China

EUA, Reino Unido e UE condenam resolução da China que silencia opositores em Hong Kong

Quarta (11), China aprovou medida que permite expulsão de parlamentares que defendem independência de Hong Kong

Parlamentares chineses em coletiva de imprensa, nesta quinta (12) - Peter Parks/AFP

A China tornou-se novamente alvo de críticas da comunidade internacional após a aprovação da resolução que permite cassar parlamentares de Hong Kong que defendam a independência do território em relação a Pequim. 
 
Aprovada quarta-feira (11), pelo Parlamento chinês, a medida entrou em vigor imediatamente e foi responsável pela expulsão de quatro membros do Conselho Legislativo de Hong Kong poucas horas depois. Em protesto contra a decisão, todos os outros parlamentares pró-democracia da cidade renunciaram aos seus cargos nesta quinta-feira (12).
 
As reações mais vigorosas vieram do Reino Unido, da União Europeia (UE), e dos Estados Unidos. "A imposição de novas regras por Pequim para desqualificar os legisladores eleitos em Hong Kong constitui uma clara violação da Declaração Conjunta Sino-Britânica", disse o secretário inglês de Relações Exteriores, Dominic Raab, em referência ao acordo que devolveu o território à China em 1997, após mais de 150 anos de domínio britânico.
 
"A China mais uma vez quebrou suas promessas e minou o alto grau de autonomia de Hong Kong", acrescentou Raab, enumerando três ocasiões em que Pequim violou o tratado entre os dois países. 
 
A primeira foi em 2016, quando funcionários de uma editora conhecida por publicar livros críticos ao regime chinês foram detidos pela China. A segunda foi em junho deste ano, quando Pequim promulgou a Lei de Segurança Nacional, que pune qualquer ato considerado subversão, secessão, terrorismo ou conluio com forças estrangeiras. A resolução desta quarta-feira, segundo o governo britânico, seria a terceira quebra de acordo.
 
O tratado não prevê um mecanismo endossado pelas partes para garantir seu cumprimento, mas os signatários têm o direito de apontar potenciais violações dos termos. Os ingleses ainda poderiam, portanto, recorrer a tribunais internacionais para exigir o comprometimento da China com o acordo assinado em 1997.
 
"O Reino Unido vai defender o povo de Hong Kong e denunciar violações de seus direitos e liberdades", disse Raab. "Com nossos parceiros internacionais, exigiremos da China as obrigações que assumiu livremente de acordo com o direito internacional."
 
A pasta de Raab convocou o embaixador chinês em Londres, Liu Xiaoming, para expressar "profundas preocupações". O vice-secretário das Relações Exteriores, Nigel Adams, disse que está considerando impor sanções a autoridades chinesas.
 
No mesmo sentido, os EUA advertiram a China de que Washington continuará "identificando e sancionando os responsáveis por acabar com a liberdade de Hong Kong". Na última segunda-feira (9), quatro funcionários chineses foram proibidos de viajar aos EUA e tiveram congelados os patrimônios que eventualmente possam ter em território americano.
 
"As recentes ações de Pequim, que inabilitam legisladores pró-democracia do Conselho Legislativo de Hong Kong, não deixam dúvidas de que o Partido Comunista Chinês violou flagrantemente seus compromissos internacionais", disse Robert O'Brien, assessor de segurança nacional dos EUA. A União Europeia pediu a reversão imediata da resolução aprovada por Pequim e a reintegração dos parlamentares ao conselho local.
 
"Estas últimas medidas constituem mais um golpe severo no pluralismo político e na liberdade de opinião em Hong Kong", diz o documento assinado por Josep Borrell, alto representante para Relações Exteriores da UE.
 
No comunicado, Borrell afirma que o bloco europeu está "acompanhando de perto a situação política em Hong Kong" e que deve entregar ao Executivo da UE, até o final do ano, um relatório sobre um pacote de medidas para expressar apoio político à autonomia do território e solidariedade aos honcongueses.
 
Questionado durante uma entrevista coletiva, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Wang Wenbin, rebateu nesta quinta-feira (12) o que chamou de "acusações gratuitas de alguns países".
 
"Os países estrangeiros não têm nenhum direito de fazer comentários irresponsáveis com o objetivo de interferir nos assuntos de Hong Kong", disse. A mídia estatal chinesa saudou a resolução do Parlamento como um passo "há muito esperado" em direção ao "retorno da paz e da prosperidade" em Hong Kong. Também destacou a necessidade de a cidade ser "governada por patriotas".
 
Os parlamentares pró-democracia que anunciaram suas renúncias após a expulsão de quatro colegas deixaram seus cargos oficialmente nesta quinta-feira e aproveitaram a ocasião para se manifestar mais uma vez contra Pequim e contra a chefe-executiva de Hong Kong, Carrie Lam.
 
"Cidadãos de Hong Kong, preparem-se para um longo, longo período em que apenas uma voz será ouvida na sociedade", afirmou o membro da oposição Lam Cheuk-ting. "Se você é dissidente, prepare-se para mais pressão."
 
"Suponho que este seja meu último protesto no Conselho Legislativo", acrescentou, ao exibir uma faixa em que se lia "Carrie Lam está corrompendo Hong Kong e prejudicando seu povo; ela federá por 10 mil anos".
 
Na quarta-feira, Lam disse que, embora leve em consideração a divergência de opiniões na legislatura, a lei precisava ser aplicada e as expulsões dos quatro parlamentares foram "constitucionais, legais, razoáveis e necessárias".
 
"Não podíamos permitir que membros do Conselho Legislativo julgados de acordo com a lei por não cumprirem os requisitos para servir no Conselho Legislativo continuem a trabalhar." A renúncia coletiva de todos os legisladores pró-democracia também provocou uma resposta irritada do escritório de negócios chinês de Hong Kong e Macau.


"Mais uma vez mostram sua confrontação obstinada com o governo central e um desafio descarado à autoridade do governo central. Condenamos de modo veemente", afirmou o órgão, em comunicado. "Devemos advertir estes deputados de oposição que se trata de uma tentativa mal calculada de semear o confronto, apostando na interferência das forças estrangeiras para afundar Hong Kong no caos."
 
O Conselho Legislativo tem 70 membros, nomeados com base em um sistema complexo que garante quase automaticamente a maioria ao bloco favorável a Pequim. Apenas 35 deputados são eleitos por votação direta, e os demais, indicados por grupos alinhados à China.


 
Os parlamentares estavam acostumados a disputas políticas entre campos opostos. Os anti-Pequim usavam todas as táticas a seu alcance para obstruir os projetos de lei que não consideravam positivos, embora acabassem derrotados pela maioria pró-China.
 
Agora, restam apenas duas pessoas no conselho que não são alinhadas ao regime de Xi Jinping. As últimas eleições legislativas estavam marcadas para setembro, mas foram adiadas sob o pretexto de evitar a propagação do coronavírus. Segundo autoridades da cidade, a medida tinha como objetivo a garantia da segurança dos honcongueses, sem viés político.
 
A repressão aos dissidentes que se seguiu ao adiamento, entretanto, reforça argumentos de ativistas pró-democracia que veem a decisão como mais um resultado da interferência de Pequim. A nova votação deve acontecer em setembro de 2021, mas devido às candidaturas invalidadas, ainda não está claro de que forma o pleito poderá se dizer representativo de fato.