Negócios

Brasil e EUA acertam negociação de acordo comercial menor e ampliam 'passaporte empresarial'

Mais do que definir as áreas que serão cobertas pelo acordo, o governo brasileiro estaria querendo facilitar negócios com os EUA sem que isso envolva revisão de tarifas comerciais

Ministro da Economia, Paulo Guedes - Wilson Dias/Agência Brasil

Sem chance de viabilizar um acordo bilateral de livre-comércio, Brasil e EUA decidiram, nesta segunda-feira (28), dar início a negociações de um pacto comercial de menor porte que possa ser fechado ainda neste ano. As áreas a serem contempladas começaram a ser discutidas nesta segunda por presidentes de empresas e representantes de governo dos dois países que integram o Fórum de Altos Executivos Brasil-Estados Unidos (fórum de CEOs).

O encontro, realizado via internet, contou, pelo lado brasileiro, com os presidentes de Stefanini, Petrobras, Gerdau, Embraer, WEG, Minerva, Natura, Movile, Stone e Cutrale. O governo brasileiro foi representado pelo ministro Paulo Guedes (Economia), o chanceler Ernesto Araújo e ministro Walter Braga Netto (Casa Civil).

Pelos EUA, participaram Wilbur Ross, secretário de Comércio, Larry Kudlow, diretor do Conselho Econômico da Casa Branca, e o embaixador dos EUA no Brasil, Todd Chapman. O presidente da Varian Medical Systems, Dow Wilson, representou o setor privado dos EUA.



Pessoas que participaram da reunião afirmam que, mais do que definir as áreas que serão cobertas pelo acordo, o governo brasileiro quer facilitar negócios com os EUA sem que isso envolva revisão de tarifas comerciais -algo que criaria dificuldades de negociação.

Por isso, os empresários pediram mais atenção no desembaraço aduaneiro de produtos e na uniformização das regras, o que permitiria pôr fim a barreiras não tarifárias. Mesmo assim, os representantes do governo dos dois países ficaram de definir os setores que integrarão o acordo.

Guedes reforçou a necessidade de simplificações tributárias de forma a levar os dois países a um acordo de bitributação, estágio que, no futuro, poderia convergir para um pacto de livre-comércio. O fórum de CEOs ocorre duas semanas após o governo brasileiro suspender, até o fim deste ano, a cobrança do imposto de importação do etanol dos EUA desde que a comercialização não ultrapasse a cota de 187,5 milhões de litros.

Contestada por usineiros do Brasil, que se sentiram prejudicados, a medida favorece os produtores dos EUA, especialmente em estados onde Donald Trump enfrenta dificuldades para obter a liderança na intenção de votos pela reeleição.

Para os empresários do fórum, no entanto, as questões políticas foram colocadas de lado. No centro dos debates está uma agenda de interesses privados, que deve prosseguir independente do rumo das eleições nos EUA. Em um gesto de cooperação, os dois países decidiram ampliar o Global Entry, programa que facilita a entrada de "viajantes confiáveis" tanto na imigração dos EUA (para brasileiros) quanto na do Brasil (para americanos).

O programa, voltado primordialmente para empresários, teve uma fase de teste desde março do ano passado, quando Trump e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) assinaram o protocolo de intenções desta parceria.

Até o momento, cerca de 20 empresários brasileiros tinham o "passaporte empresarial", como eles batizaram o Global Entry. Na reunião desta segunda ficou acertado que cerca de 200 executivos poderão ser incluídos. Segundo relatos, Guedes defendeu as reformas de Estado e o rigor fiscal. O chefe da Economia enfatizou os avanços da reforma tributária, falou das mudanças nas carreiras de servidores públicos como forma de reduzir despesas, e pediu atenção dos investidores para o PPI (Programa de Parceria de Investimentos).

O programa, que atrai investimentos privados para concessões públicas, está estimulando a criação de novas fontes de financiamento, como as debêntures (títulos de dívidas emitidas pelas concessionárias). Guedes reforçou que o Brasil conduz o maior programa de concessões do mundo e que, mesmo diante da crise, esses serviços (como água, esgoto, rodovias, ferrovias, dentre outros) geram receita garantida.

O ministro tentou mostrar para os executivos que, mesmo diante da pandemia, o país segue com o compromisso de abertura à iniciativa privada, redução do endividamento e de preservação das condições de juros e inflação baixos.
Guedes fez isso no mesmo dia em que governo anunciou o Renda Cidadã, programa de Bolsonaro que deve substituir o Bolsa Família.

Segundo assessores do ministro, o benefício médio no novo programa está em R$ 300, uma meta dada pelo presidente Bolsonaro. Hoje, R$ 300 é o valor do auxílio emergencial, até dezembro. Antes o benefício era de R$ 600. Para viabilizá-lo, foram propostos o uso de parte de recursos do Fundeb, o bilionário fundo que financia a educação básica no país, e o adiamento do pagamento de dívidas já discutidas na Justiça (precatórios).

O mercado reagiu mal porque viu na medida uma manobra para furar o teto de gastos, regra que corrige o valor das despesas pela inflação do ano anterior. Guedes se apega ao teto como tábua de salvação no mercado porque, atualmente, é a única meta fiscal em vigor. Sem ela, a sinalização ao mercado é de descontrole e de uma política voltada aos gastos em vez da redução do endividamento.

Para as empresas dos EUA, no entanto, esse cenário -no momento– preocupa pouco. Estão mais interessadas em buscar parcerias e conseguir novos clientes no Brasil. O fórum de CEOs Brasil-Estados Unidos foi criado em 2007. O grupo só voltou a se reunir em 2019, já sob o governo Bolsonaro, depois de quatro anos sem que houvesse reunião.
Antes, era formada por 20 empresários de cada país, além de representantes dos governos.

Sob Bolsonaro, passou para 10 integrantes em cada ponta. Seu papel é formular e apresentar aos governos recomendações conjuntas para o incremento do comércio e dos investimentos bilaterais.