Homens e brancos seguem privilegiados, após declaração de 80% de toda a verba pública eleitoral
Pelas regras, candidatos negros deveriam ter 50% da verba
Com o recebimento de 80% de toda a bilionária verba do Fundo Eleitoral já declarada pelos candidatos da eleição de domingo (15), os partidos não cumpriram até esse momento as regras que exigem distribuição equânime entre negros e brancos, mulheres e homens.
De acordo com os dados informados pelas legendas e os candidatos ao Tribunal Superior Eleitoral, e compilados pela plataforma 72 horas, 62,7% de todo o R$ 1,63 bilhão distribuído foi parar na mão de candidatos brancos.
Pelas regras, negros deveriam ter 50% da verba, já que essa foi a proporção de pretos e pardos que se lançaram na disputa de prefeituras e das vagas nas Câmaras Municipais.
Já no caso das mulheres, que são 33,6% do total de candidatos, as verbas declaradas até agora por elas somam apenas 26,7%.
Decisão de outubro deste ano do Supremo Tribunal Federal estabeleceu que os partidos deveriam dividir o dinheiro público de campanha de forma proporcional ao número de candidatos negros e brancos que lançarem. A regra de distribuição proporcional às mulheres vigora desde de 2018.
A análise da distribuição da verba pelos partidos mostra que candidatos negros de 24 das 31 siglas que aceitaram o recebimento do Fundo Eleitoral (Novo e PRTB rejeitaram o recebimento do dinheiro) concentram em suas mãos menos de 50% das verbas eleitorais.
Apenas DEM, PROS, PSTU, PC do B, Avante, PTC, PMB e UP tem candidatos negros, na média, com mais recursos que brancos.
A Folha de S.Paulo tem ouvido dirigentes dos partidos políticos nas últimas semanas e há uma série de ponderações feitas pela maioria para justificar os números.
A primeira é a de que a decisão de distribuição proporcional da verba entre negros e brancos foi decidida pelo STF na última hora, após os critérios de distribuição já estarem definidos, o que os impossibilitou de ter um planejamento adequado.
Além disso, afirmam que a aferição do cumprimento da regra só poderá ser feita ao final do pleito, quando 100% dos recursos estiverem declarados.
Por fim, argumentam que há situações em que nas coligações para prefeito houve doação para candidatos negros cabeça-de-chapa e que, embora eles sejam de outros partidos, o valor deve entrar no calculo do cumprimento da cota. Apesar disso, as siglas não mostram números desses repasses nem tampouco citam o desconto que deve haver, nesse caso, de eventual repasse recebido de partidos aliados.
A Folha de S.Paulo consultou o Tribunal Superior Eleitoral sobre pormenores do que considera cumprimento da regra, mas não houve resposta. Como se trata de uma determinação nova, uma resposta sobre a legalidade da medida possivelmente será tomada nos primeiros julgamentos das prestações de contas em que o caso concreto for analisado.
Em caso de descumprimento das cotas de gênero e racial, os partidos podem sofrer punições eleitorais, como multa e cassação da chapa de eleitos. Caso sejam identificados desvios, pode haver consequências na área criminal.
Em relação às mulheres, cuja regra está em vigor desde 2018, cerca de metade dos partidos reúne candidatas com menos de 30% da verba eleitoral, com destaque para o DEM..
O partido tem dito que sua contabilidade interna mostra o cumprimento da cota, que é preciso esperar o final da campanha e que tem considerado o repasse de dinheiro, no caso de coligações, a candidatas majoritárias de outras siglas.
Entre os partidos que mais repassaram verba para as mulheres estão Patriota , PSL, PODE, PT, PMN, PV, PCB, PC do B, UP, PSOL, PSTU e PMB.
Esse último, o Partido da Mulher Brasileira, é o campeão, mas apenas graças ao repasse para a candidatura da própria presidente da sigla, Suêd Haidar, que disputou a prefeitura do Rio e foi destinatária de um quarto de toda a verba nacional do partido, R$ 320 mil.
Suêd teve apenas 3.833 votos, 0,15% dos válidos, e ficou na antepenúltima posição.