Coronavac

Anvisa diz que decisão de suspender testes foi técnica e ocorreu por informações incompletas

Diretores dizem que agência não é parceira de desenvolvedores e que mantém decisão

O diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres - Leopoldo Silva/Agência Senado

O diretor-presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Antonio Barra Torres, disse, nesta terça-feira (10), que a decisão de suspender os testes da vacina Coronavac foi técnica e ocorreu após a agência receber informações incompletas do Instituto Butantan, que deixaram dúvidas sobre o caso.

Segundo representantes da agência, o estudo continuará suspenso até que todos os dados sejam avaliados.
"Ainda mantemos a suspensão porque não temos evidências e dados que tragam confiança que o estudo pode continuar", afirmou o gerente-geral de medicamentos, Gustavo Mendes.

A paralisação dos testes foi anunciada pela agência na noite de segunda (9). Segundo a Anvisa, a decisão ocorreu devido ao registro de um evento adverso grave. Detalhes da ocorrência não foram informados devido a protocolos de sigilo.

A agência justificou a medida devido à necessidade de analisar os dados e avaliar o risco/benefício do caso.

Nesta terça, autoridades de saúde do governo de São Paulo afirmaram que é impossível que o evento tenha relação com a vacina.

Conforme a Folha divulgou, a principal suspeita dos investigadores é a de que a pessoa, um químico de 32 anos, tenha cometido suicídio ou tido uma overdose -o que demonstra que o caso não teria nenhuma ligação com a vacina.

Questionado, Barra Torres nega que a agência tenha sido informada sobre a causa da morte até esta segunda (9), quando a decisão por suspender os testes foi adotada.

"A decisão tomada ontem era a única a ser tomada em sede de dúvidas", disse. "As informações veiculadas ontem foram consideradas insuficientes e incompletas para que ontem fosse impossível continuar permitindo o desenvolvimento vacinal", afirmou.

"Não é brincadeira o que estamos tratando aqui. Não é brincadeira atestar que uma vacina pode ser dada a uma pessoa. Isso não pode ocorrer em sede de dúvidas. E documentos claros, precisos e completos têm que ser enviados a nós, o que não aconteceu", disse Barra.

Ainda de acordo com Barra, ainda que já haja outras informações divulgadas sobre o caso, a Anvisa não pode tomar decisões sem que receba esses dados pelo comitê independente internacional.

"Informações para a gente não são informação se não vêm pelo canal correto. Não é brincadeira de criança", afirma. "Se não vem de um comitê independente, essa informação não tem valor."

"No momento da suspensão, a única informação que tínhamos era evento adverso grave não esperado", afirmou a diretora Alessandra Soares.

Em coletiva, membros da Anvisa também rebateram críticas do diretor do Butantan, Dimas Covas, que afirma que o instituto não foi comunicado com antecedência do caso, mesmo tendo enviado dados no dia 6 deste mês.

A agência, no entanto, informa que só teve conhecimento da comunicação do Butantan na segunda (9).

A diferença nas datas ocorreu devido a medidas de segurança adotadas pela área de tecnologia após suspeita de ataques cibernéticos a órgãos do governo.

Membros da agência negam ter recebido um documento detalhado sobre o caso, diferentemente do que afirma o Butantan.

Uma reunião foi feita na manhã desta terça sobre o caso. De acordo com Mendes, o objetivo era alinhar expectativas. "Não se tratou de evidências, mas dos próximos passos e procedimentos", afirma. Ele admite, porém, ter recebido mais informações sobre o caso, mas diz que a agência manterá a suspensão até receber todos os dados. "Precisamos de um olhar independente sobre o fato", diz.

"Uma situação de politização põe em xeque o nosso trabalho. O que nós pedimos é que o trabalho técnico seja respeitado. Estamos zelando por melhores informações", disse Mendes.

A Coronavac é a aposta do governador João Doria (PSDB) para controlar a pandemia e virou alvo de críticas por parte do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), seu rival político.

Em outubro, Bolsonaro esvaziou o acordo anunciado na véspera por seu ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, para a compra de 46 milhões de doses da Coronavac. "NÃO SERÁ COMPRADA", escreveu Bolsonaro em letras maiúsculas em uma rede social ao responder a um internauta que alegara querer ter "um futuro, mas sem interferência da ditadura chinesa".

O presidente também disse que não acreditava que a Coronavac transmitisse credibilidade porque "esse vírus [Covid-19] teria nascido" na China, afirmou.

Nesta terça (10), o presidente comemorou a suspensão dos estudos clínicos da Coronavac no Brasil e disse que o episódio é "mais uma que Jair Bolsonaro ganha".

"Esta é a vacina que o [governador João] Doria queria obrigar todos os paulistanos a tomá-la", escreveu no Facebook. "O presidente [Bolsonaro] disse que a vacina jamais poderia ser obrigatória. Mais uma que Jair Bolsonaro ganha."