir ao Pix, bancos e algumas instituições financeiras estão criando um pré-cadastramento e até campanhas publicitárias para promover o sistema. Prevalece a percepção que, na dúvida, é melhor não perder o bonde da transformação.