Conheça os alimentos considerados patrimônio histórico
Bolo de rolo e bolo Souza Leão estão na lista dos itens com modo de produção preservada
A forma de preparar determinada receita pode até ser diferente de um lugar para o outro. Mas os saberes e rituais praticados em volta dela, desde os primórdios, nunca mudam. Nesse ponto está o chamado ‘trabalho de salvaguarda’, organizado pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), na garantia da preservação de processos culinários. Estes são únicos e enraizados no seu local de origem. Não cedem a pressões da modernidade ou a leis de comércio, mas fazem o mercado lembrar que o sabor especial de uma comida tem um sentido.
Razão para o chamado Livro de Registro dos Saberes relacionar bens imateriais que repassam conhecimentos e modos de fazer inseridos no cotidiano das comunidades. Essas informações são conhecimentos tradicionais associados a atividades desenvolvidas por entendedores das técnicas ou o uso de matérias-primas que identifiquem um grupo social ou uma localidade. Não à toa, por mais que o bolo de rolo seja uma receita possível de ser executada em outras regiões do País, é em Pernambuco que ele tem sua identidade preservada.
Em Minas, o queijo
A maior prova de que processo é algo importante está numa típica iguaria mineira. O pão de queijo em si não é Patrimônio Imaterial pelo Iphan. E sim os seus padrões de preparo artesanal. Leia-se o uso do queijo minas curado ralado, com a possibilidade de vir da região da Serra da Canastra, que é registrado como Patrimônio Cultural e Imaterial Brasileiro. “Mas quando se fala de pão de queijo, sua grande importância é ele ser referência imediata de um lugar e trazer nele uma memória afetiva, assim como a tapioca remete ao litoral do Nordeste e o tacacá à região amazônica”, comenta o antropólogo e pesquisador Raul Lody, ao reforçar a ideia da denominação de origem, que agrega valor a uma determinada região.
Ainda em Minas Gerais, o modo de fazer queijo artesanal da região do Serro foi o primeiro bem registrado naquele Estado, ainda em agosto de 2002. O jeito de preparar, que inclui o cuidado com a vaca e a forma de extração do leite, chegou à região pelas trilhas do ouro, na bagagem dos colonizadores portugueses, e se constituiu desde então, sem perder o caráter simbólico para as terras de lá.
Em PE, o bolo de rolo
Na sua coluna Folha Gastronômica, a pesquisadora Lecticia Cavalcanti garantiu que “o bolo de rolo é uma das mais generosas tradições de Pernambuco. E merece reverência. Por isso é preciso cuidado com afirmações apressadas sugerindo que sua receita deriva do rocambole”. Dessa noção vem a garantia de que a receita deve seguir critérios, como os que estão registrados desde 2007, através da Lei Ordinária nº. 379. O preparo é um só. Tem massa fininha feita com farinha de trigo, ovos, manteiga e açúcar. Ela é enrolada com uma camada de goiabada derretida. Ainda no País Pernambuco, outro bolo tem seu lugar ao sol no livro de Registro dos Saberes, desde 2007. O Souza Leão leva massa de mandioca, leite de coco e, pelo menos, dez gemas.
Na Bahia, o acarajé
Aqui, o reconhecimento está ligado ao ritual culinário das baianas do acarajé. Este foi, ao lado do ofício das “paneleiras” de Goiabeiras e do samba-de-roda do Recôncavo Baiano, um dos primeiros bens culturais de natureza imaterial tombados no país pelo Iphan. As origens do prato, as tradições que seu fazer guardam, a oralidade ancestral na transmissão da receita, o ritual para servir e até de degustar, fazem parte da forma de apreciar o acarajé.
No Piauí, a cajuína
A origem no preparo da cajuína está nas comunidades indígenas. O caju, como fruta brasileira, pode ser encontrado em vários territórios no País. Mas o saber considerado patrimônio está circunscrito ao estado do Piauí, ligado à identidade das famílias piauienses, desde 2014. Isso leva em conta a produção do caju, a sua forma de colheita e, finalmente, a produção da bebida feita com o suco da fruta separado do seu tanino , coado várias vezes e então cozido em banho-maria em garrafas de vidro.
No Sul, D.O. e I.P.
Um produto com Denominação de Origem (D.O.) não é o mesmo que aquele tombado pelo Iphan. No primeiro caso, é como ter a certeza de que um presunto italiano veio mesmo de Parma ou o Champanhe da mesma região que o denomina na França. “Os produtores se organizam em associações que fazem esse pedido e passam a ser também o órgão gestor da Indicação Geográfica. A partir de então, eles seguem um regulamento de uso que estabelece os requisitos para esse produtor ganhar o selo e atestar a qualidade dos seus produtos”, explica o pesquisador da Embrapa Uva e Vinho, Jorge Tonietto, ao falar da classificação para Indicação de Procedência (I.P.) e Denominação de Origem (D.O.). Independentes, a primeira reúne exigências mais flexíveis. Já ao segundo, a área geográfica precisa ser mais bem delimitada e envolver tradições e estruturações ainda mais técnicas.
O Brasil tem, por enquanto, seis regiões vinícolas com Indicação Geográfica. Cinco delas com I.P. Sendo uma em Santa Catarina: Vales da Uva Goethe; e as outras quatro no Rio Grande do Sul: Altos Montes, Monte Belo, Pinto Bandeira e Farroupilha. Ainda na Serra Gaúcha, o Vale dos Vinhedos trabalha a D.O. Em outras regiões, há o