FUNÇÃO

Novo chefe do MP-RJ zelará de perto por ações com foro, caso de Flávio Bolsonaro

Luciano Mattos tem seu histórico marcado por ações civis públicas em Niterói contra ex-secretários, vereadores e o ex-prefeito Jorge Roberto da Silveira

Mattos foi anunciado na quarta-feira (6) como o novo chefe do Ministério Público do Rio de Janeiro - Foto: Divulgação MPRJ

A trajetória do promotor Luciano Mattos indica, segundo interlocutores, que o futuro procurador-geral de Justiça do Rio de Janeiro comandará mais de perto as investigações de pessoas com foro especial, incluindo o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ).

Com 25 anos no Ministério Público, Mattos tem seu histórico marcado por ações civis públicas em Niterói contra ex-secretários, vereadores e o ex-prefeito Jorge Roberto da Silveira (PDT). Também atuou em investigação de tortura no presídio Ary Franco.

Mattos foi anunciado na quarta-feira (6) pelo governador interino, Cláudio Castro (PSC), como o novo chefe do Ministério Público do Rio de Janeiro. Ele toma posse no próximo dia 15.

É atribuição do cargo investigar crimes atribuídos a deputados estaduais, juízes, promotores, prefeitos, secretários estaduais e vice-governador. Também é de responsabilidade do PGJ a proposição de ações civis públicas contra o governador.

Entre as investigações em curso no gabinete do atual procurador-geral, Eduardo Gussem, está a apuração sobre suposta lavagem de dinheiro do esquema da "rachadinha" de Flávio por meio de uma loja de chocolate. Ela não foi incluída na denúncia contra o senador, enviada ao Órgão Especial do Tribunal de Justiça, que também será atribuição de Mattos.

O foro de Flávio no TJ-RJ foi definido pelos desembargadores porque os fatos investigados são do período em que ele era deputado estadual.

Ao longo de quatro anos de mandato, Gussem buscou delegar os atos de investigação de sua atribuição ao Gaocrim (Grupo de Atuação Originária Criminal), atualmente comandado pelo procurador Ricardo Martins, que assina a peça contra Flávio.

Interlocutores de Mattos afirmam que, por seu perfil, ele será mais mais presente nas investigações, até assinando as denúncias contra pessoas com foro especial.

O caso de maior repercussão em que o futuro PGJ atuou foi a acusação contra 12 agentes penitenciários pela morte do comerciante chinês Chan Kim Chang dentro do presídio Ary Franco, em 2003. Eles foram denunciados sob acusação de tortura seguida de morte.

Chang foi preso em agosto de 2003 ao tentar embarcar para os EUA com US$ 30,5 mil não declarados. Dois dias depois, foi encontrado inconsciente em sua cela e morreu. Tinha hematomas pelo corpo, feridas na cabeça e traumatismo craniano.
Antes, Mattos atuou na região dos Lagos, onde ações civis públicas, em 1999, levaram às primeiras licitações para concessão de linhas de ônibus municipais – antes da capital, em 2010.

A última titularidade de Mattos foi na Tutela Coletiva de Niterói, área do MP-RJ responsável pela investigação de atos de gestores públicos. Atuou em processos sobre construções irregulares, fraudes na concessão de licenças de obras, atraso na distribuição de multas a motoristas e meio ambiente.

Teve conflito direto com o ex-vereador de Niterói Wolney Trindade, que chamou Mattos de "idiota, imbecil e maluco" em razão de uma ação civil pública proposta contra ele, outros três vereadores e um ex-secretário por irregularidades na aprovação do aumento de gabarito na cidade.

"Essa situação é digna de vergonha e de punição da Justiça. Fico imaginando como ele trata o cidadão comum da cidade", disse Mattos em 2010, ao anunciar que processaria o então vereador. O promotor ganhou na Justiça o direito de receber R$ 70 mil por dano moral.

Por seis anos, Mattos esteve afastado das funções como promotor para atuar como presidente da Amperj, associação dos membros do MP-RJ.

Os três mandatos que conquistou na associação lhe deram bom trânsito na categoria e entre políticos, com quem costumava negociar as pautas corporativas.

Foi essa articulação política que ajudou Mattos a reduzir a resistência que sofria entre interlocutores da família Bolsonaro, o que poderia afetar sua nomeação por Castro.

Considerado rigoroso e punitivista, seu nome era visto com reservas em razão de seu histórico de atuação na Tutela Coletiva. A área também é origem de parte dos membros do Gaecc (Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção), responsável pela apuração contra Flávio e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ).

O futuro PGJ venceu a disputa interna com 546 votos, seguido da procuradora Leila Costa (501) e do promotor Virgílio Stavridis (427), que formaram a lista tríplice.

A dúvida entre membros do MP-RJ é como o futuro PGJ vai conciliar o diálogo institucional com políticos com a atuação dura e direta na investigação que seu currículo mostra.

Mattos também vai definir o destino dos grupos de atuação especializada, que concentram as principais investigações do órgão.

Além do Gaecc, que trabalha na investigação contra a família Bolsonaro, há o Gaeco, de combate ao crime organizado, que investiga milicianos e quem mandou matar a vereadora Marielle Franco (PSOL) e o motorista Anderson Gomes.

Ato publicado no Diário Oficial do MP-RJ de segunda-feira (4) exonerou todos os promotores desses grupos a partir de 17 de janeiro, primeiro dia da gestão Mattos no órgão. O objetivo da medida, assinada por Gussem, é dar liberdade para seu sucessor escolher os integrantes desses grupos, ou até mesmo redefinir o organograma da instituição ao seu estilo.
Mattos ainda não deu sinais de quais nomes serão mantidos.