Negociações de paz entre o governo afegão e os talibãs prosseguem em Doha
Na cerimônia de abertura no sábado, o líder dos negociadores do governo do Afeganistão, Abdullah Abdullah, apresentou o principal pedido de Cabul: um cessar-fogo humanitário
O governo afegão e os talibãs prosseguem neste domingo em Doha com as negociações de paz, que têm resultado incerto devido às profundas divergências entre os beligerantes em um país em guerra há quase 19 anos.
Os desafios são gigantescos no "diálogo interafegão": de um possível cessar-fogo até o tipo de regime, passando pela capacidade de governar juntos.
Na cerimônia de abertura no sábado, o líder dos negociadores do governo do Afeganistão, Abdullah Abdullah, apresentou o principal pedido de Cabul: um cessar-fogo humanitário. Uma trégua que os insurgentes não mencionaram até o momento.
Os talibãs temem que a redução da violência resulte em perda de influência.
Abdullah afirmou à AFP, no entanto, que os talibãs poderiam aceitar um cessar-fogo em troca de uma nova libertação de prisioneiros.
"É possível que os talibãs estejam considerando esta opção", disse Abdullah. Cabul já libertou 5.000 insurgentes em troca de mil integrantes das forças afegãs, como parte de uma troca prevista em um acordo entre o governo dos Estados Unidos e os talibãs assinado em fevereiro em Doha.
"Um cessar-fogo poderia ser uma de suas ideias ou de seus pedidos", afirmou o diretor do Alto Conselho para a Reconciliação Nacional.
Enquanto os comitês técnicos das duas partes se preparavam para elaborar um programa de negociações, a violência voltou a afetar o Afeganistão.
Seis policiais morreram em um ataque talibã em Kunduz e cinco agentes faleceram em outro atentado na província de Kapisa, perto da capital.
Dois civis ficaram feridos na explosão de uma mina terrestre em Cabul.
Preservar as conquistas
O tipo de governo que o país adotaria também provoca divergências.
O líder dos negociadores talibãs, Abdul Ghani Baradar, recordou o desejo dos insurgentes por um "sistema islâmico", com a lei determinada por uma interpretação rigorosa do islã.
Mas o governo do presidente afegão Ashraf Ghani insiste em manter a jovem república e sua Constituição, que inclui muitos direitos, sobretudo para as minorias religiosas e as mulheres, que seriam as grandes perdedoras de um retorno das práticas vigentes durante o regime talibã (1996-2001).
Durante o período, a polícia religiosa açoitava mulheres que usavam qualquer peça diferente da burca. As acusadas de adultério eram executadas em alguns casos em estádios após a oração de sexta-feira.
Ghani pediu, em um comunicado, "uma paz duradoura e digna" que preserve "as conquistas dos últimos 19 anos".
Quatro mulheres estão entre os 21 negociadores do governo. Do lado talibã, nenhuma.
A primeira reunião foi "muito positiva", destacou Habiba Sarabi, uma das negociadoras de Cabul.
O secretário de Estado americano, Mike Pompeo, que viajou a Doha para a abertura das negociações, pediu às duas partes que aproveitem a oportunidade de fazer a paz para as futuras gerações.
Dezenove anos após a intervenção internacional liderada pelos Estados Unidos após os atentados de 11 de setembro de 2001, que expulsou os talibãs do poder, a guerra continua provocando vítimas diariamente.
A guerra também destruiu a economia do país e muitos afegãos vivem na pobreza extrema.
O confronto bélico provocou dezenas de milhares de mortes, incluindo 2.400 soldados americanos, obrigou a fuga de milhões de pessoas e custou a Washington mais de um trilhão de dólares.
Muitos afegãos temem o retorno ao poder, parcial ou total, dos talibãs, que abrigaram a rede terrorista Al-Qaeda antes de 11 de setembro de 2001.
Os talibãs, no entanto, estão em uma posição de força desde a assinatura do acordo com os Estados Unidos, que prevê a saída das tropas americanas e a celebração das negociações de paz.