Brasil pode ficar impedido de refinanciar dívida se não fizer reformas, diz governo
A pasta argumenta que o cenário de desequilíbrio, com arcabouços institucional e econômico inalterados, afastaria investidores
O Brasil pode ficar impossibilitado de refinanciar a dívida pública nos próximos anos caso não execute reformas que promovam o ajuste fiscal, afirmou o governo em documento publicado nesta terça-feira (27). As afirmações foram feitas no texto da Estratégia Federal de Desenvolvimento para o Brasil no período de 2020 a 2031, publicado em forma de decreto no DOU (Diário Oficial da União).
No documento, o governo prevê o comportamento de diferentes indicadores como PIB (Produto Interno Bruto), PIB per capita e IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) considerando três diferentes cenários (de desequilíbrio fiscal, de reformas e de reformas com avanço na escolaridade).
A pasta argumenta que o cenário de desequilíbrio, com arcabouços institucional e econômico inalterados, afastaria investidores e elevaria os juros devido a uma crise de confiança na saúde fiscal do país. A situação geraria em seguida uma necessidade significativa de corte de despesas discricionárias (não-obrigatórias), o que comprometeria a evolução do PIB per capita, e aumento de impostos.
"Isso [ausência de reformas] poderia manter as contas públicas em uma trajetória explosiva, aumentando a desconfiança dos investidores em relação à sustentabilidade da dívida pública, elevando os prêmios de risco requeridos e desencadeando, em algum momento ao longo dos próximos anos, uma crise de confiança que poderia impossibilitar o refinanciamento da dívida", afirma o texto.
A situação da dívida pública já chama atenção dos investidores. Após a chegada da pandemia do coronavírus, o endividamento público do país deve sair de 75% do PIB registrado no ano passado para quase 100% ao fim deste ano.
O custo com a dívida só não é maior devido à queda dos juros, mas investidores têm cobrado taxas mais caras no longo prazo frente a temores sobre a capacidade de o país honrar seus compromissos. O Tesouro evita títulos mais longos para não encarecer seus custos, mas a estratégia tem queimado suas reservas. Se até o ano passado o chamado colchão da dívida tinha capacidade para enfrentar mais de 6 meses de vencimentos de papéis, agora esse patamar está pouco acima da metade.
Isso significa que, em uma situação extrema em que não haja mais interessados em comprar títulos públicos brasileiros, a União tem um fôlego pouco superior a três meses para pagar dívidas já contratadas. "Nesse ambiente de deterioração fiscal, a alta do prêmio de risco implicaria uma maior taxa real de juros, a necessidade de significativo esforço para conter as despesas discricionárias, com aumento significativo da já elevada carga tributária", prossegue o texto do governo.
O governo afirma que o PIB per capita teria crescimento nulo ou até mesmo variação negativa no acumulado do período até 2031. O número poderia subir dependendo de diferentes hipóteses como as medidas de consolidação fiscal, mas mesmo assim a taxas inferiores.
"O quadro indica com bastante clareza o elevado custo social de não executar medidas que garantam o equilíbrio fiscal estrutural", afirma o governo.
Já no cenário com reformas fiscais, diz o governo, o PIB per capita poderia avançar 19,1% no acumulado de 2021 a 2031. No cenário de reformas com avanço da escolaridade (com avanço do capital humano e da taxa de participação da população em idade ativa), o percentual subiria a 37,2%.
Nesse último caso, o PIB per capita em 2031 seria superior ao verificado atualmente em países como Argentina, Polônia e Croácia, e se aproximaria do patamar atual do Chile e da Hungria. Esses países têm IDH acima de 0,8, o que os coloca no grupo de países com nível muito alto de desenvolvimento humano.
O documento tem como diretriz também elevar o IDH brasileiro de 0,761, observado em 2018, para ao menos 0,808 em 2031 no cenário com reformas. O indicador poderia chegar a 0,842 no cenário com avanços na escolaridade, segundo o governo.
O texto foi publicado com as assinaturas do presidente Jair Bolsonaro e dos ministros Paulo Guedes (Economia) e Wagner Rosário (Controladoria-Geral da União). De acordo com o Ministério da Economia, o documento permite um planejamento orientado à retomada econômica que já considera o pós-Covid. Segundo a pasta, o texto também possibilita a comparação dos resultados obtidos com outros países, uma das premissas para a ascensão à OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).