'Bossa Nova é uma máquina de investimentos em startups'. diz fundador
A gestora Bossa Nova Investimentos, fundada por ele em 2011, já investiu R$ 9 bilhões em mais de 500 empresas
Pierre Schürmann cresceu em um barco, aprendeu a programar em terra firme, lançou um dos sites mais populares do Brasil nos primórdios de internet e, cinco empresas depois, criou o fundo de venture capital com o maior portfólio da América Latina.
A gestora Bossa Nova Investimentos, fundada por ele em 2011, já investiu R$ 9 bilhões em mais de 500 empresas. O plano, diz, é chegar a mil até 2025, mas ele acredita que, no ritmo atual, o fundo deve bater a meta em dois anos.
"A Bossa é uma máquina de fazer investimentos em startups", diz o empresário, que atribui o bom desempenho a uma evolução inesperada do mercado de venture capital no Brasil.
Ele projeta uma nova onda de investimentos, bem maior que as anteriores, graças a uma nova geração de potenciais empreendedores. Esse grupo tem outra visão, afirma, porque presenciou o nascimento dos atuais unicórnios brasileiros –as startups que valem mais de US$ 1 bilhão.
Contribui também o ambiente inédito de juros baixos.
"A próxima onda que vem aí é com Selic a 2%, capital infinito para tecnologia, plataformas enormes para distribuição, e pessoas que vivenciaram, viram ser possível tirar empresa do zero, com dez pessoas numa sala, e ir a 2.000 em quatro anos", afirma Schürmann . "Essas pessoas vão dizer: 'acho que vou empreender também."
Primogênito da família Schürmann, conhecida por dar a volta ao mundo em um veleiro, ele celebra hoje conseguir dar entrevistas inteiras sem lembrar o fato. "Antes só falavam disso: como foi sua vida no barco?"
Desde novembro, ele é membro do conselho de administração da Bossa Nova e se dedica a um novo empreendimento, o seu sétimo: a Nuvini, que realiza investimentos em empresas de software.
PERGUNTA: Como surgiu a Bossa Nova?
PIERRE SCHÜRMANN - Em 2000, eu tinha feito investimentos em startups no Brasil com um fundo americano, e queria voltar a investir, mas comecei a Bossa de forma tímida. Os primeiros cinco anos foram basicamente com capital próprio e alguns amigos coinvestindo.
Em 2015, 2016, eu trouxe como sócio o João Kepler, que já era investidor-anjo, e decidimos expandir e acelerar o negócio. João é o alter ego da Bossa, está mais na mídia, eu sempre fui mais offmedia. Então, a Bossa teve dois ciclos e está tendo o terceiro agora.
Sabia que poderia ser grande, mas não tinha ideia do que poderia chegar até aqui.
P: E como vocês foram disso para se tornarem os maiores investidores do Brasil e da América Latina?
PS - Não foi por acaso que nosso portfólio se tornou tão grande, pois tínhamos uma meta ambiciosa, mas como nos tornamos os maiores foi por acaso.
Olhando alguns fundos americanos, entendemos que era mais fácil adaptar o que já existia e funcionava bem. Fomos buscar um fundo americano chamado SV Angel, que tem hoje mais de 900 empresas investidas, e então decidimos que íamos fazer mil investimentos em startups no Brasil.
É um desafio gigante, achamos que ia demorar um pouco mais, mas estamos perto. Acabamos conseguindo criar um efeito, uma espiral virtuosa, em que trazemos mais empreendedores, mais investidores, e isso foi se alimentando e acelerou nosso processo de crescimento.
A Bossa foi minha quinta empresa, havia poucos concorrentes na época, e houve uma enorme mudança em venture capital, ninguém podia prever que o mercado estaria desse tamanho.
Em 2015, o mercado de venture capital deveria ser praticamente do tamanho da rodada da [startup de marketplace] Olist, que acabou de levantar capital de mais de R$ 300 milhões. O ano inteiro, o mercado inteiro, era equivalente à rodada de investimento de uma empresa no mês de novembro hoje. Decidimos seguir um rumo e chegamos mais rápido do que imaginávamos.
