Perfil

Jaildo Marinho: um elo entre Paris e o Sertão de Pernambuco

Artista plástico pernambucano, natural de Santa Maria da Boa Vista, vive na França e tem obras espalhadas pelo mundo

O escultor Jaildo Marinho completou 50 anos recentemente - Divulgação

Existe um elo entre as cidades de Santa Maria da Boa Vista, no Sertão de Pernambuco, e Paris. Essa ligação tem nome e sobrenome: Jaildo Marinho. O artista plástico boavistano, que recentemente completou 50 anos de idade, vive e trabalha na Capital francesa desde 1993. O tempo e a distância, no entanto, não fizeram o escultor perder de vista sua terra natal e as marcas desta origem em sua obra.

“O meu trabalho sempre ficou enraizado em Pernambuco. Uma das maiores influências foi ver, na infância, a minha avó organizar as festas de reisado junto com a minha mãe. Observar aquela dança, aquele colorido, não tinha outra consequência a não ser ficar impressionado e se apaixonar por todas as cores, desenhos e ritmos”, relembra o artista, que concedeu entrevista à Folha de Pernambuco, no dia do seu aniversário, celebrado ontem.

Foi também na infância que Jaildo deu os primeiros passos como artista. Ainda criança, se encantou com a modelagem do barro durante as atividades escolares. Sem acesso a muitas fontes de informação, foi aprendendo tudo de forma autodidata, até se mudar para o Recife e começar a estudar escultura na Universidade Federal de Pernambuco, em 1991. “Na UFPE, eu tive um professor em especial, João Batista Queiroz, que me colocou debaixo do braço e me ensinou muita coisa”, conta.

Com as primeiras exposições e o começo de uma carreira profissional para Jaildo, logo veio a oportunidade de fixar residência na França, o que ele não deixou escapar. “Paris não é só a capital mundial da arte, mas também da crítica de arte. Essa visibilidade me atraiu. Fora que, no início dos anos 1990, era muito mais fácil para um artista nordestino se instalar na Europa do que no Sudeste do Brasil, por exemplo”, afirma.

Morando na Cidade Luz, Jaildo pôde conviver com artistas de renome. Um deles foi o também pernambucano Cícero Dias, que já vivia por lá desde os anos 1930. O encontro com o uruguaio Carmelo Arden Quin, fundador do movimento Madi, trouxe novos elementos e contornos para a sua arte. “Costumo dizer que Paris me moldou como artista, me dando a oportunidade de aprimorar aquilo que eu já fazia no Brasil”, afirma.

Reconhecimento 

A partir da França, a arte de Jaildo começou a se espalhar pelo mundo. Suas peças já foram vistas em exposições de vários países europeus, no Japão e nos Estados Unidos, e integram coleções em boa parte da América Latina. Elas também estão em locais públicos parisienses, como os jardins da Biblioteca Histórica de Paris e do Grand Palais Royal.

O artista só lamenta, no entanto, que em seu local de origem as chances de compartilhar seu trabalho tenham sido poucas. Sua última mostra individual por aqui foi em 2002, no Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco, em Olinda, organizada por Paulo Bruscky.

Obra de Jaildo em Paris (Foto: Divulgação)

“Quero muito voltar a expor na minha terra. Em 2017, fiz uma exposição no Rio de Janeiro, chamada ‘Cristalização’. A ideia era passar pelo Brasil inteiro, mas tive dificuldades de conseguir levar para o Recife. Aos poucos venho retomando os contatos”, explica. Uma peça do pernambucano, esculpida em mármore carrara, está instalada na Usina Santa Terezinha, em Água Preta, onde o colecionador Ricardo Pessoa de Queiroz desenvolve o projeto Usina de Arte.

Em texto dedicado ao artista, Mario Hélio Gomes, diretor de Memória, Educação, Cultura e Arte da Fundação Joaquim Nabuco, destaca a necessidade de que a obra de Jaildo seja compartilhada em seu próprio berço. "Alguém que dedicou mais da metade da vida à arte, e consegue destaque na que ainda é uma das maiores capitais da estética em todas as épocas, merece mais do que parabéns no seu dia de aniversário: uma grande exposição em seu estado natal", escreve.

O trabalho desenvolvido por Jaildo ao longo das últimas três décadas assume um caráter abstrato, ao mesmo tempo em que abraça formas geométricas muito bem delineadas. No conceito de tudo o que ele cria há a presença de Santa Maria da Boa Vista. “Fico feliz por ter saído de Pernambuco para mostrar o que eu vivi na minha infância. Como venho de um lugar onde não existia nada culturalmente, resolvi enquadrar o vazio, o nada do meu Sertão. A partir do enquadramento desse vazio, passei a dar vida a ele, colorindo e buscando novas formas. Foi esse trabalho que me deu a possibilidade de abrir as portas para o mundo”, comenta.