Teto de gastos

Estados querem aval do Congresso para excluir saúde e educação do teto

O prazo para o governo enviar pedidos de créditos extra acabou na quinta-feira passada - Roque de Sá / Agência Senado

Estados que furaram o teto de gastos em 2018 e 2019 querem uma espécie de perdão do governo federal para esse descumprimento. Governadores buscam aval do Congresso para aderir à regra apenas em 2021, 2022 e 2023, com autorização para excluir despesas com saúde e educação desse limite.

O teto de gastos é uma regra que restringe o crescimento das despesas à inflação do ano anterior.

Governadores também pressionam para que o governo repasse R$ 4 bilhões ainda neste ano para estados e municípios como parte de um acordo para repor perdas geradas pela Lei Kandir, que isentou as exportações de cobrança do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).

Tanto a alteração na regra do teto, quanto o repasse de recursos dependem de aprovação de projetos pelo Congresso.

Em 2016, o Congresso aprovou uma lei que promoveu uma renegociação de dívidas estaduais com a União. Foram autorizados uma redução temporária do valor das parcelas e o alongamento do prazo de quitação.

Em contrapartida, 20 estados aceitaram adotar o teto de gastos. O objetivo era barrar do crescimento das despesas correntes, relacionadas ao funcionamento da máquina pública, como pessoal, água, energia e materiais.
 

O teto para os estados passou a vigorar, com validade de dois anos. Gastos correntes de saúde e educação também ficaram nesse limite. Investimentos ficaram fora da conta.

A regra não é igual à do governo federal. Para a União, uma emenda constitucional limitou por dez anos, renováveis por mais dez, o crescimento das despesas primárias à variação da inflação. Saúde, educação e investimentos entram na conta.

Ficam fora do teto da União transferências a estados e municípios, créditos extraordinários em situações de emergência e capitalização de estatais. No âmbito federal, também há pressão para que o teto seja flexibilizado.

Em 2018 e 2019, a regra para os estados foi descumprida por 11 deles: Acre, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Sergipe.

Se isso ocorresse, pela negociação acertada, o alongamento das dívidas seria anulado e os estados teriam que ressarcir o governo dos valores que deveriam ter sido pagos se não tivesse havido acordo.

A cláusula gera forte impacto nas contas, em momento de crise fiscal provocada pela pandemia. Os estados terão que voltar a pagar as parcelas ordinárias, mais esse tipo de multa por descumprirem a regra.

Esses valores voltariam a ser pagos em 2020, mas o estado de calamidade pública e o socorro a estados aprovados durante a pandemia suspenderam essas cobranças até dezembro deste ano.

A partir de 1º de janeiro, eles seriam penalizados com retenção do Fundo de Participação dos Estados.

Os entes com os maiores débitos são Rio Grande do Sul (R$ 24,3 bilhões), Rio de Janeiro (R$ 13,5 bilhões), Santa Catarina (R$ 2,5 bilhões) e Goiás (R$ 1 bilhão).

Para evitar perder os recursos, governadores e representantes dos 11 estados foram nesta terça-feira (3) a Brasília falar com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Também estiveram com os secretários do Tesouro, Bruno Funchal, e com o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues.

A Maia e Alcolumbre, eles pressionaram pela votação do Novo Plano Mansueto, projeto de lei complementar do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ). A demanda é por aprovar o texto até 31 de dezembro, para que o descumprimento da regra no passado seja regularizado e o
teto valha por mais três anos, disse o secretário da Fazenda do Mato Grosso, Rogério Gallo.

"No caso do Mato Grosso, seriam R$ 600 milhões já a partir de 1º de janeiro. Para os demais estados são [valores] bilionários", afirmou.
De acordo com Gallo, a proposta também busca excluir do teto apenas a parcela de gastos em saúde e educação que exceder a variação da inflação. "O que exceder a variação da inflação e aquilo que tiver aumentado da receita dos estados não será considerado."

Com isso, os governadores conseguiriam cumprir o piso constitucional de 12% de gastos em saúde e de 25% com educação.

"Você arrecadava acima da inflação, tinha que gastar, mas não podia pelo teto de gastos", explicou Gallo. "Ele cumpriria a saúde e educação e iria sacrificar áreas fundamentais, como assistência social, segurança pública e outras áreas."

Ele disse que a exclusão é importante também no contexto do pós-pandemia, que represou cirurgias em hospitais e atendimento.
O objetivo, disse o deputado Pedro Paulo, é votar o texto na Câmara em 17 de novembro, logo após o primeiro turno das eleições municipais. No Senado, a intenção é que a votação ocorra no dia 19.

O novo Plano Mansueto deve conter medidas de reforço da lei de responsabilidade fiscal. Uma delas é a unificação da classificação de despesa de pessoal. Cada poder terá que contabilizar sua despesa de pessoal de ativos e inativos.

"Você acaba com algumas contabilizações que existem em outros poderes, de comissionados não estarem em despesa de pessoal", disse. Os estados terão dez anos para se ajustar à regra, segundo o deputado.

A segunda medida é determinar que os estados tenham caixa para cobrir todas as despesas contraídas nos dois últimos anos de governo. Atualmente, a regra diz que isso só precisa acontecer no último ano de mandato do governante.

"Isso é talvez uma das principais medidas para frear esse endividamento crescente. Porque o cara fica apertado e começa a dar calote nos fornecedores para poder pagar a folha, e vai acumulando um passivo enorme."

Os estados também negociam para tentar incluir no rol de suspensões até 2023 as dívidas com organismos multilaterais. "A União bancaria e esse volume contabilizaria no saldo devedor. Não é cancelar. Então, esse é um ponto que imagino que o governo tenha algum tipo de resistência", afirmou o deputado.

O Plano Mansueto original foi desidratado após a votação do socorro a estados e municípios para ajudar na recuperação da arrecadação de impostos por causa da pandemia do novo coronavírus.