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Popularidade de Bolsonaro encoraja pautas de costumes no Legislativo

Jair Bolsonaro - divulgação

Amparados pelo aumento da popularidade injetado pelo auxílio emergencial, aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) decidiram tentar emplacar, no Congresso, pautas que agradem sua base eleitoral, como flexibilização do porte de armas e educação domiciliar.

Em conversas reservadas, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), indicou que pode colocar os projetos em discussão, mas que espera que eles sofram alterações.

Embora saibam que as propostas enfrentarão resistência da oposição e mesmo de legendas de centro, articuladores políticos do Planalto avaliam que o momento é ideal para tratar das matérias.

Isso porque, além da popularidade em alta, pela primeira vez Bolsonaro tem base de apoio na Câmara, com deputados de partidos do centrão, como PP, PL e Republicanos.

"A gente quer tocar homeschooling [educação domiciliar], armas e trânsito. É uma intenção, e estou construindo, consultando os líderes da base para avançar", diz o deputado Ricardo Barros (PP-PR), nomeado líder do governo na Câmara há menos de um mês.

Em 2019, a primeira tentativa de aprovar o texto das armas foi desidratada pelo Congresso, que autorizou a ampliação do porte e posse de armas apenas por colecionadores, atiradores e caçadores.

Em um acordo com o então líder do governo na Câmara, deputado Vitor Hugo (PSL-GO), Maia se comprometeu a colocar depois em votação a proposta para ampliar porte e posse para certas categorias de servidores públicos.

Neste ano, combinaram que o assunto voltaria à pauta quando a Câmara começasse a analisar propostas sem relação direta com a questão sanitária do coronavírus. Em julho, Vitor Hugo apresentou um requerimento de urgência.

"É preciso discutir o tema para fazer avançar a tese vitoriosa nas urnas, em 2018, ,com a eleição do presidente e pelo quadro caótico de segurança pública que a gente vive."

O texto prevê que membros das Forças Armadas e das Polícias Federal, Rodoviária Federal, Civil, Militar e Legislativa, além do Corpo de Bombeiros, poderão comprar até dez armas de fogo de uso permitido ou restrito, bem como munição e outros equipamentos.

Caso comprovem necessidade e peçam autorização para o Comando do Exército, o limite poderia ser ampliado.

O projeto inclui policiais penais e guardas municipais –independentemente do tamanho da cidade– nas exceções previstas na lei e que podem portar armas no país.

O rol também contempla peritos criminais, agentes socioeducativos e de trânsito, oficiais de Justiça, agentes de fiscalização ambiental, membros da Defensoria Pública e advogados públicos federais.

Ainda que os aliados do presidente vejam espaço para retomar a articulação pelo projeto, líderes partidários e representantes da bancada evangélica, que apoia Bolsonaro, mantêm resistência. O receio, de novo, é que se amplie demais o acesso às armas.

A pandemia é apontada como outro fator que atrapalha a tramitação do projeto.

"É uma inversão absoluta da noção de prioridade fazer qualquer acordo para pautar tema relacionado a armas neste momento, quando a prioridade tem de ser cuidar da vida, da saúde e do emprego das pessoas. Terá toda minha resistência", afirma o deputado Marcelo Ramos (PL-AM).

O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), insiste que há ambiente para pautas que falem ao eleitorado bolsonarista. "Leis e projetos de atendimento direto à Covid, essa demanda que era única, vai diminuir, vai vir para pautas de recuperação econômica e outras coisas. A diminuição da discussão abre espaço para votação dessas outras pautas."

Também polêmica, a pauta de educação domiciliar não agrada a oposição, mas tem chances de avançar sob Maia.

Segundo ele disse a aliados, o ensino a distância pela pandemia evidenciou a importância do tema e que ele não se limitaria à pauta de costumes.

Já há requerimento de urgência para o projeto que regulamenta a proposta. Como no projeto das armas, a solicitação teve assinatura de líderes do centrão, como Arthur Lira (AL), do PP, e Jhonatan de Jesus (RR), do Republicanos.

A proposta a ser analisada é a do deputado Lincoln Portela (PL-MG), que já tem relatório da professora Dorinha (DEM-TO), e à qual se apensou projeto enviado pelo governo.

A proposta prevê que os sistemas de ensino admitam a opção de educação básica em casa sob a responsabilidade de pais e responsáveis, "observadas a articulação, supervisão e avaliação periódica da aprendizagem pelos órgãos próprios desses sistemas".

Uma dificuldade será a regulamentação. O relatório da professora Dorinha prevê que o aluno tenha vínculo com o sistema de ensino e integre cadastro nacional, o que entidades ligadas à causa rechaçam.

"A família optante do homeschooling deve estar monitorada para evitar abusos, estupro e a negativa do direito de estudar pelo aluno", diz Dorinha. A escola poderia fazer visitas e até mesmo suspender o homeschooling. Além disso, o aluno seria obrigado a prestar os exames nacionais.

Congressistas de oposição criticam. "Cresce o número de mães solo. Nem a mãe nem o pai está em casa para cumprir tarefas essenciais para a educação das crianças", diz Orlando Silva (PCdoB-SP).

Outra prioridade para o governo, o projeto de trânsito –que dobra para 40 pontos o limite antes de a habilitação ser suspensa– deve ser a primeira pauta defendida por Bolsonaro a de fato sair do papel.

O texto, que também aumenta de cinco para dez anos o prazo para renovação da habilitação para motoristas com menos de 50 anos, foi aprovado no Senado no dia 3.

Ao projeto da Câmara, os senadores incluíram emenda que torna infração grave levar embalagem não lacrada com teor alcoólico superior a 0,5 grau sem ser no porta-malas.

"A expectativa do governo é votar e aprovar a proposta na Câmara nesta semana e que o presidente sancione o texto ainda em setembro.