Coronavírus

Conheça as armas que o mercado lança contra o coronavírus

Desde os primeiros casos da Covid-19 no mundo, vários produtos foram criados no combate ao microrganismo causador da doença

Eficácia dos tapetes sanitizantes depende da concentração do produto aplicado - Rafael Furtado/Folha de Pernambuco

Diante de um inimigo invisível e até então desconhecido, a humanidade precisou correr contra o tempo para encontrar meios de proteção contra o novo coronavírus. Usando a criatividade, seja associada ou não a ciência e a tecnologia, pessoas de todos os continentes passaram a inventar e/ou fazer adaptações para ajudar no combate à pandemia. Pouco mais de nove meses após a confirmação dos primeiros casos de Covid-19 no mundo, não faltam exemplos de criações bem-sucedidas que se mostraram realmente eficazes no enfrentamento ao vírus.

Entre as soluções inovadoras está o primeiro saco para lixo capaz de inativar 99% do coronavírus. Produzido em laboratório, com um novo aditivo químico na composição, o produto age como um imã, que ao atrair o vírus quebra a estrutura genética, impedindo a contaminação. A solução teve a eficácia comprovada após vários testes realizados pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Além dos sacos plásticos, aventais foram produzidos com o material e distribuídos em hospitais.

Recentemente, um processo de desinfecção já utilizado em hotéis, escritórios e bancos europeus passou a ser oferecido em Pernambuco pela empresa EcoDisinfect. Chamada Fog In Place, a tecnologia garante a eliminação de vírus, fungos e bactérias, incluindo o coronavírus. Ela fragmenta uma solução desinfetante em bilhões de partículas que ficam em suspensão aérea, como um gás. As partículas atingem superfícies de difícil acesso sem necessitar de interferência humana.

Contudo, o infectologista Raphael dos Anjos é cauteloso quanto ao produto. “Apesar de ter um efeito residual bom que dura alguns dias não há muitos trabalhos científicos sobre essa tecnologia. Não temos um tempo estabelecido de algo concreto e duradouro”, disse. O médico ressalta que o mesmo cuidado devemos ter com outros objetos que ganharam popularidade, como os tapetes sanitizantes. Implantados em locais como shoppings e hotéis, no processo de reabertura, o utensílio visa desinfetar as solas dos sapatos.

A eficácia desse tipo de tapete é questionada por diversos especialistas, como o infectologista Gabriel Serrano. “Algumas pessoas acham que isso é fundamental, mas não vale muita coisa. Se você estiver conversando com alguém que tem Covid-19, o vírus vai cair em cima do sapato. Então, de que adiantaria limpar apenas a parte de baixo do calçado?”, ressalta Serrado. Além disso, é preciso ficar atento à reposição constante do produto no tapete, uma vez que a alta rotatividade faz o seu princípio ativo acabar rapidamente, perdendo a efetividade.

Os tapetes sanitizantes não são produtos registrados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Contudo, por meio de nota, o órgão informou que a solução de desinfetante ou água sanitária usada no utensílio deverão ter registro na Agência. A nota informa ainda que a eficácia das soluções aplicadas no tapete irá depender da concentração do produto no tapete “Vale reforçar que a adoção desse mecanismo não inativaria o vírus dentro do corpo humano”, acrescenta a nota.

Pesquisa do Ministério da Saúde, em parceria com a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) aponta que 91% dos infectados pelo novo coronavírus no país apresentam algum sintoma da doença e a febre está entre as três manifestações mais comuns. Para detectar possíveis transmissores da doença, cinco unidades do Expresso Cidadão passaram a conta com totens de controle que aferem a temperatura corporal, além de fazer mapeamento facial, para checar se a pessoa a ser atendida está usando máscara de proteção.

O representante comercial Marcelo Sarstedt, 45, se deparou com o equipamento quando foi a uma unidade do Expresso Cidadão para dar entrada no seguro desemprego quando. Atento às normas de prevenção ao coronavírus, como uso de máscara e álcool gel para higienizar as mãos, ele conta que achou interessante a proposta do totem. "Fiquei surpreso porque estava esperando alguém chegar com o termômetro infravermelho para aferir minha temperatura. É uma forma rápida de ver se todos estão realmente bem para estar no ambiente", comenta

Nesse mesmo contexto, visando proteger clientes e funcionários, estabelecimentos como a Ferreira Costa adotaram o sistema de câmeras térmicas. Aparelhos medem a temperatura de até 15 pessoas simultaneamente e possui uma precisão de até 0,3 graus na sua aferição. Diferente de uma medição manual, que precisa de certa aproximação, as câmeras térmicas conseguem aferir temperaturas de pessoas com até três metros de distância, reduzindo o risco de contaminação por proximidade. Também evita filas e aglomerações na entrada do local.

