Cármen Lúcia dá 24h para Abin explicar se fez relatório a Flávio Bolsonaro; Aras vê suspeita grave
Filho do presidente é investigado sob suspeita dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e liderado uma organização criminosa
A ministra Cármen Lúcia (STF) deu 24 horas para o diretor-geral Alexandre Ramagem (Abin) e o ministro Augusto Heleno (GSI) explicarem a suposta existência de relatórios elaborados pela agência para a defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ).
O procurador-geral da República, Augusto Aras, por sua vez, classificou como "grave" a suspeita de que os órgãos públicos tenham trabalhado para auxiliar o filho do presidente em causas judiciais.
O PGR afirmou nesta terça-feira (15) que também pediu informações ao GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e à Abin (Agência Brasileira de Inteligência) dentro de uma apuração preliminar do Ministério Público Federal, tecnicamente chamada de notícia de fato.
"O fato é grave", disse o procurador-geral. "O que não temos é prova desses fatos para que [a notícia de fato] seja convertida em inquérito, é preciso ter elementos judiciários", completou Aras.
O filho do presidente é investigado sob suspeita dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e liderado uma organização criminosa. O Ministério Público do Rio suspeita que ele recolhia o salário de parte de seus antigos funcionários na Assembleia para benefício pessoal.
Segundo a revista Época, o órgão de inteligência do governo teria produzido documentos para ajudar o parlamentar a ser absolvido.
Em um dos documentos, segundo a revista, a Abin deixou claro o objetivo: "Defender FB no caso Alerj demonstrando a nulidade processual resultante de acessos imotivados aos dados fiscais de FB". FB é Flávio Bolsonaro, e Alerj, Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Advogados de Flávio querem provar que o caso das "rachadinhas" foi iniciado por causa de ações ilegais da Receita Federal. A Abin então teria emitido os relatórios para ajudar os advogados a comprovarem isso.
Nesta terça-feira, Aras relatou que recebeu uma representação de parlamentares de oposição, mas que a documentação não ofereceu elementos mais concretos sobre as suspeitas de irregularidades. "Eu esperava que os parlamentares fornecessem os documentos", disse.
O procurador-geral explicou que é preciso verificar se a Abin foi usada para auxiliar Flávio, o que neste caso configuraria a responsabilidade do diretor-geral da agência, ou se foi uma iniciativa de servidores do órgão.
Segundo o site The Intercept Brasil, a produção do relatório pode ter partido de um policial federal cedido à Abin, conhecido internamente como um bolsonarista entusiasmado nas redes sociais.
Em abril deste ano, durante reunião ministerial, Bolsonaro havia dado pistas sobre uma suposta rede de informantes dentro de órgãos oficiais do governo, como na Abin.
"Se reunindo de madrugada pra lá, pra cá. Sistemas de informações: o meu funciona", afirmou Bolsonaro. "O meu, particular, funciona. Os ofi... que tem oficialmente, desinforma [sic]. Prefiro não ter informação do que ser desinformado por sistema de informações que eu tenho", continuou o presidente.
No trecho da reunião, o presidente não foi claro sobre o que seria esse sistema privado.
Cármen Lúcia também tomou a decisão em petição apresentada por partidos políticos (PSB e Rede Sustentabilidade). A ministra afirmou que os fatos narrados pelas siglas são "graves" e disse que o STF tem jurisprudência clara que proíbe uso de órgãos públicos para fins particulares.
A existência de ao menos dois relatórios foi revelada pela revista Época, e a autenticidade do documento foi confirmada pelos advogados do senador ao veículo de comunicação.
Os relatórios traçam estratégias para Flávio comprovar que houve vícios nas investigações contra ele.
Em deles, no campo intitulado "finalidade" consta a descrição "defender FB no caso Alerj demonstrando a nulidade processual resultante de acessos imotivados aos dados fiscais de FB".
Os dois documentos foram enviados por WhatsApp para Flávio e por ele repassados para sua advogada Luciana Pires.
Neles, a agência de inteligência do governo descreve suposta atuação ilegal da Receita Federal e aponta caminhos para anular o processo que tem o filho do presidente como alvo.
Por meio de nota, o Gabinete de Segurança Institucional negou a elaboração de relatórios em favor do senador.
"O GSI reitera que não realizou qualquer ação decorrente, por entender que, dentro das suas atribuições legais, não lhe competia qualquer providência a respeito do tema", informou o órgão.
"As acusações são desprovidas de veracidade e abordam supostos documentos, que não foram produzidos pela Agência Brasileira de Inteligência", disse.