STF vê risco de impasse sobre situação de Lira em linha sucessória da Presidência
O novo presidente da Câmara é alvo de duas denúncias por crimes de corrupção passiva e organização criminosa, resultantes de investigações da Operação Lava Jato
Recursos apresentados contra o resultado de dois julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) reforçam na corte um impasse sobre a condição do deputado Arthur Lira (PP-AL) como substituto eventual do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Lira foi eleito presidente da Câmara para o biênio 2021/2022 nesta segunda-feira (1º). O ocupante do cargo é o segundo na linha sucessória presidencial –o primeiro é o vice-presidente, Hamilton Mourão (PRTB).
Uma decisão do STF de 2016 diz que réus em ações penais não podem substituir o presidente e o vice caso os dois se ausentem do país, ainda que estejam liberados para comandar as duas casas legislativas federais.
O novo presidente da Câmara é alvo de duas denúncias por crimes de corrupção passiva e organização criminosa, resultantes de investigações da Operação Lava Jato. As duas acusações foram julgadas e aceitas pelo Supremo.
No andamento processual, após a denúncia ser aceita, a fase seguinte é a abertura da ação penal. Nela, os acusados passam a ser réus. Mas cabem recursos.
E foi justamente o que ocorreu nos dois casos que envolvem Lira. Foram apresentados recursos contra as decisões dos ministros de aceitar as denúncias, adiando a abertura das ações penais.
A reportagem apurou que há no Supremo uma divisão sobre o momento em que o denunciado passa a receber o tratamento de réu –se a partir do recebimento da denúncia ou se a partir da formalização da ação penal.
Para parte dos ministros, uma vez acatada a acusação apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), o investigado torna-se automaticamente réu.
Outra ala do tribunal, todavia, entende que Lira poderia assumir o Executivo porque seria necessário esgotar os recursos e formalizar a abertura da ação para que ele ficasse impedido.
Isso, porém, ainda deve ser discutido pelo STF. A aposta é que partidos de oposição devem acionar o Supremo para que a corte defina se o aliado de Bolsonaro e líder do centrão pode ou não substituí-lo na Presidência da República.
A avaliação interna na corte é que, além da discussão jurídica, o resultado do julgamento dependerá do comportamento que o deputado terá em relação ao Supremo.
A maioria dos ministros simpatizava com a atuação de Rodrigo Maia (DEM-RJ), que, enquanto presidente da Câmara, ajudava o STF para impor limites às ofensivas de Bolsonaro contra os demais poderes.
Maia, por exemplo, deu respaldo ao inquérito das fake news em curso no Supremo com a CPMI do Congresso que também investigava a atuação da militância bolsonarista nas redes sociais para descredibilizar as instituições.
Caso Lira reforce o alinhamento com o chefe do Executivo a ponto de respaldar os ataques ao Supremo, a corte não deve enfrentar o julgamento sobre sua situação jurídica com bom humor.
Em uma das denúncias aceitas pelo STF, Lira foi acusado de receber R$ 106 mil em propina do então presidente da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), Francisco Colombo, em troca de apoio para mantê-lo no cargo.
Em sessão no final de novembro, a Primeira Turma do STF formou maioria para negar recurso do parlamentar de Alagoas. O julgamento foi suspenso após pedido de vista do ministro Dias Toffoli.
Ao lado de colegas do PP, o deputado também responde ao inquérito chamado "quadrilhão do PP", por suposta participação em esquema de desvios da Petrobras. De acordo com a acusação, integrantes da cúpula do partido integrariam uma organização criminosa, com ascendência sobre a diretoria da Petrobras, e que desviava verbas em contratos da estatal.
A denúncia foi aceita pela 2ª Turma do Supremo, em junho de 2019, mas a ação penal ainda não começou a tramitar em razão de recursos apresentados pelas defesas dos réus.
O criminalista Pierpaolo Bottini, advogado do presidente da Câmara, disse que não há no Supremo uma decisão definitiva sobre o tema. Para ele, a condição de réu não constitui fator impeditivo.
"Afastar o parlamentar réu da linha sucessória, por acusação de crime sem relação com o exercício da Presidência da República, é impor medida não prevista em lei", afirmou.
"Se um réu em ação penal tem condições de disputar o cargo de presidente da República pela eleição direta, não há impeditivo para uma pessoa na mesma situação ocupar o posto em linha sucessória."