Rio de Janeiro

Fiscal da Saúde fica em risco após apurar fraudes sob Witzel

O governador é suspeito de receber R$ 554 mil de propina de empresários que atuam na saúde

Wilson Witzel - Tomaz Silva / Agência Brasil

 Pivô do afastamento de Wilson Witzel (PSC) do cargo de governador do Rio de Janeiro, a fiscalização das contratações na área da saúde é alvo de uma disputa interna na gestão fluminense.

O embate coloca sob risco o cargo de Leonardo Morais, servidor de carreira escalado para atuar como uma espécie de fiscal dentro da pasta da Saúde. Subsecretário de Controladoria Geral da Secretaria de Saúde, ele ampliou as sindicâncias contra as organizações sociais, aplicou multas e auxiliou investigações do Ministério Público.

Já o atual secretário da Saúde, Alex Bousquet, nomeado em junho por Witzel, tenta trocar o titular do posto hoje ocupado por Morais por um nome de fora dos quadros dos auditores concursados do estado. Os nomes extraquadros apresentados até agora, porém, não cumpriam os requisitos legais para o cargo e foram recusados pela CGE (Corregedoria Geral do Estado), que tem poder para opinar sobre a escolha.



A nomeação de Morais, auditor de carreira, ocorreu em maio após a prisão do ex-subsecretário Gabriell Neves, em meio às suspeitas nas contratações para o combate à pandemia do novo coronavírus. A escolha foi uma espécie de intervenção feita pela CGE na pasta, que já era alvo de questionamentos em razão das compras emergenciais. Além de Morais, outros auditores de carreira foram nomeados em postos chave do controle interno da pasta.

A lei não exige que os chefes do controle interno das secretarias sejam auditores concursados. Sugere apenas que se dê preferência à indicação de servidores públicos efetivos. A CGE, por sua vez, recomenda a nomeação de auditores concursados em razão de sua especialidade na fiscalização de gastos públicos.

A entrada dos auditores concursados sempre sofreu resistência do ex-secretário Edmar Santos, atual delator que embasou o afastamento de Witzel. Ele deixou o cargo uma semana após a entrada do grupo. Desde então, os servidores passaram a promover sindicâncias para identificar irregularidades nos contratos da pasta. No período houve aplicação de multas e inscrição na dívida ativa de organizações sociais.

Parte do trabalho subsidiou investigações do Ministério Público do Rio que levaram à prisão de Edmar. As investigações da Promotoria fluminense foram enviadas para a Procuradoria-Geral da República para embasar o pedido de afastamento de Witzel.

O governador é suspeito de receber R$ 554 mil de propina de empresários que atuam na saúde. Ele foi afastado por decisão do ministro Benedito Gonçalves, do STJ (Superior Tribunal de Justiça). O plenário do tribunal vai analisar na próxima quarta-feira (2) a manutenção da medida, válida por 180 dias. A primeira tentativa de Bousquet de alterar a chefia do controle interno ocorreu em junho, logo após sua nomeação para o cargo.

Ele indicou o coronel bombeiro Edson Senra Gomes para o cargo. A CGE afirmou que o candidato não tinha experiência de três anos na atividade de auditoria pública ou privada, requisito definido pela lei para chefiar uma unidade de controle interno.



Até agosto, não houve a apresentação de novo nome. A pressão voltou a ser exercida no último dia 21, quando o secretário apresentou um novo candidato à vaga –o professor de ciências contábeis José Ricardo Ozório Jardim. A CGE apontou que o candidato era sócio-administrador de uma empresa, o que é vedado aos funcionários públicos do Rio. O órgão também recomendou que fossem juntados documentos que comprovassem experiência de três anos em atividades de auditoria descrita no currículo do indicado.

Em vez de atender aos pedidos da Controladoria, expedidos na última terça (25), o secretário alterou pela segunda vez o candidato ao cargo. Enviou o nome da médica Márcia Regina da Silva Mesquita. Márcia Mesquita é médica servidora do estado, tendo atuado na função de auditora ao menos desde 2015. Foi superintendente da Auditoria SUS na gestão Edmar.
No início do mês, Morais solicitou a exoneração de Márcia Mesquita, o que ainda não foi efetivado. O subsecretário defendeu a reestruturação do controle interno da pasta, extinguindo o posto da médica.

A CGE tem até esta segunda (31) para se manifestar sobre a indicação da médica. Em nota, a Secretaria de Saúde afirmou que "caso seja realizada troca na subsecretaria de Controle Interno da pasta, o novo gestor desempenhará as mesmas funções do atual subsecretário, já que as tarefas são atribuições relativas ao cargo independentemente do servidor".

"A Secretaria de Estado de Saúde atua para que a Controladoria Geral da pasta participe de todos os processos e fluxos da SES. Além disso, a nova gestão da secretaria colabora para que o trabalho do setor tenha atuação prévia, evitando possíveis equívocos e fraudes", afirmou a pasta.

O estado declarou ainda que Márcia Mesquita "possui currículo e experiência para assumir a função, assim como atende aos pré-requisitos que constam no decreto que trata das qualificações do postulante ao cargo". A secretaria, porém, não explicou por que não sugeriu o nome de outro auditor concursado do estado, como recomendou a CGE.