Coronavírus

Brasil está em posição privilegiada para ter vacina, mas liberação deve ser gradual, diz Fiocruz

A previsão da instituição é produzir 210 milhões de doses até o fim de 2021

Vacina da Oxford - Vicenzo Pinto/AFP

Na corrida mundial por vacinas contra a Covid-19, o Brasil tem a possibilidade de estar no grupo dos primeiros países que imunizarão suas populações, mas a liberação de doses não deve ser imediata para todos, afirmou nesta quarta-feira (4) o vice-presidente de inovação da Fiocruz, Marco Krieger.

A previsão da instituição, que mantém um acordo de transferência de tecnologia de uma vacina em desenvolvimento pela farmacêutica AstraZeneca e Universidade de Oxford (Reino Unido), é produzir 210 milhões de doses até o fim de 2021.

Tanto a oferta quanto a previsão de alcance dessas doses na população, porém, ainda dependem da conclusão e dos resultados dos testes clínicos –até o momento, dados preliminares apontam uma melhor resposta com aplicação de duas doses dessa vacina.

De acordo com a Fiocruz, caso os dados de eficácia sejam confirmados, a ideia é que a produção ocorra em duas etapas. Na primeira, a meta é produzir 100,4 milhões de doses entre janeiro e julho do próximo ano, e 30 milhões até fevereiro, a partir de insumos enviados pela AstraZeneca.

Uma segunda etapa prevê fabricar 110 milhões de doses a partir de agosto, quando toda a produção deve ser nacional. A liberação das doses, no entanto, ainda seria gradual.

"Temos uma expectativa muito boa de ter um grande número de doses durante o ano de 2021, mas não é imediata essa liberação das doses", diz Krieger. "Vamos ter ainda que fazer o uso de outras medidas de enfrentamento da pandemia, mas com o reforço importante da introdução da vacina, que vai ser feita de uma forma que permita que a gente proteja inicialmente populações mais vulneráveis e pessoas com mais risco de ter formas graves da doença."

Para ele, o Brasil está em "posição privilegiada" na busca por vacinas contra a Covid-19. "Poucos países do mundo vão ter a possibilidade de fazer [a imunização] de forma tão rápida. A própria OMS [Organização Mundial de Saúde] diz que em muito dos países isso vai ocorrer só de 2022 até 2024", afirma.

As declarações e a previsão de prazos ocorreram em uma oficina ministrada pela instituição a jornalistas nesta quarta-feira (4).

Segundo a vice-diretora de qualidade de Bio-Manguinhos, Rosana Cuber, a previsão da Fiocruz é submeter um pedido formal de registro da vacina em janeiro à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) quando tiver os dado de eficácia em mãos. Com esse aval, a ideia é iniciar a aplicação das doses até março do próximo ano.

O cronograma final e o público-alvo, no entanto, devem ser definidos pelo Ministério da Saúde. E alguns fatores ainda podem influenciar nesses prazos.

Entram nessa lista possíveis atrasos na conclusão dos estudos clínicos, a necessidade de uso de diversos insumos importados, o que pode esbarrar em problemas de logística, e a consolidação da transferência de tecnologia, considerada um processo complexo.

"Temos datas planejadas, mas nunca sabemos se vai atrasar mais um pouquinho", afirma o diretor de Biomanguinhos, Maurício Zuma. "Há uma impossibilidade de prever com precisão. Estamos tentando acelerar o máximo possível. Começaríamos a produzir em janeiro, ainda antes do registro, para termos 30 milhões de doses até fevereiro e disponibilizadas assim que tiver o registro", diz.

Segundo ele, para conseguir cumprir o previsto para a segunda etapa, que prevê produção própria de 110 milhões de doses, o laboratório de Biomanguinhos passa por adaptações e aquisições de equipamentos.

O valor do acordo que prevê as 100,4 milhões de doses iniciais é de R$ 1,9 bilhão. A Fiocruz também deve contar com R$ 100 milhões de doadores privados para investimentos no laboratório de Biomanguinhos.

Segundo Krieger, a escolha por um acordo de transferência de tecnologia da vacina considerou, entre outros fatores, o fato de essa imunização ter o maior número de voluntários em testes clínicos e bons resultados em testes iniciais.

O estudo clínico foi iniciado em abril. Até o momento, estudos mostram boa resposta com uma dose e uma resposta maior com duas doses, afirma Krieger. Os testes, porém, ainda não foram finalizados.

"Mas alguns resultados já começam a surgir, com uma resposta muito forte em idosos. A resposta nessa população é muito difícil de ser obtida, e isso traz uma esperança de que essa vacina vá auxiliar no enfrentamento da epidemia", afirma.

Outro ponto que levou à decisão foi o tipo de tecnologia usada na produção da vacina, que usa uma plataforma vetor viral não replicante derivada de um adenovírus. "Essa vacina faz não só a produção de anticorpos mas também estimula a produção de células que destroem o vírus Sars-CoV-2", explica Cuber.

Embora a chamada vacina de Oxford seja considerada a principal aposta, a instituição também já realiza parcerias para estudos de outras potenciais vacinas. Os testes, porém, ainda estão em fase pré-clínica, ou seja, com estudos em animais. "Estaríamos falando em iniciativas para 2023", diz Krieger.