Após morte de George Floyd, capas de revistas com negros disparam
Segundo o levantamento, todas as 126 capas com negros, neste ano, os apresentaram "de uma forma positiva e edificante"
Nos EUA, as capas de revista já trouxeram mais negros em 2020 do que em todos os 90 anos anteriores, somados. O dado foi levantado pelo Centro de Inovação de Revistas, da escola de jornalismo da Universidade do Mississippi.
O evento que deflagrou a transformação foi a morte de George Floyd pela polícia de Minneapolis, em 25 de maio. Segundo o levantamento, todas as 126 capas com negros, neste ano, os apresentaram "de uma forma positiva e edificante".
"Isso já estava se formando, mas, depois da morte, irrompeu", diz Samir Husni, diretor do centro. "Nós acompanhamos nos últimos dois, três anos alguns sinais de esperança, mas a explosão veio no verão de 2020, como nunca tínhamos visto."
A grande questão, avalia ele, é se isso vai se tornar um novo padrão. Se daqui a um ano o quadro estará pelo menos semelhante ao que se percebe agora -ou não terá passado de "um bip no radar", isolado e sem efeito prático.
Na continuação do estudo, Shona Pinnock, diretora de Diversidade e Inclusão da Meredith Corporation, de títulos como People, diz que 2020 é só o começo. Que agora entra a fase de contratar e manter pessoas e de transformar o conteúdo.
Outra grande editora, Condé Nast, vem se mostrando a mais agressiva na mudança, segundo Husni, após a editora-chefe da Vogue, Anna Wintour, ter se desculpado publicamente em junho pelo histórico "doloroso e intolerante" da revista.
A Vogue trouxe negros na capa em quatro edições seguidas, de agosto a novembro, enquanto a GQ, outro título da Condé Nast, o fez em três edições seguidas. Mas continua a pressão contra Wintour, diretora artística de toda a editora.
Husni cita conversas com executivos do setor, para justificar sua esperança. "Durante muito tempo, eu ouvi: 'Toda vez que colocamos uma pessoa negra na capa, as vendas caem'. E agora eles me dizem: 'Isso é história antiga, não é mais a realidade'."
Bianca Santana, doutora em ciência da informação pela ECA-USP e conselheira do Instituto Marielle Franco, se surpreendeu com os números e comentou que já existe algum movimento também no Brasil, "mas não nessa intensidade, nessa proporção".
"Por mais que dê para ver uma mudança, é ainda tímida frente a esse levantamento dos EUA", diz ela. "Mesmo depois de tanta denúncia de racismo, tão evidente em todas as estruturas, é algo lento e feito com cautela. Vai levar muitos e muitos anos."