Livro faz resgate histórico da presença do cravo no Rio de Janeiro
Professora do Departamento de Música da UFPE é uma das autoras da publicação
Instrumento musical de teclas, o cravo tem origem europeia, mas também fez a cabeça de artistas brasileiros de renome em diferentes épocas. O livro “O cravo no Rio de Janeiro do Século XX”, editado pela Rio Books, traz uma extensa pesquisa sobre a sua absorção na vida cultural carioca entre as décadas de 1900 e 1990.
Professora do Departamento de Música da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a mineira Maria Aida Barroso é uma das autoras da publicação, que nasceu de uma pesquisa no âmbito dos programas de pós-graduação em música da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ela divide o trabalho com Marcelo Fagerlande e Mayra Pereira. Ao longo de seis anos, os três se dedicaram a buscar informações sobre o cravo nos principais jornais cariocas da época.
“A gente já vem fazendo trabalhos juntos há bastante tempo. No mestrado da Mayra, ela pesquisou sobre a presença do cravo no Rio até os anos 1850. Havia sempre um certo entendimento de que o instrumento desapareceu depois disso e só ressurgiu lá para os anos 1960. Resolvemos fazer uma investigação para quebrar esse lugar comum”, explica Maria.
A principal fonte de pesquisa dos foi a Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional, que reúne em um ambiente totalmente digital periódicos de diversas épocas totalmente digitalizados. Desde o levantamento até a produção texto, o livro foi todo construído com seus autores vivendo em estados diferentes e sem se encontrarem presencialmente, mesmo antes da pandemia.
“Eu moro no Recife, o Marcelo no Rio e a Mayra em Juiz de Fora (MG). Não conseguiríamos concluir esse trabalho se esse material não estivesse disponível digitalmente, porque quando fomos escolher as imagens que figuram no livro já estávamos na pandemia”, relembra.
A publicação traz informações como os concertos realizados, nomes de intérpretes e compositores e alguns fatos inusitados. Os pesquisadores descobriram, por exemplo, que o maestro Leopoldo Miguez foi o comprador do primeiro cravo da famosa marca francesa Pleyel, em 1900. O curioso é que não há registros da entrada do instrumento no Brasil.
“Não conseguimos saber qual o motivo dele ter comprado e nem o destino da compra. Procuramos o inventário dele, documentos alfandegários, mas esse é realmente um mistério que fica para as próximas pesquisas”, revela.
Traçando uma linha do tempo do cravo na Capital fluminense, o livro passa também pelos anos 1960, quando o uso do instrumento volta a ser mais intenso. Os concertos da época acabam influenciando a geração de músicos da década seguinte.
“Nos anos 1970, temos a inserção do cravo na música popular. Artistas de sucesso começam a colocar o instrumento como timbre nos seus arranjos. Roberto Carlos, Raul Seixas, os nomes da bossa nova e Ronnie Von são exemplos. Isso despertou um interesse no público mais jovem, que é o que movimenta as tendências”, aponta.
Com 386 páginas e 347 imagens, o livro torna o trabalho realizado pelos autores acessível para diferentes perfis de eleitores. “A gente optou por não divulgá-lo como uma pesquisa acadêmica. Por isso, a leitura não é de tese. Acho que isso é um diferencial. Fazer uma pesquisa tão grande para ela ficar restrita ao universo acadêmico não era uma opção legal para a gente”, defende.
Por conta da pesquisa, Maria também se interessou em saber um pouco mais sobre a utilização do cravo em território pernambucano. Atualmente, ela aborda em seu doutorado a presença do instrumento no Movimento Armorial. “Logo no programa de lançamento do movimento armorial, Ariano Suassuna menciona o timbre. Em 1971, a Orquestra Armorial de Câmara compra um cravo. Estou levantando essas e outras informações. Em breve, teremos uma visão mais ampla sobre o cravo também no Recife”, promete.