P: Por que mil empresas? Como chegaram a esse número?
PS - Tem um embasamento técnico, por incrível que pareça. Existe nos EUA uma entidade chamada Kauffman Foundation, responsável por medir os resultados dos fundos de investimento, e também de anjos. Em 2015 eles fizeram a primeira pesquisa sobre investimento no estágio em que a Bossa investe, o pré-seed, que é depois do anjo.
Eles chegaram à conclusão de que, se você conseguisse investir em mais de 600, 700 empresas, conseguiria ter o retorno médio de duas a três vezes do capital investido, que foi o que a Bossa construiu.
P: Quando esperam atingir essa marca?
PS - Tínhamos uma visão inicial de 2025, e já era próximo. Acho que, potencialmente, conseguimos chegar antes, pelo ritmo de investimento que a Bossa está fazendo, pelo número de bons empreendedores que existem no Brasil hoje, com o surgimento de muitos negócios bem legais em tecnologia, software, crescendo a fatia no PIB, acho que tem potencial muito bom para que a Bossa chegue a seus mil investimentos antes de 2025.
P: Algum ano específico?
PS - Acho que em 2022 a gente chega lá. A Bossa é uma máquina de fazer investimentos em startups.
P: Quais são os critérios do fundo para fazer investimentos?
PS - A Bossa investe em B2B [sigla em inglês para empresas dedicadas a fornecer soluções para outros negócios, e não para o consumidor final], software em tecnologia e software em internet, e que já estejam faturando.
Não investimos em ideia, em negócios recém-começados. Tem hoje anjo para fazer isso, outras iniciativas e partes do ecossistema que atendem muito bem esse empreendedor e essa empreendedora.
P: Qual costuma ser o tamanho do aporte que a Bossa faz?
PS - Acho que investimos em torno de R$ 300 mil a R$ 500 mil iniciais. A Bossa participa geralmente também dos outros estágios de investimento. Geralmente somos o primeiro cheque e, depois, acompanhamos o ciclo todo de investimento, à medida que o negócio cresce e faz sentido entrar nos follow-ons [ofertas seguintes de ações].
P: Quando esse ciclo se encerra para a Bossa Nova?
PS - Se encerra de algumas formas. A mais positiva é quando a empresa é adquirida –alguém compra. A segunda é quando existe uma rodada de investimentos que tem um fundo maior, entra uma Kaszek, um SoftBank, fundos que compram investidores pequenos para dar uma arrumada na base societária. O contraponto é quando as coisas não dão certo, o negócio fecha e temos o chamado "ride off", perdemos o capital investido lá.
P: Com que frequência isso acontece?
PS - Temos algo em torno de 40 empresas que não deram certo. A frequência depende de uma série de fatores: de quem está investindo, quem está acompanhando, mercadologicamente falando. Você tem gente que fez quatro investimentos e três deram errado. Nosso diferencial é que temos uma experiência: quanto mais investimento você faz, melhor você analisa, melhor seu filtro, melhor o investimento que você atrai.
P: Como vê o mercado de startups hoje no Brasil em comparação a quando começou?
PS - O mercado viveu algumas fases. Começou em 2008, com a ida do Buscapé para a Naspers, gerou um momento de euforia. Aí veio 2014, que ninguém sabia o que ia acontecer, mas gerou uma safra de excelentes empreendedores, como o Nubank, a Créditas, a RD Station. Era uma época que não tinha dinheiro, e você precisava ir lá, fazer acontecer sem capital.
De lá para cá, o conhecimento subiu muito. As plataformas de distribuição de tecnologia aumentaram através do mobile, o que impulsionou muito o acesso e a capacidade das empresas de distribuir conteúdo e vender.
Tudo isso, ainda, sem capital no mercado. Até 2017, se você falasse com os gestores de venture capital, eles iriam te dizer que era muito difícil levantar dinheiro. Bons gestores suavam para conseguir levantar R$ 30 milhões, R$ 40 milhões, R$ 50 milhões no fundo, não era nem em uma rodada, mas no fundo. E aí houve um boom em venture capital, e isso passar a ser superimportante. Começaram a surgir os unicórnios, e algumas empresas cresceram.