política

Nunca vi atitude de Bolsonaro contra democracia, diz Toffoli

Em balanço de gestão, presidente do STF diz que diálogo com Executivo foi respeitoso e criticou Lava Jato

Dias Toffoli - José Cruz/Agência Brasil

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Dias Toffoli, afirmou nesta sexta-feira (4) não ter visto em nenhum momento alguma atitude do presidente Jair Bolsonaro ou de seus ministros contrárias ao regime democrático.

"De todo relacionamento que tive com o presidente Jair Bolsonaro e com seus ministros de Estado, nunca vi da parte deles nenhuma atitude contra a democracia. Meu diálogo com ele sempre foi direto, sempre foi franco, sempre foi respeitoso", afirmou.

"Tive um diálogo com ele intenso no sentido de manter a independência entre os Poderes e fazer ele compreender que cabe ao Supremo declarar inconstitucionais determinadas normas, porque essa é nossa função e a dele é respeitar -e ele respeitou ao fim e ao cabo", completou Toffoli.

A declaração foi dada em entrevista de balanço da sua gestão à frente do STF e do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Na próxima quinta-feira (10), Toffoli deixará o posto e dará lugar ao ministro Luiz Fux no comando do Supremo.

Em seu governo, Bolsonaro chegou a provocar tensão entre os Poderes com ataques a decisões do Supremo.
Após uma operação ordenada pela corte ter atingido empresários, políticos e ativistas bolsonaristas, o presidente chegou a dizer: "Não teremos outro dia como ontem, chega".

Bolsonaro afirmou ainda que "ordens absurdas não se cumprem" e que "temos que botar limites".

Esse e outros ataques do presidente da República já foram criticados por ministros do STF. O próprio Dias Toffoli afirmou em junho que ações de Bolsonaro e de seu governo tinham "trazido dubiedades que impressionam e assustam não só a sociedade brasileira, mas também a comunidade internacional".

Nesta sexta, Toffoli elogiou Bolsonaro pela demissão do ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, que afirmou na reunião ministerial de 22 de abril que, por ele, mandaria prender todos integrantes do Supremo.

"Não podemos deixar as nossas instituições caírem. E a nossa reação foi, não só do STF, foi do Congresso, foi de integrantes do governo, e o próprio presidente fez troca de ministros que diziam que era necessário prender ministros do Supremo. Mandou embora, demitiu", destacou.

Nesse sentido, Toffoli ressaltou a importância do inquérito das fake news. Segundo ele, há movimentos, não só Brasil, que querem ver o caos e o descrédito das instituições.

O presidente do STF também afirmou nesta sexta que a Lava Jato escolhe quem vai investigar e deixa apurações na gaveta para fazer vazamento de informações com interesse político.

O ministro disse a operação só existiu por causa do Supremo, mas ressaltou que em alguns momentos a corte toma decisões que contrariam os investigadores para proteger a Constituição e garantias individuais.

"O que não se pode ter é abuso, o que não se pode ter é escolher quem você vai investigar e deixar investigações na gaveta que deveriam sair ou então deixar investigações na gaveta para que, conforme a pessoa alce um cargo, ela seja vazada para imprensa."

Toffoli ressaltou a importância da imprensa e frisou que os jornalistas cumprem seu papel ao noticiar informações sigilosas vazadas por investigadores. Ele afirmou, no entanto, que se tratam de vazamentos com nítido "interesse político e não institucional".

"Não haveria Lava Jato se não houvesse o STF. Se houve uma ou outra decisão residual contrária, é porque entendeu-se que houve a ultrapassagem dos limites da Constituição."

Toffoli citou a "dramaticidade de ser juiz" ao falar sobre a decisão de suspender as investigações de primeira instância contra o senador José Serra (PSDB-SP). "Não são decisões fáceis, a gente sabe que vai ser criticado, mas como dizer que ali não estaria havendo um avanço no período do mandato dele?"

O ministro também classificou a abertura do inquérito das fake news, que apura uma rede de disseminação de notícias falsas e ataques a ministros do Supremo, como a decisão "mais difícil" de sua gestão.

A investigação foi criticada por ter sido instaurada sem provocação da PGR (Procuradoria-Geral da República) e porque Toffoli indicou o ministro Alexandre de Moraes como relator sem realização de sorteio, como geralmente ocorre.

Foi neste inquérito, por exemplo, que Moraes mandou tirar do ar uma reportagem da revista Crusoé que envolvia Toffoli.

"Em julgamento histórico em junho passado, o inquérito foi declarado constitucional, reafirmando a imprescindibilidade de um Judiciário forte e independente."

Após mirar aliados do presidente Jair Bolsonaro, a apuração foi criticada pela base do governo porque violaria a liberdade de expressão.

Na entrevista desta sexta-feira, porém, Toffoli afirmou que o Supremo, na sua gestão, tomou diversas decisões para preservar a liberdade de expressão da população.

Como exemplo, citou o julgamento que permitiu a livre circulação de ideias nas universidades e a revogação da decisão que permitia a apreensão de livros que tratavam do tema da homossexualidade na Bienal do Livro do Rio de Janeiro.

O ministro criticou também o fato de não ter havido desde o início da pandemia do novo coronavírus uma cooperação entre os três Poderes e os demais entes da Federação.

"Infelizmente, não sei por qual razões, essa coordenação demorou a sair. E saiu hoje. Hoje já tem uma coordenação mais efetiva, mas deveria ter saído antes", disse.