Exterior

Brasil apoia na OEA proposta que autoriza a pais impor educação religiosa ou moral a filhos

Segundo organizações da sociedade civil, o texto abre a porta para que pais adotem o ensino domiciliar e impeçam que crianças aprendam conteúdos como a teoria da evolução

A ideia é incluir um adendo a uma resolução do órgão sobre direitos humanos - Reprodução/TV Brasil.

Com apoio de Brasil, Chile e Estados Unidos, a Bolívia apresentou na OEA (Organização dos Estados Americanos) uma proposta que autorizaria a pais impor educação religiosa ou moral a seus filhos. A ideia é incluir um adendo a uma resolução do órgão sobre direitos humanos.

O texto proposto à resolução, discutida nesta terça (20) na Assembleia Geral da OEA, sugere "o direito ou a liberdade dos pais de que seus filhos recebam educação moral e religiosa de acordo com suas crenças". Segundo organizações da sociedade civil, o texto abre a porta para que pais adotem o ensino domiciliar e impeçam que crianças aprendam conteúdos como a teoria da evolução. A proposta também permitiria que pais interfiram na contratação de professores a partir de suas crenças religiosas.

Sob críticas das delegações de Argentina, México, Canadá, Peru e Costa Rica, a linguagem do texto foi amenizada, ressalvando que o interesse maior das crianças em relação ao ensino tem de ser respeitado. Mas o trecho sobre educação moral de acordo com as crenças dos pais ainda foi mantido no texto em discussão. A Assembleia Geral termina nesta quarta-feira (21).



"A proposta da Bolívia é bastante preocupante, principalmente por incluir educação moral, o que extrapola o [ensino] religioso e vira um Cavalo de Troia, já que abre uma ampla margem interpretativa para outras questões", diz Camila Asano, diretora de programas da ONG Conectas Direitos Humanos. Procurado diversas vezes pela reportagem, o Itamaraty não respondeu aos pedidos de comentários.

O apoio de Brasil e EUA à proposta se insere no contexto da Aliança Internacional para Liberdade Religiosa, lançada no ano passado. A iniciativa visa defender todas as religiões, mas o tema foi abraçado especialmente por evangélicos e católicos mais atuantes.

O posicionamento na OEA também remete ao combate à "cristofobia" assinalada por Jair Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU, em setembro. Em seu discurso, o presidente brasileiro fez "apelo a toda a comunidade internacional pela liberdade religiosa e pelo combate à cristofobia" e afirmou que o Brasil é um "país cristão e conservador, que tem na família sua base", embora a Constituição estabeleça o laicismo do Estado brasileiro.

A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, compartilhou nesta terça, no Twitter, postagem de um ativista argentino contra o aborto que pedia à OEA que introduzisse "a perspectiva da família no desenvolvimento das normas legais".

Na mensagem, uma das muitas da campanha com as hashtags #OEAproVida e #AMisHijoslosEducoYo, o ativista "exige respeito ao direito inalienável dos pais de família de escolher a educação que seus filhos recebem, porque isso não é uma prerrogativa do Estado, e sim de cada mãe e pai de família".

Em outra postagem da campanha #OEAProVida, ativistas afirmam que a "Covid-19 demonstrou que a família é muito mais necessária e eficaz que o Estado". "A família funcionou como escola, hospital e apoio econômico. Lares estáveis, com pai e mãe presentes, deram mais bem-estar a todos os seus membros."

No caso do Chile, o interesse pela resolução se justifica porque o texto garantiria autonomia para escolas religiosas escolherem seus professores. O governo do país foi denunciado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) no ano passado por demitir uma freira que era professora de religião em uma escola municipal, após ela revelar que é lésbica.