No começo da pandemia foi comum no mundo inteiro a utilização de estruturas, como câmaras, cabines e túneis, para desinfecção de pessoas como forma de prevenção contra o coronavírus. Nesses equipamentos eram usados vários produtos químicos, como cloreto de benzalcônio e hipoclorito de sódio, com o objetivo de "limpar" quem passasse por ele. Em Pernambuco, chegou a ser usado pela Prefeitura de Jaboatão dos Guararapes, no Mercado das Mangueiras, e por alguns clubes de futebol, como o Sport.

Contudo, posteriormente, a Anvisa divulgou nota técnica informando sobre a falta de evidências científicas que comprovem a eficácia desses aparelhos. De acordo com o órgão, a duração de 20 a 30 segundos para o procedimento não seria suficiente para garantir o processo de desinfecção. Além disso, a nota técnica alertou para possíveis danos à saúde de quem se submetesse ao processo com saneantes aplicados diretamente na pele e nas roupas. As conclusões surgiram após revisão de documentos, estudos e artigos internacionais realizada pela Agência.
 

Atenção às máscaras
Apesar de recomendadas pelas autoridades desde o início da pandemia, as máscaras passaram por várias mudanças. Desde o tipo de material na confecção às formas que são feitas. Recentemente, por exemplo, o secretário estadual de Saúde, André Longo, exibiu um modelo inclusivo com a parte que cobre a boca transparente, para facilitar a leitura labial. De acordo com a Anvisa, a máscara deve ser confeccionada com tecido confortável e nas medidas corretas para cobrir totalmente a boca e o nariz, sem deixar espaços nas laterais.

Segundo o órgão, a máscara deve adaptar-se bem ao rosto, para evitar sua recolocação toda hora. Para a confecção, são recomendados tecidos 100% algodão ou cotton. Também pode ser utilizado o "tecido não tecido" (TNT). Devem ser evitados materiais que possam irritar a pele, como tecidos sintéticos. “O grande problema está na limpeza. Essa inclusiva, por exemplo, não é filtrante. Funciona como uma barreira mecânica, como se fosse uma parede. Tem efeito, mas é preciso ficar atento à sua higienização”, disse o infectologista Raphael dos Anjos.

O chefe de triagem do setor de Infectologia do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc), Filipe Prohaska, alerta que muitas criações funcionam como barreiras adicionais no combate à contaminação cruzada de vírus e bactérias, mas não eliminam a necessidade de cuidados de higienização frequente. “Água e sabão ainda são o melhor caminho contra o vírus. Quando não tem sujeira o álcool gel a 70% também é efetivo. Não se pode esquecer do distanciamento social e do uso da máscara que são fundamentais”, comenta.

A consultora de biossegurança e controle de riscos da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Sylvia Lemos Hinrichsen, ressalta que todas as tecnologias e inovações precisam ser testadas como pesquisa e usadas de acordo com parecer da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. "Tem que avaliar o impacto delas no cotidiano da sociedade. É importante que sejam aprovadas de acordo com as especificações exigidas pela Anvisa", disse.

Capacidade adaptativa
Mas como explicar essa infinidade de invenções desde o início da pandemia? Diferentemente de outros seres vivos, que se removidos de seu ambiente natural podem até morrer, a espécie humana é capaz de se adaptar à diversas realidades e superar dificuldades. Essa é uma das razões pela quantidade de criações para enfrentar uma ameaça que surgiu repentinamente como a Covid-19. A psicóloga Miryam Azoubel explica que as pessoas são criativas de acordo com a necessidade, sobretudo em momento de crise quando há a necessidade de adaptação.

A especialista chama atenção para o conceito de resiliência, que é a capacidade de lidar com problemas e se adaptar a mudanças, superando obstáculos. Contudo, ela explica que nem todos conseguem se reinventar em uma crise ou se adaptar a uma mudança abrupta de ambiente. “Isso vai depender da personalidade de cada um”, comenta. “Além disso, vão existir muitos fatores que são influenciadores nesse processo de criação, como a estrutura psicológica do sujeito, a formação dele, a educação, o momento vivido”, enumera.

Azoubel explica que para ser criativo é importante sair da zona de conforto e buscar novas situações. “A criatividade, por ser uma característica humana, pois vem da área da cognição, é um traço de inteligência. Pessoas criativas têm um potencial alto. Normalmente elas são muito curiosas”, diz, acrescentando que a pressão favorece a criação, gerando adaptação a novas situações, sejam favoráveis ou não. “Por estas e outras, que na crise, muitos se reinventam”, afirma a psicóloga.